Leituras pertinentes - VII

 A VIRTUDE É UM HÁBITO

Aristóteles
 A base da felicidade é a virtude.

            Nenhuma virtude moral existe em nós enquanto produto imediato da natureza, porque nada daquilo que provém da natureza pode ser alterado pelos costumes. Assim, a pedra, cuja tendência natural a puxa sempre para baixo, nunca alterará esta direção mesmo que nos esforcemos por acostumá-la a uma direção contrária, lançando-a ao ar vezes e vezes sem conta... Numa palavra, não há qualquer meio de, através dos costumes, alterar as inclinações ou as tendências impressas pela natureza. Portanto, as virtudes nunca são em nós fruto da natureza, nem, evidentemente, contrárias a ela. A natureza torna-nos suscetíveis de receber as virtudes, cabendo a nós aperfeiçoá-las através do hábito (...)

            Após termos agido de uma forma conforme a virtude é que adquirimos virtudes. O mesmo sucede em relação às outras artes; porque a prática é nosso principal meio de instrução no caso das coisas que só fazemos bem quando as sabemos fazer. Por exemplo, é construindo que nos tornamos pedreiros, tocando lira que nos tornamos músicos. Do mesmo modo é praticando a justiça que nos tornamos justos e praticando a temperança que nos tornamos sóbrios e moderados nos nossos desejos; assim como, finalmente, é fazendo atos de coragem que nos tornamos corajosos.
            Aquilo que se passa nas sociedades civis é prova disso, é levando os cidadãos a contrair bons hábitos que os legisladores os tornam virtuosos. Assim, é na execução de todos os tipos de convenções e transações que têm lugar entre os homens que nós nos mostramos como somos, uns justos, e outros injustos; é nas ocasiões em que há perigos a enfrentar que tomamos hábitos de timidez ou de coragem, que nos tornamos covardes ou corajosos.
            O mesmo acontece com as paixões, os desejos e a cólera. Porque o hábito de nos comportarmos, nas mesmas circunstâncias, uns de uma maneira e outros de outra, leva a que os homens se tornem, uns, sábios e moderados; os outros, debochados e arrebatados. Enfim, é da repetição dos mesmos atos que nascem os hábitos; e eis por que é necessário que as ações estejam submetidas a um modo determinado, porque é das suas diferenças que nascem os diversos hábitos. Portanto, não é indiferente que nos acostumemos desde tenra idade a agir desta ou daquela maneira.



(PEREIRA, José Otaviano. O equilíbrio do ser. São Paulo, FTD, 1990.   

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