quinta-feira, 1 de junho de 2023

América do Sul com Lula de volta ao mapa

Fontes: CLAE


Depois de anos em que governos de direita fizeram campanha no subcontinente para dividir forças, os 12 países da América do Sul se reuniram em Brasília para voltar a se ver e trabalhar pela recuperação de espaços de integração. Não é uma tarefa fácil.

O convite do presidente Luis Inácio Lula da Silva foi um sucesso: os presidentes da Argentina, Chile, Paraguai, Uruguai, Equador, Bolívia, Colômbia, Venezuela, Suriname e Guiana chegaram ao Palácio do Itamaraty, sede do Itamaraty em Brasília, mais o chefe do Conselho de Ministros do questionado governo do Peru.

O encontro entre líderes marca o retorno do presidente venezuelano ao espaço de integração regional. Durante sua presidência, Bolsonaro interrompeu as relações entre Brasil e Venezuela, chegando a ordenar o fechamento da embaixada e a expulsão de diplomatas do governo Maduro.

No discurso de abertura do encontro, Lula defendeu a revitalização da União das Nações Sul-Americanas (Unasul) como forma de fortalecer a integração regional. Mas deixou claro que está aberto a sugestões sobre o desenho institucional que melhor funcionar para levar esse processo adiante, independentemente de viés ideológico.

Antes, Lula havia esclarecido que nenhum acordo concreto para revitalizar a Unasul sairia da reunião, mas em seu discurso deu uma ideia de um roteiro. Propôs colocar a poupança regional a serviço do desenvolvimento econômico e social, mobilizando os bancos de desenvolvimento já existentes.

Ele também pediu o aprofundamento de nossa identidade sul-americana também no campo monetário, por meio de mecanismos de compensação mais eficientes e da criação de uma unidade de referência comum para o comércio, reduzindo a dependência de moedas extrarregionais.

Lula também defendeu a implementação de iniciativas de convergência regulatória, facilitando procedimentos e desburocratizando a exportação e importação de mercadorias; e ampliar mecanismos de cooperação de ponta, envolvendo serviços, investimentos, comércio eletrônico e política de concorrência.

O presidente da Argentina, Alberto Fernández, falou na mesma linha depois, em seus últimos meses de governo, ao contrário de Lula, que acaba de iniciar seu terceiro mandato. “Devemos garantir uma zona de paz e fazer algo para gerar um sistema de defesa na América do Sul e não esperar o que o Comando Sul diz sobre o que temos que fazer na América Latina”, disse Fernández, segundo a mídia argentina.

O presidente argentino lembrou o que aconteceu durante a pandemia da Covid-19 e a competição internacional pelo fornecimento de vacinas. “Todos corremos à procura de vacinas”, lamentou o presidente e convidou os seus pares a “combinar interesses, integrar-se fisicamente” para garantir direitos como a saúde em toda a região.

Assim, Fernández se referiu a duas das instâncias que a Unasul já constituiu e hoje faltam, como a coordenação dos ministérios da saúde e defesa dos países membros. Dos 12 países sul-americanos, cinco (Uruguai, Paraguai, Chile, Colômbia e Equador) não fazem mais parte da Unasul. Lula reconheceu que é preciso “avaliar criticamente o que não deu certo e levar em conta essas lições”.

“Deixamos que as ideologias nos dividam e interrompam o esforço de integração. Abandonamos os canais de diálogo e os mecanismos de cooperação e, com isso, todos perdemos", disse o presidente brasileiro, que disse ainda: "Não temos ideias pré-concebidas sobre o desenho do futuro institucional que poderíamos adoptar, queremos dialogar e saber a opinião de todos".

A agenda da cúpula, além da integração, abordou temas comuns nas áreas de saúde, infraestrutura, energia, meio ambiente e combate ao crime organizado. A ideia é retomar o diálogo e a cooperação com os países sul-americanos, identificar denominadores comuns para ver como se pode iniciar um caminho para voltar a ter um mecanismo de cooperação puramente sul-americano.

“Talvez seja a única região do mundo que não tem essa instituição de diálogo”, ressaltou Gisela Figueiredo Padovan, secretária para América Latina e Caribe do Itamaraty. Uma vez que a região possui capacidades e recursos que serão fundamentais para o futuro da humanidade, como recursos naturais, água, minerais e área para produção de alimentos, uma agenda concreta de cooperação pode ser iniciada imediatamente, acrescentou.

A última reunião em que estiveram presentes os 12 presidentes dos países que compõem a Unasul foi em 2014, no Equador. Após a destituição de Dilma Rousseff em 2016 por impeachment, a região viveu uma onda de governos de direita e a Unasul como mecanismo de integração sul-americana ficou em segundo plano

A foto de família nos amplos espaços do Itamaraty deixou claro que há muito o que percorrer. Queridos ou não, ou talvez para evitar grosserias diante das câmeras, a maioria dos presidentes progressistas ficou à direita de Lula, e à esquerda, os de direita.

Por ora, o encontro em Brasília deixa clara a centralidade de Lula e sua diplomacia, para marcar o ritmo do que está acontecendo no subcontinente que concentra as maiores reservas de petróleo, biodiversidade, água potável e lítio do mundo. Todos os olhos estão novamente voltados para a América do Sul.

*Jornalista argentino da equipe fundadora da Telesur. Correspondente da HispanTv na Venezuela, editor de Questiondigital.com. Analista associado ao Centro Latino-Americano de Análise Estratégica (CLAE, estrategia.la)

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