segunda-feira, 27 de dezembro de 2021

Brasil na lona, Bolsonaro nas cordas

Jair Bolsonaro (Foto: Alan Santos/PR)

"Marcelo Queiroga irá até o último round disposto a morrer abraçado a Bolsonaro"

Weiller Diniz
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Atordoado pela combinação de golpes fatais de uma economia em frangalhos, mortes na pandemia, quedas abruptas nas intenções de votos e aumentos superlativos nos índices de rejeição, Jair Bolsonaro tenta contra-atacar voltando para o canto do ringue, o cercadinho do Alvorada, onde está concentrado seu nicho de admiradores extremistas. Um grupelho majoritariamente desmiolado, irascível, cada vez mais, grogue. De tantas bordoadas que já recebeu no queixo, as mais contundentes são treinadas no box do Supremo Tribunal Federal que vem disparando socos, jabes e ganchos em série sem, contudo, nocautear um dos valentões mais desonestos e despreparados de todos os tempos na presidência da República.

Em mais um cruzado do Direito contra o obscurantismo, os jurados do STF já reuniram a maioria para exigir o passaporte da vacinação diante da iminência de um terceiro round da Covid-19. O capitão do arrego foi poupado do anúncio do resultado do combate. O ministro Kássio Nunes – que nem de longe lembra as habilidades do outro Cassius, Muhammad Ali – tocou o gongo paralisando a luta. Chicana inútil.

O passaporte da vacina é apenas mais um revés na longa série de derrotas do capitão no Judiciário, contra o qual luta sujo e vem se insurgindo em gingados golpistas desde o ano passado. Os diretos civilizatórios e democráticos do STF já balançaram Bolsonaro que tenta, em vão, armar a direita no contragolpe. Ele já treinou a desobediência às decisões judiciais, desafiou ministro com impeachment, participou e convocou atos onde se pretendia lacrar o ginásio maior da Justiça e duelou com ministros do TSE, acusando-os, sem prova alguma, de fraudes na eleição de 2022, enquanto espumava pelo voto impresso.

As razões de tantos murros no vazio são: as decisões aliadas à ciência na pandemia, os inquéritos abertos contra ele e sua prole encrencada e as prisões de golpistas como Roberto Jefferson, Daniel Pereira, Allan dos Santos, Sarah Geromini, Zé Trovão e outros delinquentes de menor expressão. No 7 de setembro testou, ao limite, as instituições e desferiu seu golpe mais baixo com a direita. Acabou amarelando diante de uma plateia mirrada de pouco mais de 200 mil destrambelhados nas ruas de São Paulo e Brasília. Inventou uma desculpa cínica, fingiu pendurar as luvas, mas 3 meses de falsa penitência voltou a atacar o STF com insinuações fascistas.

Outro duro golpe, que fez o capitão cambalear no tablado, veio de um “uppercut” bem aplicado da Anvisa que autorizou, amparada em critérios científicos, a vacinação de menores de 12 anos contra a Covid-19. Colérico, Bolsonaro ergueu os punhos tentando intimidar os responsáveis pela decisão. Socou o vento, chutou o ar, mas segue tropeçando no negacionismo mortal, em mais demências sanitárias e novos boicotes às vacinas.

O “sparring” escalado para Saúde, um médico raquítico e ser humano desprezível, o auxilia no retardamento da vacinação de crianças alegando a necessidade ouvir mais instâncias. “A pressa é inimiga”, disse ele. Depois inventou um “patamar” aceitável de óbitos de crianças. Eis o doutor da morte, o Joseph Mengele do Bolsonarismo. Procrastinação tem consequências fatais, já que o Brasil é o segundo país com maior letalidade de crianças por Covid-19.

Marcelo Queiroga irá até o último round disposto a morrer abraçado a Bolsonaro. Um clinche sepulcral. Já deu o dedo do meio aos brasileiros em Nova Iorque, disparou a pérola inqualificável sobre morte e liberdade, agora escora as sandices do seu treinador contra a vacinação infantil. Parte para o vale tudo atrás de um cinturão eleitoral. A plateia paraibana há de vaiá-lo de maneira estridente. No futuro pagará por seus erros, má-fé, delitos e disparates.

