LIBERDADE ASSISTIDA NO CEM 414 DE SAMAMBAIA-DF
Nonato Menezes - É notícia chique, cheia de estilo e afã. É
modernoso o feito kitsch do Centro de Ensino Médio 414 de Samambaia de costurar
um chip no uniforme dos estudantes do Ensino Médio para serem monitorados por
seus pais na entrada e saída da escola. É espetaculoso pela divulgação em
veículo impresso de cobertura nacional que não irá além da pretensão de intuir
opinião a partir do que é publicado.
O
sentido pedagógico do monitoramento é tão ineficaz quanto o bater de asas de
uma borboleta no mar da China e a formação das marolas no Estreito de
Magalhães. Talvez seja por isso que é mais fácil um feito de “vanguarda do
atraso” do que cuidar do que é essencial no processo de ensino e aprendizagem. Essencial
enquanto problema que essa escola e tantas outras fazem de conta que não
existe.
Reprovação
e abandono são problemas recorrentes e de alto índice nessa escola. O primeiro,
por exemplo, conforme os dados do censo de 2011, na 2ª série, chegaram a 26,9%,
enquanto os que abandonaram na 1ª série, chegaram aos 22,9%. Para os gestores e
comunidade escolar que não se preocupam com os efeitos destes indicadores, que
sequer se inquietam com seus prejuízos, sejam econômicos e ou pedagógicos, nada
mais razoável que encontrar motivos para os pais acompanharem seus “androides”,
já crescidinhos, na entrada e saída da escola, como corretivo disciplinar e,
para alguns, como caminho expresso para pais ajudarem a fazer o mínimo que ela
não consegue.
O
feito não é só ingênuo, é inútil, também. Por um lado é enganador para os pais,
pois controlar entrada e saída dos filhos na escola não garante desempenho, nem
mesmo assegura aquisição de valores necessários à vida, como disciplina, por
exemplo. Por outro, em nada ajuda àqueles que não têm a escola como um ambiente
agradável, democrático que lhe proporcione mais prazer em estar dentro do que
fora dela.
Se
de inteligente e útil o feito não tem nada, tem sentido quando lembramos de um
instrumento que a escola já utiliza há bastante tempo: o diário de classe.
Referenciado na escola mais por seus efeitos alienantes do que pelo sentido de
utilidade, o diário de classe surgiu nas prisões para escriturar as ações dos
detentos em suas rotinas diárias.
De
mesma origem institucional, o chip no uniforme para estudantes tem como
precursor a pulseira e tornozeleira usadas para monitoramento à distância nos
sistemas prisionais, cujas descrições de suas utilidades – para quem defende - são
feitas assim: “o controle à distância de condenados ou
de suspeitos que aguardam julgamento, por meio de pulseiras ou tornozeleiras,
pode ajudar a diminuir a incidência de fugas e a superlotação do complexo
carcerário brasileiro.
Recursos
serão economizados e haverá ganhos de eficiência no controle de detentos com direito
a ausências temporárias da prisão. Ganham ainda os próprios presos, quando
considerados de baixa periculosidade, pela oportunidade de acesso a regimes
menos severos no cumprimento da pena”.
Ao
invés de pregar um chip no uniforme dos estudantes com intuito de reforçar
patrulhamento, a escola deveria colocar em seus programas e conteúdos valores
como liberdade, disciplina, pontualidade, justiça e outros. Envolver a
comunidade numa ação honesta e capaz de enfrentar os problemas tão recorrentes
como reprovação, evasão e baixo desempenho.
Para
tanto, essa escola e tantas outras só precisam de coragem, valor que não se
aplica ao fazerem de seus estudantes meros autômatos.
Nonato Menezes
É professor na Rede Pública de
Ensino do DF

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