segunda-feira, 24 de julho de 2023

A “democracia quântica” e a luta de classes


Carlos D'Incao
www.brasil247.com/

Nossa democracia é um caso muito peculiar:

A democracia brasileira é exemplo de um objeto que, se pertencesse ao mundo físico, seria logo posto em análise pelos físicos quânticos, analisando suas atomizações, suas contradições desregradas (que passam longe da contradição dialética), seus espaços vazios que interagem e se unem por vezes de forma quase aleatória… seria, por fim, proposta aos químicos sua introdução na tabela periódica como um novo elemento químico de alta volatilidade e fortemente radiativo.

Mas das sombras do mundo nebuloso e embrionário das ciências naturais, podemos extrair a democracia brasileira para caminharmos com mais clareza na análise do processo histórico de formação social desse país e entendermos os seus elementos de dissuasão que lhe impediram de assumir uma forma melhor definida.

Fazer a História fatual do Brasil seria aqui tentar se valer da matemática no mundo quântico. Ela serve como elemento confirmativo ainda que tenha surgido de forma anterior à análise final. Então, para abreviar, quais são as chaves para compreender nossa democracia e a realidade a qual estamos inseridos? Vejamos.

O Brasil é um caso muito especial de desenvolvimento sem atingir superações em seu nível mais desenvolvido e radical. Assim, a escravidão foi abolida, mas os escravistas continuaram e impuseram sua ordem social à população negra; a monarquia foi derrubada, mas os mecanismos de gerenciar e influenciar o Estado não se alteraram - o que leva à República sempre a assumir formas ditatoriais ou muito pouco democráticas. Vamos além:

O exército brasileiro foi praticamente fundado na guerra do Paraguai, mas por séculos sempre as forças de segurança foram mercenárias. Quando a guerra contra o Paraguai acabou, sua estrutura e mentalidade continuaram iguais: elitistas, servilistas e mercenárias. Não temos um exército para defender o povo, mas para reprimi-lo, torturá-lo e - quase que sempre - a serviço do imperialismo.

Nossa elite dominante desde tempos coloniais vinham para o Brasil com o sonho de voltar a Portugal… a República veio, desenvolvimentos econômicos fantásticos foram alcançados junto com tantas constituições que foram sendo elaboradas ao longo do tempo… mas ainda a nossa elite não tem um pingo de republicanismo e seu sonho continua o mesmo: saquear as riquezas da nação para se mudar do país…

Ou seja, nossa democracia vive sobre os escombros de forças e interesses que nunca foram superados nos levando a uma última questão: e a luta de classes? Para além disso, e a consciência de classe? Ao longo do nosso processo histórico criou-se um país brutalmente desigual.

O fato de a elite ser patriarcal, cristã e branca são heranças vindas da época da grande expansão marítima comercial. Ou não há lutas de classes nos países governados por ditadores na África subsaariana, com outras religiões e modus vivendi? Ali se vende as riquezas naturais ao capital estrangeiro da forma como Lênin poderia facilmente compreender.

O que é mais difícil entender é como a luta de classes no Brasil se atomizou ou até mesmo se Norte-americanizou na falácia do identitarismo.

De um lado temos uma democracia soterrada de escombros mal resolvidos do passado e de outro a luta de classes soterrada de confusões, incompreensões, pós-modernismos…

No fim, ou a consciência de classe se instaura no país no seio da classe trabalhadora e, ela sozinha, remove os escombros sobre a democracia brasileira, tornando-a em uma democracia popular; ou os escombros do passado se realinham e formam um grande Leviatã fascista que carrega consigo os mais modernos aparatos da manipulação de massas junto com as velhas correntes do escravismo do século XVI.

Não há espaço no front da luta, pelo o que está posto, para nada além da luta de classes. As outras pautas são legítimas, mas nunca irão se sobrepor ao principal instrumento de luta sobre o argumento atomizado (individualista) de uma específica condição de gênero, cor, etc.

A ordem histórica demanda união de todos contra essa forma grotesca de Estado que, no fim, representa a ordem do capital. Na ordem do capital - sobre a forma brasileira - só uma coisa é democrática: a chibata. Aqueles que acham que a chibatada será mais forte em uma determinada identidade ou gênero ou raça, não devem causar divisionismos, ao contrário, devem ser a vanguarda da união e o elo mais forte da união de todos os oprimidos.

Agora estamos vivendo dias de sol no governo Lula. Mas Lula já veio e sua sucessão foi o fascismo. Lula voltou. Quem disse que o fascismo morreu? Ainda que se prenda Bolsonaro e se encerre o bolsonarismo. Ainda assim, a opressão surgiu com Bolsonaro? Ou possui suas raízes nos porões dos escombros que sufocam a democracia brasileira? Bolsonaro representou o novo, ou apenas libertou o arcaico?

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