sexta-feira, 21 de julho de 2023

Quem adere à nova Guerra Fria é atrasado

Lula, Volodymyr Zelensky e Vladimir Putin (Foto: Reuters)

"Lula resiste à pressão de abandonar a neutralidade em relação à Ucrânia e de aderir à nova Guerra Fria. Nossa mídia diz que ele é 'atrasado'", critica Zero

Marcelo Zero

Lula resiste à pressão dos EUA e de aliados europeus de abandonar a neutralidade em relação à guerra na Ucrânia e de aderir à nova Guerra Fria.

Por isso, é criticado. Nossa mídia, completamente ignorante em geopolítica ou que finge desconhecer as origens do conflito, diz que ele é “atrasado”. Que está em outras décadas. Comparam-no a Boric, que seria “moderno”.

Total inversão de valores.

A nova Guerra Fria guia-se pela mesma lógica arcaica, binária, maniqueísta e excludente da antiga. Divide o mundo entre os “bons” (EUA e aliados) e os “maus” (Rússia, China e todos aqueles que não se alinham com o chamado Ocidente).

Com a desculpa hipócrita e esfarrapada de defender a democracia e os direitos humanos, os “bons” fazem intervenções militares e impõem draconianas sanções a todos aqueles que eles julgam merecer alguma punição.

Estudo da Brown University estima que as “intervenções” feitas por EUA e aliados após o 11 de setembro (Afeganistão, Síria, Iraque, Somália, Líbia etc.) mataram cerca de 4,5 milhões de pessoas, a grande maioria civis. Além disso, deslocaram 38 milhões de pessoas de suas terras. Tudo muito moderno e democrático.

Agora, esse pulcro segmento dos “bons” quer impor ao resto do mundo uma cruzada insana e irracional contra Rússia, China etc.

No caso da Rússia, alega-se que que esse país faz uma guerra de “agressão imperialista” na Ucrânia.

Tem de ser um completo ignorante ou alguém de profunda má-fé para fazer uma afirmação desse tipo. Claro está que a intervenção russa na Ucrânia é violação da Carta das Nações Unidas e merece condenação. Lula e o Brasil condenaram. Mas dizer que é uma “agressão imperialista” é algo francamente parvo. E a falta de inteligência nunca será algo “moderno”.

Qualquer pessoa que tenha um mínimo de informação histórica sabe muito bem que a intervenção russa é geoestrategicamente defensiva. Não precisa ler Dugin e assemelhados. Basta ler norte-americanos racionais (uma espécie minoritária, reconheço), como Kissinger, MacNamara, George Kennan, John Matlock, Jeffrey Sachs etc. etc.

No caso da China, alega-se, entre outras coisas, que esse país quer “invadir Taiwan”. Ora, tanto as Nações Unidas quanto os próprios EUA reconhecem que Taiwan é parte da China. Em todo o mundo, só uma meia dúzia de nações, como o Paraguai, reconhecem Taiwan como país. Quem sabe o moderno Chile queira fazer parte desse seleto grupo.

Ironias à parte, o fato é que aderir a essa nova Guerra Fria é o que há de mais atrasado no mundo.

É aderir à violência, ao unilateralismo, ao belicismo. É querer fazer parte de um arcaico e inviável mundo unipolar. É não aceitar as profundas mudanças geopolíticas e geoeconômicas que ocorreram no planeta e querer voltar para a década de 1990.

Para usar a passagem da moda do grande poema sânscrito, é aderir à Morte, a destruidora de mundos. O terrível dharma do Ocidente.

Aderir à nova Guerra Fria é também algo profundamente antidemocrático. É propugnar por um mundo intolerante, mascarado na democracia como valor absoluto. Quem se desvia do padrão imposto, tem de ser rigorosamente punido com intervenções e sanções. E que se dane a população inocente. Que se dane a paz.

Felizmente, a maior parte dos países do planeta é “atrasada” como o Brasil.

Não querem guerra, fria ou quente. Querem prosperar e viver em paz.

E não há nada mais clássico e mais moderno do que isso.

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