Aqui está uma das razões da
reeleição de Dilma contra a reação golpista
por Mino Carta
Conto uma história singela. Minha
doméstica se chama Severina da Silva e está comigo desde 1981. É da minha
família. Casada, 61 anos, casa própria, dois filhos formados engenheiros pela
USP e muito bem empregados. Nasceu no Recife, onde vivem a mãe, lúcida aos 97,
e a irmã Maria das Dores. E esta liga na segunda-feira 20, e informa: “Votei na
Dilma e domingo volto a votar”.
Todos os nossos Silva estão com
Dilma, no Recife e em São Paulo. “Deus me livre do Aécio ganhar – diz Maria das
Dores –, quero realizar o sonho de visitar vocês de avião.” Severina já foi ao
Recife três vezes, logo mais virá a irmã. Ambas de avião.
Enredo rigorosamente verdadeiro e
altamente simbólico, chave do mais claro entendimento da vitória que Dilma
Rousseff colhe ao se reeleger para a Presidência da República. Neste mesmo
espaço na edição de 24 de setembro passado eu me atirava “a um vaticínio que
muitos reputarão prematuro”. Ou seja, previa que a nação saberia “evitar o
risco” de eleger quem representa o regresso.
Aí está o sentido do apoio de
CartaCapital à permanência da presidenta Dilma. Sua vitória é a garantia da
continuidade da política social e da política exterior independente executadas
nos últimos 12 anos. Ganhamos agora a certeza de que o neoliberalismo não
vingará, que o salário mínimo não será cortado, que a Petrobras não será
privatizada, que o pré-sal não será loteado.
CartaCapital nunca deixou de
manifestar a sua decepção com o PT que vi fundar e que por muito tempo na
oposição desempenhou a contento o inédito papel de verdadeiro partido para, no
poder, imitar os demais. Partidos se declaram, impropriamente. Inegável é,
porém, que o governo, por cima e às vezes à revelia da maioria parlamentar,
privilegiou os interesses do País.
Verifica-se, assim, uma estranha
discrepância de comportamentos. É como se o PT tivesse perdido a sua identidade
enquanto o governo mantinha a fé inicial. Dizia um sábio: quem perde a
ideologia torna-se contemplativo. Sim, a gente sabe, não faltam aqueles que
decretam o enterro das ideologias. De algumas, sim, contingentes, varridas pelo
fracasso. Outras as substituem, coerentes com o tempo que passa. E uma ideia
não morre, a da igualdade, tanto mais no nosso Brasil ainda tão desigual.
Nesta eleição, até pareceu só ter
valor a ideologia reacionária e golpista. Já a alternância no poder se
aplicaria somente no plano federal. No estadual, caberia analisar caso a caso.
Em São Paulo, por exemplo, a alternância não se recomenda, de sorte a permitir
que o governo tucano prossiga no seu caminho
de desmandos e desastres.
Está claro que se o PSDB vencesse
não se daria apenas a frustração de Maria das Dores. Voltariam, antes de mais
nada, as ideologias professadas à sombra de Fernando Henrique Cardoso. Contra
Aécio Neves nada tenho na esfera pessoal. Conheço-o, como esclareci em outras
oportunidades, há mais de 30 anos, desde quando carregava a pasta do avô
Tancredo. Ao longo da campanha, deu-se quanto antecipamos. Foi tragado pelo
apoio da mídia nativa e se entregou ao golpismo separatista de São Paulo,
sobretudo.
Textos foram publicados, e falas
proferidas, de puro humorismo no decorrer do percurso. Não me refiro,
obviamente, a quem viu no Brasil um país rachado em dois. FHC incumbe-se de
exibir a fratura e se torna valioso cabo eleitoral de Dilma. Se bem entendi,
ele faz a diferença entre ricos cultos e pobres desinformados. De verdade, o
Brasil sempre esteve a pagar por três séculos e meio de escravidão e a manter
de pé casa-grande e senzala. De um lado, a minoria que pretende deixar as
coisas como estão. Surge, porém, do outro, quem gostaria de enterrar de vez a
herança maldita. A bem de todos.
Aquela acredita viver em Dubai no
topo da pirâmide, ou em patamar inferior, sonha em chegar lá. Felizmente, na
maioria figuram cidadãs como Severina e Maria das Dores. Elas percebem o que
lhes convém.

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