O bloco só cresce de importância, mas determinados setores continuam insistindo na tese de decadência
Vladimir Putin (Rússia), Narendra Modi (Índia), Dilma
Rousseff, Xi Jinping (China) e Jacob Zuma (África do Sul) durante encontro em
Fortaleza
por Roberto Amaral -http://www.cartacapital.com.br/
Há dez anos surgiu o acrônimo BRIC, sigla formada pelas
iniciais de quatro países que despertavam admiração no mundo pela vitalidade de
suas economias – Brasil, Rússia, Índia e China, aos quais se associa a África
do Sul – e que hoje representam 19% do PIB global. Nesses dez anos, o conjunto
de suas economias cresceu de 3 trilhões de dólares para 13 trilhões de dólares.
Esses 10 trilhões a mais correspondem em nossos dias a seis economias da
Grã-Bretanha em 2001. Ainda nesses curtos dez anos, a China, a locomotiva do
bloco, crescendo a um ritmo médio de 7% ano, chegou ao posto de segunda
economia do mundo; suplantou o Japão e é o dobro da economia alemã, o mais rico
e mais poderoso país da Europa Ocidental. Não obstante, a grande imprensa
mundial, as ‘consultorias’ e agências de ranking disso e daquilo de Wall Street
e da City de Londres, o FMI e a OCDE, a grande imprensa de lá – The Economist,
The Financial Times, The Time – de cá – o jornalão, a revistona – anunciam o
réquiem do bloco, como diariamente anuncia a falência do Mercosul.
Nossas exportações, no entanto, principalmente de
manufaturados, para nossos vizinhos só têm aumentado. O Brasil, embora
crescendo a taxas relativamente baixas, ultrapassou a Itália e a Inglaterra, e
é hoje a sexta economia mundial. Nas duas últimas décadas o peso econômico dos
países integrantes dos BRICS aumentou de 5,6% para 21,3%, o que, convenhamos, não
é nada desprezível. Projeta-se para a próxima década em 3% a expansão da
economia mundial, mas o crescimento dos BRICS está estimado em 7%. Em 2015 esse
conjunto de países poderá ser responsável por cerca de um quarto do PIB
mundial.
As trocas entre os cinco países somavam 250 bilhões de
dólares e podem chegar a 500 bilhões de dólares já em 2015. A China já é nossa
principal parceira comercial e as negociações em curso prometem elevar o fluxo
comercial entre o Brasil e a Rússia para 10 bilhões de dólares, já neste ano.
Relativamente ao país de Putin, para além das trocas comerciais, há uma largo
espaço para percorrer no campo da cooperação científica e tecnológica. E
inovação, onde são notórias nossas carências
Nossos cinco países representam 20% do PIB mundial e cada um
exerce papel de forte liderança em seus respectivos continentes. Não são
números irrelevantes e contrastam com o descrédito e o ceticismo da opinião
conservadora que acompanha com restrições as possibilidades de expansão
econômica – e nela envoltas, de expansão política e militar desses países –
alterando a correlação de forças do status quo internacional ensejado pela
derruição do bloco socialista e o fim da Guerra Fria. É a resposta da realidade
objetiva ao descrédito que a economia desses países despertava, e de certa
forma ainda desperta, nos círculos conservadores internacionais. No Brasil ele
é criticado, na companhia do Mercosul, por aqueles que não compreendem que
nosso país possa integrar projeto, político ou econômico, que não seja
chancelado pelos EUA. Em um mundo caracterizado pelas mais profundas
assimetrias de poder, a política de blocos – a que não têm fugido mesmo os EUA
– é um imperativo de sobrevivência daquelas economias mais frágeis que
encontram sua superação na negociação coletiva. Esse bloco tem possibilitado a
ação coordenada em foros internacionais e
construção de uma agenda própria.