Desde maio de 2020, quando soava abertamente o sino do golpe, Jair Bolsonaro enxerga o STF como desafiante a ser nocauteado. Por lá foi espancado em todos os arreganhos autoritários, grande parte por decisão unânime dos jurados. Até a noite dos cristais já foi tentada. O tal grupo dos 300, que nunca passou de uma dezena de meliantes, atirou fogos sobre a sede da Suprema Corte. A arrependida Sarah Winter confessou que o golpista das pantufas, General Augusto Heleno, era o “coach” dos ataques ao STF. Nas manifestações que Bolsonaro prestigiou e até convocou, faixas pediam o fechamento do Congresso e do Supremo. Quando Alexandre Ramagem foi nocauteado no comando da PF, por ferir o princípio da impessoalidade, vieram mais ameaças do pugilista de cercadinho.

Após a busca e apreensão em aliados ele regurgitou: “acabou porra”. Depois da quebra de sigilo contra sua patota ameaçou: “Está chegando a hora de tudo ser colocado no devido lugar”. No dia seguinte, Fabrício Queiroz foi colocado no devido lugar, a cadeia. Tonto, o capitão beijou a lona, mas o alvo preferencial nunca foi esquecido. A senha foi dada pelo ex-ministro Abraham Weintraub: “Por mim, botava esses vagabundos todos na cadeia, começando no STF”.

A valentia a portas fechadas foi remunerada com um ótimo emprego no Banco Mundial e revelou um brigão pusilânime que se homiziou no cargo para se esquivar da porrada. Na semana passada o peso pluma da quartelada, o gnomo Augusto Heleno, entrou no ringue em mais um round para envenenar a democracia. “Temos um dos Poderes que resolveu assumir uma hegemonia que não lhe pertence, não é, não pode fazer isso, está tentando esticar a corda até arrebentar.

Nós estamos assistindo isso diariamente, principalmente da parte de dois ou três ministros do STF e que eu, particularmente, que sou responsável, entre aspas, por manter o presidente informado, tenho que tomar e Lexotan na veia por dia para não levar o Presidente a tomar uma atitude mais drástica em relação às atitudes que são tomadas por esse STF que está aí”. Eduardo Bolsonaro, o deputado do “cabo” e do “jipe” para fechar o STF, pregou abertamente a volta do AI-5. O deputado afirmou ainda que a ruptura era “quando” e não “se”. O estreante Daniel Silveira também saiu cheio de hematomas e foi parar na cadeia 2 vezes.

Jair Bolsonaro também marchou sobre o STF rodeado de empresários para salvar CNPJs no início da pandemia, em um gesto de simbologia extremista, aplaudido por integralistas que simulavam um cerco à Corte. Quanto à vida, de meros CPFs, desprezo eterno: “E daí?”. O próprio Bolsonaro disseminou o vídeo comparando os ministros do STF a hienas. No vídeo, o leão, identificado como Bolsonaro, é acuado por hienas com símbolos que representam instituições tidas democráticas: partidos políticos, STF, a CNBB, a OAB e órgãos de imprensa. Surge outro leão, descrito como conservador, que expulsa as hienas. Os leões se cumprimentam e aparece a imagem de Bolsonaro, a bandeira brasileira e a voz do presidente repetindo seu slogan de inspiração nazista: “Brasil acima de tudo.

Deus acima de todos”. Às vésperas da grande luta, onde foi espancado, Bolsonaro xingou dois ministros do STF: “O filho da puta ainda trai gente dessa maneira. Aquele filho da puta do Barroso”. Outro visado pela munheca golpista é Alexandre de Moraes, o carrasco do bolsonarismo: “A hora dele vai chegar. Ministro arbitrário, ditatorial, que aplica a lei para agredir a democracia e para atingir os seus objetivos. Ele me colocou como réu naquele inquérito fake news. Ele é a mentira em pessoa dentro do STF”.

