
(Jornal do Brasil) - O Senado Federal aprovou, esta semana, a
constituição do Novo Banco de Desenvolvimento, o chamado Banco dos BRICS,
formado pelos governos do Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul, com
capital final previsto de 100 bilhões de dólares. A Câmara dos Deputados já
havia dado sua autorização para a participação do Brasil no projeto, além da
constituição de um fundo de reservas para empréstimos multilaterais de
emergência também no valor de 100 bilhões de dólares.
Fazer parte do Banco dos BRICS, e do próprio grupo BRICS, de
forma cada vez mais ativa, é uma questão essencial para o Brasil, e para a sua
inserção, com alguma possibilidade de autonomia e sucesso, no novo mundo que se
desenha no Século XXI.
Neste novo mundo, a aliança anglo-norte-americana, e entre os
Estados Unidos e a Europa, que já por si não é monolítica, cujas contradições
se evidenciaram por sucessivas crises capitalistas nestes primeiros anos do
século, está sendo substituída, paulatinamente, pelo deslocamento do poder
mundial para uma nova Eurásia emergente - que não inclui a União Europeia - e,
principalmente, para a China, prestes a ultrapassar, em poucos anos, os EUA como
a maior economia do mundo.
Pequim já é, desde 2009, o maior sócio comercial do Brasil, e
também o maior parceiro econômico de muitos dos países latino-americanos.
A China já é, também, a maior plataforma de produção
industrial do mundo.
Foi-se o tempo em que suas fábricas produziam artigos de
duvidosa qualidade, e, hoje, suas centenas de milhares de engenheiros e
cientistas – mesmo nas universidades ocidentais é difícil que se faça uma
descoberta científica de importância sem a presença ou a liderança de um chinês
na equipe – produzem tecnologia de ponta que, muitas vezes, não está disponível
nem mesmo nos mais avançados países ocidentais.
Nesse novo mundo, a China e a Rússia, rivais durante certos
períodos do século XX, estão se preparando para ocupar e desenvolver,
efetivamente, as vastas estepes e cadeias de montanhas que as separam e os
países que nelas se situam, construindo,nessa imensa fronteira, hoje ainda
pouco ocupada, dezenas de cidades, estradas, ferrovias e hidrovias.
A peça central desse gigantesco projeto de infraestrutura é o
Gasoduto Siberiano.
Também chamado de Gasoduto da Eurásia, ele foi lançado em
setembro do ano passado em Yakutsk, na Rússia, e irrigará a economia chinesa
com 38 bilhões de metros cúbicos de gás natural por ano, para o atendimento ao
maior contrato da história, no valor de 400 bilhões de dólares, que foi assinado
entre os dois países.
Nesse novo mundo, a Índia, cuja população era massacrada,
ainda há poucas décadas, pela cavalaria inglesa, possui mísseis com ogivas
atômicas, é dona da Jaguar e da Land Rover, do maior grupo de aço do planeta, é
o segundo maior exportador de software do mundo, e manda, com meios próprios,
sondas espaciais para a órbita de Marte.
E o Brasil, que até pouco tempo, devia 40 bilhões de dólares
para o FMI, é credor do Fundo Monetário Internacional, e o terceiro maior credor
externo dos Estados Unidos.
Manipulada por uma matriz informativa e de entretenimento
produzida ou reproduzida a partir dos EUA, disseminada por redes e
distribuidoras locais e pelos mesmos canais de TV a cabo norte-americanos que
podem ser vistos em muitos outros países, a maioria da população brasileira
ignora, infelizmente, a existência desse novo mundo, e a emersão dessa nova
realidade que irá influenciar, independentemente de sua vontade, sua própria
vida e a vida da humanidade nos próximos anos.
Mais grave ainda. Parte da nossa opinião pública, justamente
a que se considera, irônica e teoricamente, a mais bem informada, se empenha em
combater a ferro e fogo esse novo mundo, baseada em um anticomunismo tão
inconsistente quanto ultrapassado, que ressurge como o exalar podre de uma
múmia, ressuscitando, como nos filmes pós-apocalípticos, milhares de ridículos
zumbis ideológicos.
Os mesmos hitlernautas que alertam para os perigos do
comunismo chinês em seus comentários na
internet e acham um absurdo que Pequim, do alto de 4 trilhões de dólares em
reservas internacionais, empreste dinheiro à Petrobras, ou para infraestrutura,
ao governo brasileiro, usam tablets, celulares, computadores, televisores de
tela plana, automóveis, produzidos por marcas chinesas, ou que possuem peças
“Made in China”, fabricadas por empresas estatais chinesas ou com capital
público chinês do Industrial &Commercial Bank of China, ICBC, o maior banco
do mundo.
Filhos de fazendeiros que produzem soja, frango, carne de
boi, de porco, destilam ódio contra a política externa brasileira, assim como
funcionários de grandes empresas de mineração, quando não teriam para onde
vender seus produtos, se não fosse a demanda russa e, em muitos casos, a
chinesa.
Nossas empresas com negócios no exterior são atacadas e
ridicularizadas, como se só empresas estrangeiras tivessem o direito de se
instalar e de fazer negócios em outros países, inclusive o nosso, para enviar
divisas e criar empregos, com a venda de serviços e equipamentos, em seus
países de origem.
É preciso entender que ao formar uma aliança estratégica com
a Rússia, a China, a Índia e a África do Sul, o Brasil não precisa, nem deve,
necessariamente, congelar suas relações com os Estados Unidos ou a União Europeia.
Mas poderá, com eles, negociar em uma condição mais altiva e
mais digna do que jamais o fez no passado.
É nesse sentido que se insere a aprovação do Banco dos BRICS
pelo Congresso.
Apesar de termos escalado, desde 2002, sete posições entre as
maiores economias do mundo, a Europa e os EUA se negam, há anos, a reformular o
sistema de quotas para dar maior poder ao Brasil, e a outros países dos BRICS,
no FMI e no Banco Mundial.
Se não quiserem que não o façam. Como mostra o Banco dos
BRICS, podemos criar as nossas próprias instituições financeiras multilaterais.
Os BRICS, têm, hoje, como grupo, não apenas o maior
território e população do mundo, mas também mais que o dobro das reservas
monetárias dos EUA, Japão, Alemanha, Inglaterra, Canadá, França e Itália,
somados.
O que incomoda os Estados Unidos e a Europa, e os seus
prepostos, no Brasil, não é o suposto comunismo ou “bolivarianismo” do atual
governo, mas o nacionalismo possível, até certo ponto tímido, politicamente
contido, e sempre combatido, dos últimos anos.
Existe uma premeditada, permanente, hipócrita, subalterna,
entreguista, pressão, que não se afrouxa, voltada para que se abandone uma
política externa minimamente independente e soberana, que possa situar o
Brasil, geopoliticamente, frente aos desafios e às oportunidades do mundo cada
vez mais complexo e competitivo do século XXI.
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