Como entre nossos países no Mercosul, sabidamente guardam os
BRICS grandes contrastes e diversidade cultural, as quais, todavia, não lhes
têm impedido a atuação como bloco econômico e bloco político, nem a ação
articulada nos fóruns internacionais de sorte a enfrentar o hegemonismo das
grandes potências, EUA, União Europeia e Japão. Assim é que lograram impor uma
nova geopolítica ao mundo da unipolaridade, com o que se têm beneficiado todos
os países, particularmente aqueles de menor peso econômico. Além de grandes
mercados de consumo – em condições de influir na economia mundial – os BRICS
reúnem duas potências nucleares com assento no Conselho de Segurança da ONU,
grandes territórios, grandes populações – 40% da população mundial –, elevado
nível de industrialização e ponderável base científica e tecnológica. Esses
fatores são postos de manifesto quando a crise econômica parece sobreviver e a
lenta recuperação das potências capitalistas constrange os investimentos e o
fluxo de comércio, conquanto estimule a volatilidade dos mercados financeiros.
Como em todos os momentos de crise, quem paga o alto preço é
a paz mundial, vez mais um projeto transferido para as calendas gregas.
Com todas suas óbvias consequências econômicas, o quadro
mundial presente e visível para os próximos anos aponta para a conturbação da
guerra se alastrando por áreas cada vez maiores da Ásia, da África e do Oriente
Médio, com seu rasto de devastação e genocídio: Afeganistão, Paquistão, Iraque,
Síria, Líbia, as ameaças ao Irã, os conflitos de fronteira na Turquia, o
sistemático genocídio palestino na Faixa de Gaza, os conflitos raciais, tribais
e religiosos...
A crise de produção de petróleo e outros insumos, a crise da
produção de alimentos e outras commodities, a fome, a miséria, a degradação
humana, a desagregação dos países e a anarquia política, o êxodo de povos e
nações, bem como a ameaça que paira sobre civilizações milenárias, a guerra
continuada do capitalismo contra a ida e a natureza.
Nesse quadro se eleva a importância estratégica dos BRICS
pela força territorial e econômica de cada um dos países integrantes e pelo
papel de cada um na geopolítica regional.
Em um mundo assim descrito, a América do Sul progressista,
pacífica e em desenvolvimento acelerado e a África – continentes ainda à margem
da política de guerra (leia-se ‘terra arrasada’) dos EUA – constituem espaço de
projeção natural das iniciativas dos BRICS. Daí a importância do encontro dos
líderes dos BRICS com suas contrapartes sul-americanas no âmbito da VI Cúpula
de Chefes de Estado e de Governo que nosso país está sediando. Desse encontro
pode resultar a abertura mutuamente benéfica de mercados para os produtos da
América do Sul e dos BRICS – e se isso ocorrer, estaremos fortalecendo o
desenvolvimento econômico do sub-continente e, com ele, a solidificação de
nossa comum opção democrática e progressista, que tanto incomoda as elites
reacionárias de nossos países.
Pode ser esta, igualmente, uma oportunidade de
fortalecimento do Mercosul, expectativa que se anima à vista do projeto do Novo
Banco de Desenvolvimento dos BRICS, que deverá investir em principalmente nas
cruciais áreas de infraestrutura, dando base material à ajuda internacional e à
cooperação econômica que, pela porta do financiamento do desenvolvimento,
favorecerá a integração de nossos países e, amanhã, de nossos povos. A carência que mais nos ameaça é a de
capitais para financiar o desenvolvimento, pois o capital estrangeiro que
aporta é predominantemente especulativo, ou seja, visa exclusivamente ao
retorno, quando o Banco de Desenvolvimento aportará capital estratégico.
Mas esta não é a história toda.
Do ponto de vista político, o fundamental é que os países
integrantes dos BRICS podem dizer que, nas circunstâncias do mundo globalizado
sob o império da unipolaridade, comandam cada um o seu destino. Realizaram
reformas estruturais, patrocinaram a rápida urbanização e modernizaram suas
economias. O Brasil, por exemplo, realizou notável esforço de distribuição de
renda, elevando substancialmente a qualidade de vida de suas populações.
Elevaram-se, na maioria dos países os contingentes de classe-média e em alguns
países, como Brasil e China, a expectativa de vida é de 73 anos. No entanto
ainda são, no geral, precários os indicadores de escolaridade, a assistência
médica universal é deficiente e os índices de mortalidade infantil ainda são
inaceitavelmente altos.
O sonho é que estejamos ingressando na segunda fase do
BRICS, aquela que se seguirá ao sucesso da gestão macroeconômica, quando
reformas profundas da infraestrutura econômica (com implicações igualmente
profundas na transformação das estruturas politicas congeladas) poderão abrir
caminho para sociedades socialmente mais justas.
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