O STF vem desferindo golpes certeiros na preservação da luta democrática. Um dos principais jabeadores tem sido o ministro Alexandre de Moraes que já disparou vários sopapos contra o autoritarismo. Diante de “fortes indícios e significativas provas”, abriu uma atordoante investigação para apurar a atuação de uma organização criminosa na internet que atuaria com o nítido propósito de atacar o Estado Democrático de Direito e desestabilizar as instituições. É um desdobramento das investigações sobre atos golpistas, perpetrados entre maio e junho de 2020.

Alexandre de Moraes pretende tirar a máscara dos apoiadores do presidente Jair Bolsonaro que usaram as estruturas do Palácio do Planalto, da Câmara dos Deputados e do Senado para disseminar informações falsas nas redes sociais e atacar a democracia. A falange criminosa, financiada com dinheiro público, teria por finalidade desestabilizar as instituições, principalmente a Justiça, que tem se contraposto aos atos marginais e golpistas. Estão na mira o trio Eduardo, Flávio e Carlos Bolsonaro, além de Bia Kicis e Carla Zambelli, entre outros.

O bolsonarismo já acumula mais de 30 derrotas emblemáticas no pugilato contra o STF. Uma das mais hemorrágicas, que fez o brigão sangrar diariamente por 6 meses, foi a CPI da Pandemia do Senado Federal. O STF, reafirmando jurisprudência histórica, determinou em 8 de abril de 2021, o funcionamento da CPI que nocauteaou o governo e expôs as vísceras mais purulentas da corrupção com as vacinas.

O início dos tombos vertiginosos de Bolsonaro nas pesquisas eleitorais coincide os com os desgastes sofridos pelo governo após o funcionamento da CPI a partir do final de abril de 2021. Mas ele, cujo estado mental permanente é do atordoamento, disse “cagar” para CPI. Mesmo desprezo que tem por vidas humanas. O inquérito para investigar a provável propina na vacina da Covaxin também foi aberto pela ministra Rosa Weber. Inicialmente serviu para blindar um dos principais suspeitos, Francisco Emerson Maximiano na CPI, dono da Precisa Medicamentos, patrocinador de calotes no octógono ensanguentado da Saúde e amigo do líder do governo Ricardo Barros, que saiu do desafio trôpego e com a cara arrebentada.

No começo da pandemia, em março de 2020, o ministro Alexandre de Moraes suspendeu trechos de uma medida provisória tentando flexibilizar a Lei de Acesso à Informação, uma das mais relevantes conquistas democráticas recentes. O governo tentava se esquivar da obrigatoriedade de órgãos públicos de cumprirem os prazos para responder pedidos via LAI. Moraes afirmou que a medida pretendia “transformar as exceções – sigilo de informações – em regra, afastando a plena incidência dos princípios da publicidade e da transparência”.

O governo já decretou sigilos centenários sobre informações públicas envolvendo amigos e o próprio presidente. Todas as gestões de vocação autoritária reverenciam a opacidade, pregam a mentira, abominam o controle público e, ao final, se revelam malsucedidas. Bolsonaro venera mentiras, versões unilaterais, abomina questionamentos, foge do contraditório e ameaça revidar com “porrada” os interlocutores inconvenientes que o indagam sobre a origem dos R$ 89 mil depositados por Queiroz na conta de Michelle Bolsonaro.

Ele tem uma desenvoltura agressiva em especial com mulheres jornalistas.

Em 8 de abril do ano passado, o ministro Alexandre de Moraes também decidiu que estados e municípios teriam autonomia para decidir sobre isolamentos sociais. Na ação, a OAB pedia para obrigar o presidente a seguir as recomendações da OMS. Para o magistrado, o governo federal não poderia “afastar unilateralmente” decisões de governantes locais sobre a restrição de circulação.

É contra essa medida que o capitão golpista guerreia até hoje sem nenhuma expectativa de triunfar, revelando-se um péssimo estrategista e masoquista contumaz. Uma semana depois, em 15 de abril de 2020, o STF referendou por unanimidade que estados e municípios têm autonomia para determinar o isolamento social em meio à pandemia do coronavírus. A maioria da Corte Suprema permitiu ainda que os entes da federação decidissem quais seriam os serviços essenciais que poderiam funcionar durante a crise da Covid-19.

