domingo, 15 de julho de 2018

"A voz da violência"



Janio de Freitas, com muito mais talento, observa hoje, na Folha, aquilo que ontem se abordou aqui: a inércia cúmplice da Justiça e da imprensa ante a pregação da barbárie feita por jair Bolsonaro.

Inércia, digo eu? É pouco, o que há é uma solidariedade ativa – ainda que indireta – para acentuar o clima de divisão primário a que, desde há tempos, levou-se este país.

A apologia do ódio – e, agora, a do crime – feita por este senhor passou de todos os limites do tolerável.

Mas isso não vem ao caso, não é?

A voz da violência

Janio de Freitas, na Folha
Os limites legais e os limites dos costumes caem no Brasil sem cessar e sem obstáculos. Mas Jair Bolsonaro, contribuinte para os dois ramos da ceifa, avançou demais a pretexto da pré-candidatura à Presidência. Sua pregação da violência, mesmo que criminosa como a das milícias, passou a fazer o incentivo explícito e público aos assassinatos.
Ei-lo, depois de vestir uma faixa presidencial, no sul do Pará, uma das duas regiões rurais de maior criminalidade: “Esses marginais que cometeram esse crime [morte de um açambarcador de terras] não merecem lei, não. Merecem é bala.” E foi por aí.
Um defensor de menos injustiça social não precisaria chegar a tanto para que estivesse atolado em processos criminais. E preso.
Bolsonaro jamais correu tal risco, nem qualquer outro decorrente de leis. Desde o início como agitador da violência, quando usou a então mulher para ameaçar com o corte explosivo da água para o Rio, caso sua turma de tenentes não recebesse aumento, Bolsonaro aplica à vontade a sua vocação. Para ele não há Procuradoria-Geral da República, Ministério Público, Judiciário, como não houve Justiça Militar. Há pouco, o comandante do Exército posou com o pré-candidato para foto logo incluída na campanha eleitoral.
Bolsonaro está levando pelo país afora, com maior presença nas áreas mais conturbadas, a sua pregação da violência e da arma como “um direito dos cidadãos”, em detrimento das condutas legais. É propaganda contra a Constituição. E não só. Também se contrapõe às ansiedades da população e aos esforços, tantas vezes fatais, pela contenção da violência.
Bolsonaro mobiliza o que há de pior no Brasil. Sob os olhares viciados dos que deveriam agir sem distinções na proteção do Estado de Direito.
Um exemplo pelo avesso desse vício faccioso está na repercussão da sentença que absolveu Lula (e mais seis) de “obstrução à Justiça”.
A absolvição ressaltou-se por fugir ao esperado, interrompendo uma sequência de fatos similares já no quarto ano. Solução reveladora para um caso revelador: o próprio juiz federal Ricardo Soares Leite refere-se à sua percepção de uma montagem suspeita. A do encontro em que o então senador Delcídio do Amaral insiste em fantasiosa fuga de Nestor Cerveró, cuja anomalia facial bastaria para repeli-la.
O Ministério Público não esteve alheio a esse episódio. E muito menos à segunda montagem, em que o nome de Lula entrou no depoimento de um Delcídio do Amaral desesperado por obter dos procuradores da Lava Jato, a qualquer custo, o prêmio da liberdade. Recebeu-o sem demoras.
Se estava dito todo o desejado, para que as provas de repente exigidas pelo juiz de Brasília? Não foram apresentadas, nem existiam. Os procuradores estavam, e continuam, habituados com Curitiba. Assim como o deputado Bolsonaro com a ética da Câmara, com a Justiça Eleitoral e com o Ministério Público.

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