quarta-feira, 28 de setembro de 2022

Uma Frente Ampla para derrotar o fascismo

Fontes: Rebelión / Socialismo y Democracia [Imagem: Líderes políticos em apoio ao distintivo Lula-Alckmin, apontando o dedo para o L de Lula; que num passe de mágica transforma a pistola de Bolsonaro em esperança. Créditos: site do Lula]


“ Vamos caminhar, com todas as bandeiras,
trançado para que não haja solidão.
Vamos caminhar, para chegar à vida..."
Silvio Rodrigues

De acordo com a maioria das pesquisas eleitorais, o candidato Lula da Silva pode vencer no primeiro turno eleitoral no próximo domingo, 2 de outubro. No entanto, a ameaça de golpe divulgada por Bolsonaro em seus últimos comícios e aparições públicas ainda não se dissipou completamente. Durante sua breve estada em Londres, o ex-capitão declarou que, se não vencer no primeiro turno com 60% dos votos, será porque vai ser cometida uma fraude eleitoral que deve ser imediatamente rejeitada por seus seguidores. Por isso, alerta seus seguidores para ficarem atentos a uma possível derrota e não reconhecerem o triunfo de Lula. Isso procurará criar um clima de caos e violência no país que possa gerar uma situação de instabilidade que justifique a intervenção das Forças Armadas que, sob o argumento de restauração da ordem.

É um movimento desesperado e aparentemente louco, embora plausível. A questão é se as Forças Armadas estarão dispostas a endossar essa tentativa de golpe para manter Bolsonaro no poder por meio do uso de armas e repressão. As informações recolhidas nos meios militares levam-nos a supor que este cenário é rejeitado entre os representantes do alto comando, embora não ao nível dos quadros médios (coronéis, capitães e tenentes) que são precisamente aqueles que têm uma relação direta com as tropas .

Durante o governo Bolsonaro, as Forças Armadas tiveram tratamento privilegiado na estrutura de poder, onde mais de 6.000 militares participaram de tarefas de gestão executiva e administração, ocupando ainda mais cargos do que na época da ditadura militar, entre 1964 e 1985. A maioria deles recebe o dobro de salário, como soldados da ativa e como oficiais, o que tem levado muitos oficiais uniformizados de alta patente a obter valores exorbitantes pelas tarefas que desempenham.

No entanto, as Forças Armadas como um todo devem avaliar as consequências de participar de uma tentativa de golpe em um cenário cada vez mais hostil às prisões autoritárias do ex-capitão. Internamente, está sendo construído um amplo pacto em Defesa da Democracia e das instituições do Estado, como apontamos em coluna anterior ( Começa novo ciclo de mobilizações contra Bolsonaro). Por sua vez, a comunidade internacional também se manifestou repetidamente sobre a importância de respeitar os resultados das urnas, alertando para possíveis sanções políticas e comerciais se o atual governo insistir em se perpetuar no poder contra todas as probabilidades. Mais de uma centena de especialistas de diversas entidades hemisféricas e internacionais já estão no país e se dedicarão a monitorar a transparência e veracidade dos resultados das urnas.

Entre apreensão e esperança

Nunca será exaustivo insistir que a situação atual do Brasil implica a definição de uma encruzilhada dramática entre a escolha da democracia ou do autoritarismo, entre um projeto de desenvolvimento que busca consolidar os princípios da coexistência pacífica em um contexto de tolerância e pluralismo ou lançamento pelo obscurantismo representado pelas forças da ultradireita neofascista que pretendem se estender por mais quatro anos para continuar desmantelando o Estado Democrático de Direito. Este último com a conseqüente destruição das políticas públicas de inclusão social, a ausência de ações para resolver o aumento da fome e da miséria, o descumprimento de regulamentações que detêm a devastação ambiental,

O modelo fascista que Bolsonaro oferece à nação brasileira é mais ódio, mais terror, mais discriminação, mais preconceito e mais destruição. Sua proposta de continuar liberando a venda de armas e munições parece ter o propósito de fazer com que os cidadãos se matem, para que finalmente os habitantes do Brasil acabem em uma "guerra de todos contra todos", restaurando no século XXI o estado hobbesiano na natureza.

