Luis Nassif - IG
A primeira vez que ouvi falar nas pesquisas do Ibope sobre o
governo Jango foi em um congresso da Wapor (a associação latino-americana de
pesquisas de opinião) em Belo Horizonte. Participei de um debate sobre o novo
papel dos blogs junto à opinião pública. Um dos papers apresentados mencionava
dados gerais da pesquisa, localizada nos arquivos que o Ibope doou à Unicamp.
Nesta semana, na Carta Capital, há uma entrevista de Rodrigo
Martins com o historiador Luiz Antônio Dias sobre as pesquisas. Os números são
impressionantes:
· Em junho de 1963, Jango era aprovado por 66% da população
de São Paulo, desempenho superior ao do governador Adhemar de Barros (59%) e do
prefeito Prestes Maia (38%).
· Pesquisa de março de 1964 revela que, caso fosse candidato
no ano seguinte, Goulart teria mais da metade das intenções de voto na maioria
das capitais pesquisadas. Apenas em Fortaleza e Belo Horizonte, Juscelino
Kubitschek tinha percentuais maiores
· Havia amplo apoio à reforma agrária, com um índice
superior a 70% em algumas capitais.
· Pesquisa na semana anterior ao golpe, realizada em São
Paulo a pedido da Fecomercio, apontava que 72% da população aprovava o governo
Jango.
· Entre os mais
pobres a popularidade alcançava 86%.
· 55% dos paulistanos consideravam as medidas anunciadas por
Goulart no Comício da Central do Brasil, em 13 de março, como de real interesse
para o povo.
· Entre as classes A e B, a rejeição a Goulart era um pouco
maior em 1964. Ao menos 27% avaliavam o governo como ruim ou péssimo na capital
paulista.
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É o mais contundente documento até agora divulgado sobre o
desproporcional poder político dos grupos de mídia na democracia brasileira e
latino-americana no século 20.
Quase todas as ditaduras latino-americanas foram
implementadas por meio de golpes de Estado legitimados por um suposto apoio da
opinião pública. E esse apoio era medido exclusivamente pelo volume de notícias
veiculados nos grupos de mídia, e pela mobilização que conseguiam em algumas
classes sociais. Um enorme espectro da opinião pública passava ao largo desse
jogo restrito.
***
Depois da redemocratização, houve vários golpes de Estado institucionalizados
no continente, não apenas contra governos ditos de esquerda - como o fracassado
golpe contra o venezuelano Hugo Chávez - como contra governos tidos como de
direita - Fernando Collor, no Brasil, Carlos Andrés Perez, na Venezuela.
Em todos os episódios, juntavam-se interesses contrariados
de grupos políticos e de grupos de mídia. Levantavam-se denúncias sólidas ou
meros factoides, criava-se a atoarda, passando a sensação de que a maioria da
opinião pública desejava a queda do governante.
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O ponto mais relevante das pesquisas do Ibope é mostrar que
a chamada opinião pública midiática sempre foi um segmento minoritário indo a
reboque de uma aliança que incluíam os grupos, alguns partidos conservadores e
alguns interesses do grande capital.
Esse modelo, que domina o debate econômico e político em
todo século 20, chega ao fim com o advento das redes sociais.
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