segunda-feira, 18 de março de 2019

Alinhamento ideológico e interesse geopolítico, por Andre Motta Araújo

Governos podem ter alinhamento ideológico com outros governos mas Estados têm interesses geopolíticos que independem de ideologia



Governos podem ter alinhamento ideológico com outros governos mas Estados têm interesses geopolíticos que independem de ideologia.

Quando há um choque entre ideologia e geopolítica, prevalece esta última, o peso do interesse do Estado é maior, mostra a História.

O Estado Novo de Vargas era uma réplica do Estado fascista italiano, a legislação trabalhista e sindical tinha o mesmo contorno, o modelo de propaganda do Estado e do Chefe (o DIP) era similar, havia um alinhamento direto. A Condessa Edda Ciano, filha de Mussolini, esteve no Brasil e percorreu o Pais por 40 dias, recebida com honras extraordinárias, era um alinhamento completo dos dois Estados, herdeiros da latinidade. Todavia os acontecimentos geopolíticos se moviam e sem deixar de ser uma réplica do fascismo, o Estado brasileiro entrou em guerra com a Itália fascista.

Os eventos geopolíticos ultrapassaram o alinhamento ideológico, o interesse do Estado brasileiro se desligou da ideologia, a geopolítica comandou.

A GUERRA DAS MALVINAS

Os generais argentinos que derrubaram Isabelita Peron e instauraram em 1976 o ” Proceso de Reorganizacion Nacional” se consideravam alinhados ideologicamente com o governo do Presidente Ronald Reagan, conservador da ala mais à direita do Partido Republicano, anti-comunista ferrenho, colaborador da Comissão McCarthy. Acreditavam que teriam o apoio ou ao menos a neutralidade de Reagan na Guerra das Malvinas, não foi o que aconteceu, a ideologia dos generais argentinos de nada lhes adiantou e Reagan apoiou a Inglaterra no conflito, pela aliança do Atlântico Norte, um pacto geopolítico que era representado pelo Tratado do Atlântico Norte, que se manteve mesmo quando a Inglaterra era comandada por governos de esquerda, a OTAN era um pacto geopolítico típico, uma aliança militar de potencias do Atlântico Norte, unidas pela geografia.

O GOVERNO MILITAR DO BRASIL E ANGOLA

O Governo Militar Brasileiro de 1964, em plena Guerra Fria, teve o apoio de Lyndon Johnson, por razões ideológicas óbvias, havia interesse dos EUA em barrar a influencia da URSS através de Cuba no continente. Mas esse circunstancial alinhamento ideológico nunca significou uma aliança automática.

Quando os interesses geopolíticos do Brasil divergiram dos EUA, como no caso da independência de Angola e no programa nuclear com a Alemanha, prevaleceram os interesses estratégicos do Estado brasileiro e não o alinhamento ideológico circunstancial de 1964.
O Governo Geisel reconheceu o governo de Angola, chefiado por Agostinho Nelo, líder do MPLA, partido marxista apoiado pela URSS e que naquele momento ainda estava em guerra civil com o movimento rival, a UNITA, de Jonas Savimbi, apoiado pelos Estados Unidos.

O Brasil se colocou então em posição CONTRARIA aos EUA (e União Sul Africana), apoiando um governo não desejado pelos EUA
e como consequência Geisel denunciou o Acordo Militar Brasil EUA, que vinha do fim da Segunda Guerra.

Como os movimentos geopolíticos na roda da Historia nunca são fixos, caminham para lados imprevistos, a Historia é um caos completo e insondável, tudo está continua mutação, hoje Angola, governada pelo mesmo grupo que os EUA rejeitavam e o Brasil apoiava, o MPLA, é aliadíssima dos EUA, que exploram (através da Exxon) e importam TODO seu petróleo (1,5 milhão de barris/dia, muito mais que a Venezuela) e agora vão explorar o pré-sal angolano, enquanto o Brasil, graças a Lava Jato, perdeu poder e influencia em Angola em favor dos EUA, lembrando que a SONANGOL – a petroleira estatal angolana que produziu vários bilionários, a começar por Isabel dos Santos, filha do eterno ex-Presidente de Angola – nunca foi processada por corrupção no Departamento de Justiça, consta que ao fechar o balanço de 2015 faltavam 31 bilhões de dólares no caixa.

IDEOLOGIA É APENAS UM INSTRUMENTO

O maior exemplo da perda de importância de ideologia na história contemporânea vem da diplomacia americana. Duas vertentes guiaram a diplomacia dos EUA no Seculo XX: o princípio democrático que vem dos Quatorze Pontos do Presidente Wilson ao fim da Primeira Guerra e a Declaração das Nações Unidas sobre Direitos Humanos, cuja patrona foi a ex-Primeira Dama e ativista Eleanor Roosevelt, ao fim da Segunda Guerra. Todavia os interesses geopolíticos dos EUA sempre passaram por cima dessas ideologias iluministas. Como explicar por exemplo a aliança sólida dos EUA com o Reino da Arabia Saudita,um regime brutal, abaixo de medieval, onde não há o menor resquício de democracia e de direitos humanos?

E as 16 bases aéreas americanas na Espanha em plena e brutal ditadura do generalíssimo Francisco Franco? E a base aérea americana nos Açores acordada em tratado com o ditador Antonio de Oliveira Salazar? Tudo vale para atender aos interesses geopolíticos, ideologia é enfeite de bolo.

E as alianças caribenhas com o ditadores Trujillos, Somozas, Gomez, Machados, Batistas, Duvaliers, Perez Gimenez?

Lembrando que Noriega e Saddam foram aliados dos EUA, depois rejeitados e descartados, onde estavam as ideologias iluministas que os EUA embandeiraram pelo mundo? Saddam e Noriega enquanto aliados já eram brutais ditadores, não mudaram.

O interesse geopolítico sempre é mais alto, ideologia vale quase nada, serve como banda de música para distrair a multidão.

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