A China visualiza a possibilidade
de reduzir o custo logístico da importação significativa que faz da soja
brasileira.
José Augusto Valente / http://cartamaior.com.br/
Presidentes da China e do Brasil
assinaram, nesta semana, 35 acordos de cooperação, englobando áreas como
planejamento estratégico, transportes, energia e agricultura. Com isso, Brasil
e China enviaram ao mundo um forte sinal de fortalecimento das relações dos
Brics. Há muita coisa importante nesses acordos bilaterais assinados, mas
ganhou destaque na imprensa a possibilidade de construção de uma ferrovia
ligando os oceanos Atlântico e Pacífico.
O propósito deste artigo é
comentar esse ponto, mostrando que há um acúmulo histórico sobre o assunto, e
apontar os desafios a superar que estão colocados.
Já em 1996, um estudo
desenvolvido pelo Geipot teve como objetivo caracterizar possibilidades de
ligações terrestres e fluviais entre o Brasil e a Bolívia, o Equador, o Chile e
o Peru. O estudo analisou dez corredores alternativos, distribuídos em toda a
extensão do território brasileiro e em grande parte da América do Sul.
Por outro lado, no período
2001-2009, no âmbito da Iniciativa para la Integración de la Infraestructura
Regional Suramericana – Iirsa, foram identificados dez eixos. Quatro abrangem
áreas de influência situadas entre os oceanos Atlântico e Pacífico, sendo,
portanto, de especial interesse para o Corredor Bioceânico.
Mais recentemente, a Valec
estudou a Ferrovia Transcontinental, planejada para ter aproximadamente 4.400
km de extensão em solo brasileiro, entre o Porto do Açu, no litoral do estado
do Rio de Janeiro e a localidade de Boqueirão da Esperança/AC, como parte da
ligação entre os oceanos Atlântico, no Brasil, e Pacífico, no Peru. Entre
Campinorte/GO e Vilhena/RO, com estimados 1641 km de extensão, essa ferrovia é
denominada Ferrovia de Integração do Centro Oeste – Fico e está no Programa de
Aceleração do Crescimento (Pac).
Segundo o acordo firmado agora
entre Brasil e China, será feito o estudo de viabilidade técnico-econômica da
ligação da Fico até um porto no Peru, atravessando a cordilheira dos Andes.
Embora a China visualize a
possibilidade de reduzir o custo logístico da importação significativa que faz
de soja brasileira, a finalidade de integração sul-americana deve ser
igualmente ou mais valorizada neste projeto.
Nesse sentido, um aspecto a
ressaltar é que a mesma infraestrutura ferroviária para transporte de carga
poderá ser utilizada para passageiros, com veículos que podem desenvolver até
200 km/hora (tecnologia Pendolino).
Do ponto de vista da integração,
as cargas de maior valor agregado produzidas nos países sul-americanos poderiam
ser movimentadas em menor tempo e custo, com impacto significativo para as
nossas economias.
Voltando ao interesse declarado
dos chineses, que é soja e minério de ferro, a dúvida quanto à redução do preço
final da soja, por conta de eventual redução de custo, reside no fato de que,
na cadeia logística da soja, o elo forte é o embarcador, ou seja, aquele que
comercializa sua a produção. Assim, qualquer redução de custo logístico
provavelmente será apropriada pelo embarcador, uma vez que ele controla toda a
cadeia, definindo o preço no mercado e contratando os operadores logísticos.
Além disso, tem comprador garantido.
Outra dúvida é quanto à
flexibilidade da tarifa cobrada no Canal do Panamá, por onde passam os navios
saindo dos terminais do norte e nordeste do país, ou mesmo de Santos, São
Francisco do Sul e Paranaguá em direção à China. Como o frete marítimo é,
normalmente, a metade do frete ferroviário, o que pesa, atualmente, é o
"pedágio" do Canal. Há, portanto,
a possibilidade de que esta tarifa seja reduzida o suficiente para
garantir que o transporte marítimo continue sendo a melhor alternativa.
De todo modo, o estudo de
viabilidade dirá o que é possível em relação a esse mercado. Assim, estou
animado quanto ao objetivo de integração sul-americana e um pouco cético quanto
ao principal objetivo da China ao financiar esse estudo.
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José Augusto Valente é
especialista em logística.
Créditos da foto: Roberto
Stuckert Filho/PR
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