Contra essa decisão Bolsonaro ameaçou com medidas provisórias, decretos e até colocar nas ruas o Exército. Ao contrário do que argumenta precariamente o capitão, a decisão do STF nunca o impediu de atuar contra a pandemia: ele não atuou porque não quis. Alexandre Ramagem, homem do corner de Bolsonaro no ringue da paraestatal, foi barrado no comando da PF por Alexandre de Moraes em 29 abril de 2020. A indicação violaria o princípio da impessoalidade e uma tentativa de instrumentalizar a PF e transformá-la em uma Gestapo, a polícia política criada por Adolf Hitler.

Bolsonaro queria um comparsa no comando da PF para acessar informações e relatórios confidenciais. Após uma busca e apreensão, também determinada por Alexandre de Moraes, contra aliados o capitão fez ameaças. Apostando no êxito do golpe, dois arruaceiros da academia bolsonarista marcharam até a residência do ministro Alexandre de Moraes em 2020. O acampamento fascista para sitiar, intimidar um ministro do Supremo Tribunal Federal e conspirar contra a democracia foi enquadrado e eles, massa de manobra anônima e desprezível, viraram réus e evaporaram. O ex-vice-líder de Bolsonaro na Câmara dos Deputados, Otoni de Paula, foi condenado a indenizar o ministro Alexandre de Moraes em R$ 70 mil por ofendê-lo com palavrões irreproduzíveis.

Alexandre de Moraes também negou o pedido do governo para ampliar a vigência das medidas provisórias durante a pandemia. Moraes determinou ainda, em 9 de junho de 2020, que o governo retomasse a divulgação integral do número de mortes e infectados por Covid-19. Àquela época, como na ditadura, o governo queria esconder os cadáveres que ajudara a executar. A tropa da toga esbofeteia os golpistas de maneira inclemente, na exata medida em que a Constituição é atacada. Após Alexandre abrir a investigação contra os filhos de Bolsonaro, o pugilista do cercadinho rosnou: “Veio inquérito especial para os meus dois filhos hoje. O mais velho e o zero dois sobre fake news.

Mas não tem problema, não. Se jogarem fora das quatro linhas da Constituição, entramos num vale tudo no Brasil”. Vale o que está escrito, na Lei Maior. Por isso, o STF também derrubou a MP 966, da blindagem penal preventiva sobre erros na pandemia, a campanha de inspiração nazista “o Brasil não pode parar” e vetou dossiês fascistas produzidos pela Abin e Ministério da Justiça, dentre outros. Por isso, há tempos os capangas radicais do bolsonarismo miram o STF, contra quem o capitão ameaça recorrentemente.

Treinando e lutando ao lado de amadores despreparados, a contagem regressiva parece já ter sido iniciada para Bolsonaro. Só triunfou no primeiro desafio com a ajuda de juízes parciais e desonestos. Até outubro são dez meses e já se ouve o coro no ginásio: 10, 9, 8, 7… Depois de milhares de mortes na pandemia, da ruína econômica, da volta da fome, da tentativa do desmonte do Estado, da corrupção, do casamento com Valdemar Costa Neto, do aviltamento do Legislativo e dos retrocessos em todos os cantos do ringue, dificilmente Bolsonaro se reerguerá da lona onde está estirado e convulsivo. O mais sujo valentão do Planalto de todos os tempos, adepto das brigas de rua, está desacordado, zonzo, cheio de hematomas e esguichando sangue.

A média de todas as pesquisas eleitorais registra algumas estabilidades convergentes desde maio: rejeições estridentes a Bolsonaro e o favoritismo crescente do desafiante de maior cartel, Luiz Inácio Lula da Silva, que treinou boxe na pandemia e se reaproxima do cinturão pela 3 vez. A vitória por pontos, que pode ocorrer ainda no 1 turno, já começa a afetar a bolsa de apostas, atrair apostadores do centro e arrependidos, para os quais Bolsonaro tornou-se um peso muito pesado, aliás um peso morto.

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