Partimos do diagnóstico de que o PT está sem vida. Não
reconhecer isso bloqueia qualquer tentativa séria de mudança. Mas de onde a
mudança pode vir?
Alana Moraes, Jean Tible e Josué Medeiros / http://cartamaior.com.br/
Nas últimas semanas, várias expressões do petismo (filiados e não filiados ao PT) lançaram o manifesto “O PT não vai matar o petismo” e o texto-tese “Da classe do Lula à classe do lulismo: emergência, conexões e os transbordamentos do petismo”, como contribuições ao V Congresso do partido. Uma declaração de amor desde o petismo e em dois tempos. Centenas assinaram ou curtiram, alguns se incomodaram, muitos criticaram e dialogaram. Ótimo!
Partimos do diagnóstico de que o PT está sem vida. Se antes podíamos dizer que, em todas as lutas potentes, membros do partido estavam presentes e frequentemente as protagonizando, hoje, claramente, não é mais o caso. O PT do Orçamento Participativo, que acolheu o Fórum Social Mundial e inspirava a esquerda mundial já não existe. Não reconhecer isso bloqueia qualquer tentativa séria de mudança.
De onde a mudança do PT pode vir? Do petismo, seu sentimento e lutas pulsantes. Do petismo em diálogo e articulado com as revoltas de uma nova geração mundo afora (15M na Espanha, Occupy nos EUA, praças Syntagma, Tahrir e Taksim, dos “pinguins” no Chile e do junho brasileiro), em conexão com os que clamam e agem por participação política. Intervenção direta, e não representação. O PT nasce e se cria nesse ímpeto rebelde, contra a transição à democracia negociada por cima entre as elites que haviam, muitas das vezes, sustentado o regime militar. Contra uma esquerda temerosa/conservadora que reagia negativamente às greves e às lutas – “ingênuos”, diziam. E junto com a entrada em cena de novos personagens (mulheres, operários, camponeses, movimentos populares...). Um partido radicalmente democrático.
O PT de hoje deve indicar claramente que não é parte da casta política e econômica corrupta. A questão a responder, em nossa opinião, é: como fazer com que as estruturas partidárias (o PT) se abram aos filiados, militantes, simpatizantes, apoiadores críticos (o petismo) de forma permanente e contínua, e não apenas nos processos internos de escolha de direção e nas eleições gerais e parlamentares?
Vozes recentes se expressaram nesse sentido. Nos somamos a essas vozes, mas seguimos em diálogo crítico, cobrando/propondo um passo além que responda ao questionamento que formulamos acima. Patrus Ananias identificou o partido na encruzilhada e propôs o fim das doações empresariais no PT, o fim das eleições diretas sem debate e o controle das finanças partidárias pelos filiados. Ótimo! Mas e os candidatos petistas, continuarão liberados para se relacionar com empreiteiras, bancos etc.? O fim do PED garante um processo participativo permanente no PT?
O documento “Vencer a crise do partido”, da tendência Democracia Socialista, faz um chamado à reconstrução petista à qual nos somamos. Nesse caminho, enfatizamos a urgência de radicalizar na questão da plataforma participativa e na conexão com novas formas de atuar politicamente, desde as ruas, praças e redes.
Tarso Genro propôs uma frente de esquerda no Rio de Janeiro contra o PMDB de Eduardo Cunha, o exterminador de direitos. Muito bom. Mas ela seria construída por quem? Direções partidárias, parlamentares, intelectuais. E a cidadania ativa? Os coletivos, núcleos, círculos e redes que, com seu ativismo, produziram a resistência ao peemedebismo e, com sua energia nas ruas, ajudaram a reeleger Dilma? E os jovens do Rio que ainda estão presos ou respondem a processo por se manifestarem em junho: participarão dessa frente conosco? O que dizemos a eles?
José Dirceu ressaltou a necessidade de uma nova repactuação partidária. Sem detalhes, só nos cabe perguntar: quem vai repactuar? Os mesmos de sempre? Rui Falcão falou em mudar o PT para seguir mudando Brasil, mas não apresenta uma única mudança nas dinâmicas partidárias em seu texto!
Desde junho de 2013, Lula fala em mudanças e renovação. Excelente! Mas esse anúncio não é acompanhado de gestos e medidas concretas e, pior, vem acompanhado de uma injusta e equivocada vinculação entre os erros da direção, a crise do partido, e as cotas para mulheres, negros e jovens, que estariam “enfraquecendo” o perfil dirigente do partidário.
Insistimos uma vez mais: o PT está sem vida. O que é mais angustiante e contraditório é que o petismo – em seu sentido amplo, com não filiados, eleitores e simpatizantes, filiados que jamais conseguiram participar da vida partidária – segue pulsante. A bela e vitoriosa greve dos professores do Paraná contou com a participação ativa desse petismo. O mesmo ocorre com a greve dos professores de São Paulo. O petismo está firme e ativo nas lutas contra a agenda Cunha (a terceirização, a reforma política que acaba com a democracia e a redução da maioridade penal). Como então fazer com que isso tudo afete o partido?
Para o processo de reflexão, propormos os seguintes caminhos (de ação):
- - Convocação imediata de novas eleições internas (com financiamento partidário, justo, transparente, coletivo e igualitário);
- - Políticas de transparência e participação nas finanças partidárias;
- - Abertura de debates para a construção de uma nova agenda que inclua no seu centro: o bem-viver, o direito à cidade, direitos humanos, comunicação, cultura, comunidades tradicionais e povos indígenas, reforma das polícias, nova política de drogas, políticas alternativas ao encarceramento, combate à homofobia, descriminalização do aborto;
- - Formação de uma Frente de Esquerda por Mais Democracia e Direitos com partidos, movimentos e novos coletivos e uma nova política de alianças;
- - E, sobretudo, um processo constituinte do PT, para que o petismo retome o partido. Os "estados gerais" do petismo. Novo manifesto, novo método de eleições, novas formas de organização, novas formas de financiamento. Um partido de esquerda só faz sentido se promover uma participação permanente dos filiados e simpatizantes. Devemos criar, assim, uma plataforma para viabilizar a participação "real" e "virtual". Um partido das bases, que volte a atrair as belas lutas cotidianas nas periferias, dos povos indígenas, dos garis, nas grandes obras. Que o partido encarne as mudanças que queremos para o Brasil, aproximando meios e fins, forma e conteúdo.
Acreditamos que dessa forma o PT poderá reencontrar sua vitalidade. Abrir-se ao petismo e às novas formas radicais de fazer política e distribuí-la. Única forma de ajudar o governo a sair das suas encruzilhadas e corrigir seus erros, preparar um programa municipalista transformador para 2016, articular as lutas, barrar os retrocessos conservadores e ampliar os direitos. O V Congresso pode ser a última oportunidade para isso.
Alana Moraes, Jean Tible e Josué Medeiros são militantes do petismo. Assinam também esse artigo: Caio Valiengo, Jordana Dias Pereira, Rafael Costa e William Nozaki.
Créditos da foto: Iriny Lopes / Flickr
Créditos da foto: Iriny Lopes / Flickr
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