Paulo Nogueira / http://www.diariodocentrodomundo.com.br/
Originalmente publicado em março. Republicado agora por
motivos óbvios.
Um jornalista americano escreveu uma coisa que me marcou
profundamente.
Ele disse que num certo momento da carreira ele era
convidado para programas de tevê, recebia convites seguidos para dar palestras
e estava sempre no foco dos holofotes.
Num certo momento ele se deu conta de que tudo isso ocorria
porque ele jamais escrevera algo que afrontasse os interesses dos realmente
poderosos.
Foi quando ele acordou. Entendeu, por exemplo, as reflexões
de Chomsky sobre as grandes empresas jornalísticas.
Para encurtar a história, ele decidiu então fazer jornalismo
de verdade. Acabou assassinado.
Assange, Snowden, Falciani: não é fácil a vida de quem
enfrenta o poder.
Tudo isso me ocorreu a propósito de José Dirceu. Tivesse ele
defendido, ao longo da vida a plutocracia, ninguém o incomodaria.
Mas ele escolheu o outro lado.
E por isso é alvo de uma perseguição selvagem. É como se o
poder estivesse dizendo para todo mundo: “Olhem o que acontece com quem ousa
nos desafiar.”
É à luz de tudo isso que aparece uma nova rodada de
agressões a Dirceu, partida – sempre ela – da Veja.
Quis entender.
Os dados expostos mostram, essencialmente, uma coisa: Dirceu
não pode trabalhar. Não pode fazer nada.
O que é praxe em altos funcionários de uma administração
fazerem ao deixá-la?
Virar consultor.
Não é só nos governos. Nas empresas também. Fabio Barbosa
fatalmente virará consultor depois de ser demitido, dias atrás, da Abril.
Foi o que fez, também, David Zylbersztajn, o genro que FHC
colocou na Agência Nacional do Petróleo. (Não, naturalmente, por nepotismo, mas
por mérito, ainda que o mérito, e com ele o emprego, pareça ter acabado junto
com o casamento com a filha de FHC.)
Zylbersztajn é, hoje, consultor na área de petróleo. Seus
clientes são, essencialmente, empresas estrangeiras interessadas em fazer
negócios no Brasil no campo da energia.
Algum problema? Não.
Quer dizer: não para Zylbersztajn. Mas para Dirceu a mesma
posição de consultor é tratada como escândalo.
Zylbersztajn ajuda empresas estrangeiras a virem para o
Brasil. Dirceu ajuda empresas brasileiras a fazerem negócios fora do Brasil,
com as relações construídas em sua longa jornada.
O delator que o citou diz que Dirceu é muito bom para “abrir
portas”. É o que se espera mesmo de um consultor como Dirceu.
Zylbersztajn, caso seja competente, saberá também “abrir
portas”.
Vamos supor que a Globo, algum dia, queira entrar na China.
Ela terá que contratar alguém que “abra portas”.
Abrir portas significa, simplesmente, colocar você em
contato com pessoas que decidem. Conseguir fechar negócios com ela é problema
seu, e não de quem abriu as portas.
Na manchete do site da Veja, está dito que o “mensaleiro” –
a revista não economiza uma oportunidade de ser canalha – faturou 29 milhões
entre 2006 e 2013.
São oito anos. Isso significa menos de 4 milhões por ano. Do
jeito que a coisa é apresentada, parece que Dirceu meteu a mão em 29 milhões.
Líquidos.
Não.
Sua empresa faturou isso. Não é pouco, mas está longe de ser
muito num universo de grandes empresas interessadas em ganhar o mundo.
Quanto terá faturado a consultoria de Zylbersztajn entre
2006 e 2013? Seria uma boa comparação.
No meio das acusações, aparece, incriminadora, a palavra
“lobby”. É um estratagema para explorar a boa fé do leitor ingênuo e louco por
razões para detestar Dirceu.
Poucas coisas são mais banais, no mundo dos negócios, que o
lobby.
Peguemos a Abril, por exemplo, que edita a Veja. Uma
entidade chamada ANER faz lobby para a Abril e outras editoras de revistas. A
ANER da Globo se chama ABERT.
Você pode ter uma ideia de quanto as empresas de jornalismo
são competentes no lobby pelo fato de que ainda hoje elas gozam de reserva de
mercado – uma mamata que desapareceu virtualmente de todos os outros setores da
economia brasileira.
E assim, manobrando e manipulando informações, a mídia mais
uma vez agride Dirceu.
As alegações sempre variam, mas o real motivo é que ele
decidiu, desde jovem, não lamber as botas da plutocracia.
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