Diante desse dilema civilizador, um amplo espectro de forças democráticas se uniu em torno da candidatura do ex-presidente Lula da Silva, como atesta a recente reunião de ex-candidatos à presidência que conseguiu reunir desde o principal líder do Movimento da Sem-teto, Guilherme Boulos, ao banqueiro e ex-presidente do Banco Central, Henrique Meirelles. Nessa reunião, o espírito de unidade foi expresso na obtenção de uma vitória no primeiro turno para evitar os riscos de um confronto sangrento nas quatro semanas que separam os dois eventos eleitorais.

Como destacou o professor Cristovam Buarque, “precisamos evitar um segundo turno de qualquer forma, pois será uma tragédia prolongar esse processo até o final de outubro. Serão quatro semanas imprevisíveis do ponto de vista da violência nas ruas, das fake news para todos os lados. Ou nas palavras de Luciana Genro, ex-candidata à presidência em 2014 pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSOL): “O que nos une aqui, realmente, é uma frente antifascista. Estamos na iminência de um revés ainda maior se Bolsonaro for reeleito.”

Apesar de todos os pedidos e interpelações, o candidato Ciro Gomes (PDT) afirma que permanecerá na disputa eleitoral, afastando-se de qualquer possibilidade de integração dessa Frente Ampla que continua crescendo em torno da figura do ex-presidente Lula. Sem dúvida, a arrogância e o narcisismo de Ciro Gomes significarão para ele um custo enorme que deverá comprometer seriamente o futuro político de sua figura e de seu projeto.

Por outro lado, mesmo na hipótese de Lula vencer no primeiro turno, algumas considerações são necessárias para afastar o risco de que sua vitória seja contestada ou boicotada até 1º de janeiro de 2023, data da posse do presidente eleito. Isso significa que essa Frente Ampla não deve se limitar apenas a garantir a vitória no primeiro turno, mas deve se tornar um pacto indissolúvel em defesa da democracia, independente de eventuais ajustes de governança que possam surgir em um bloco político de amplo espectro. , como aquele que foi configurado nos dias de hoje.

A isso devemos somar toda a turbulência que se observa no cenário internacional, com a disparada dos preços dos combustíveis fósseis, cereais e outros produtos essenciais para estabelecer as bases de uma segurança alimentar estável e permanente no país. Para retirar novamente o Brasil do Mapa da Fome, será necessário fazer um grande acordo com os agentes econômicos e com os grupos fisiológicos do Centro entrincheirados em um Congresso que até hoje tem um colossal "orçamento secreto" que foi concedido pelo atual Chefe do Executivo como moeda de troca para apoiar sua reeleição.

Dessa forma, é fundamental que Lula consiga acumular uma enorme força política e cidadã que lhe permita superar os obstáculos que surgirão nos primeiros meses de seu governo, valendo-se de todo o seu carisma e capacidade de negociação, inclusive reorganizando o apoio popular ativo em torno de seu governo, um governo que, diga-se, não será mais exclusivamente do Partido dos Trabalhadores. Terá a seu favor uma população mobilizada para combater e erradicar os resquícios do fascismo herdados desses quatro anos de miséria, infortúnio e morte, desse período desastroso da história do Brasil.

Fernando de la Cuadra é doutor em Ciências Sociais, editor do blog Socialismo y Democracia e autor do livro De Dilma a Bolsonaro: itinerário da tragédia sociopolítica brasileira (Editora RIL, 2021).


Rebelión publicou este artigo com a permissão do autor através de uma licença Creative Commons , respeitando sua liberdade de publicá-lo em outras fontes.

Nenhum comentário:

Postar um comentário