A
controvérsia sobre o uso da tortura pela CIA obscurece dois aspectos
importantes da 'guerra contra o terror', que a agência finge estar combatendo.
Patrick Cockburn
- Esquerda.net / http://cartamaior.com.br/
A
primeira é que esta guerra fracassou comprovadamente já que o EI (Estado
Islâmico), que são terroristas segundo qualquer definição do termo, governa
atualmente uma grande parte do Médio Oriente no norte de Iraque e no leste da
Síria.
Conseguiu
este êxito apesar dos enormes orçamentos das agências de segurança
norte-americanas e europeias após o 9/111. Não só não conseguiu evitar que
ocorresse: nem sequer se deram conta do que estava a ocorrer até ser demasiado
tarde. Eram bem mais felizes concentrando-se no núcleo da al-Qaeda e em Osama
bin Laden, que não era muito grande, inclusive antes de perder as suas bases no
Afeganistão em 2001.
A
contínua ameaça da al-Qaeda foi exagerada e a organização foi descrita após
2001 como uma espécie de mini-Pentágono com altos funcionários que poderiam ser
eliminados ou capturados periodicamente, proporcionando a Washington sucessos
politicamente úteis. Mas nos últimos treze anos as operações atribuídas à
al-Qaeda eram na sua maioria mesquinhas. O resultado final das operações da CIA
foi o triunfo de um grupo, que defende a mesma ideologia e os mesmos objetivos
de Bin Laden, e o estabelecimento do seu próprio estado, que se estende desde a
fronteira com o Irão até aos arredores de Alepo.
Um
segundo aspeto da guerra contra o terrorismo é que desde o princípio evitou
dois países, sem cuja cumplicidade o 9/11 não poderia ter acontecido: A Arábia
Saudita e o Paquistão. Era evidente poucos dias após o 9/11 que cidadãos da
Arábia Saudita estavam muito implicados, sendo 15 dos 19 sequestradores
sauditas. Bin Laden fazia parte da elite saudita e a investigação
norte-americana sobre o ataque descobriu que o financiamento da al-Qaeda tinha
a sua origem principalmente em doadores privados no reino saudita. Mas o
presidente George W Bush e a sua administração não só evitaram cuidadosamente
apontar a Arábia Saudita, como censuraram 28 páginas do relatório oficial sobre
o seu papel apesar das súplicas das vítimas do 9/11. O presidente Obama
prometeu, enquanto era candidato, permitir a publicação dessas páginas, mas
nunca o fez.
A
al-Qaeda utilizou o Afeganistão como seu santuário e os EUA derrubaram por isso
os talibãs em 2001, mas era um segredo de polichinelo que os talibãs tinham
sido patrocinados e até criados pelo ISI, a agência de segurança militar do
Paquistão. Uma vez que o furor pelo 9/11 se extinguiu, o Paquistão voltou a
fazer exatamente o mesmo, e graças a isso os talibãs foram capazes de travar
uma longa guerra de guerrilhas até recuperar o poder. Mas, apesar de os EUA
dizerem estar a lutar contra a al-Qaeda, nunca enfrentaram o Paquistão, que era
o sócio silencioso dos talibãs. Quando Bin Laden foi seguido até Abbottabad,
perto da academia militar mais importante do Paquistão, era muito provável que
a sua presença fosse conhecida dos serviços de segurança do Paquistão.
A
al-Qaeda era um objetivo útil para a CIA porque era o vilão do 09/11 e uma
força demoníaca aos olhos da opinião pública norte-americana. A destruição das
Torres Gémeas tinha esgotado a sua capacidade e poderia ser combatido sem
grande dificuldade. Quando grupos muito semelhantes à al-Qaeda cresceram e
floresceram em Iraque, Síria e Líbia depois de 2011, não foram identificados
como parte do grupo original.
Agora
anunciam-se êxitos na luta contra a al-Qaeda no Iemen, mas sem prestar atenção
ao facto de que jihadistas que juraram lealdade ao EI se apoderaram da cidade
líbia de Derna e são uma força crescente em todo o país. É possível que a CIA
seja culpada de ter torturado suspeitos, mas isto é apenas um aspeto de um
falhanço muito maior do qual nunca teve que prestar contas.
Artigo
de Patrick Cockburn*, publicado em The Independent, traduzido por Enrique
García para sinpermiso.info e por Carlos Santos para esquerda.net
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