quinta-feira, 31 de março de 2016

1964 – Parte 2. O PMDB, Moro e porque a classe média quer derrubar Dilma. Por Augusto Bisson

POR FERNANDO BRITO // http://www.tijolaco.com.br/

A primeira consequência do desembarque do PMDB do Governo Dilma Rousseff – e a previsível aceleração do processo de impeachment da presidente na Câmara dos Deputados – é o progressivo arquivamento do atual herói de grande parte da classe média brasileira, o juiz espiritualmente tucano Sergio Moro. Quanto mais se aproximar a data da possível queda de Dilma, mais os holofotes da mídia, que promoveram ad nauseum a ele e à sua Operação Lava Jato, vão se apagar definitivamente para ambos.
Cumprido seu papel circunstancialmente histórico de dar legitimidade jurídica à desmoralização do atual governo (ainda que este também tenha contribuído para seu descrédito…mais sobre isso adiante), Moro será devolvido à sua insignificância paranaense. Com o tempo, vai se tornar, na condição de juiz de Primeira Instância, uma figura tão esquecida pela população quanto é hoje seu conterrâneo que, durante o congelamento de preços promovido pelo Plano Cruzado (1986), “fechou um supermercado em nome do povo brasileiro”. Moro até pediu desculpas ao STF por violar a Lei 9296/96 ao divulgar as conversas privadas de Lula. Escutas telefônicas só podem ser utilizadas dentro da investigação e do processo penal. O fato notável é que, além da desrespeitar a legislação, jamais um juiz pediu desculpas ao STF em situações que envolvessem suas decisões, sobretudo publicamente.

O clichê diz que revoluções devoram os seus filhos. E involuções, que é o que estamos assistindo no Brasil, também. A estrela de Moro caminha para a extinção. Não é possível a continuidade de uma operação como a Lava-Jato – se esta se aprofundasse, realmente, e não visasse somente o PT – sem destruir o sistema político brasileiro, particularmente a parte podre de seu maior partido, o PMDB.

E isto não vai acontecer, sob o silêncio obsequioso, inclusive, do STF. Gente como Eduardo Cunha, Renan Calheiros e Aécio Neves (PSDB) permanecerá intocada, garantida pelos acordos que vão envolver a formação do Governo Temer. O tempo o mostrará . Pois, como escreveu o Hegel citado erroneamente por aqueles promotores atrapalhados de São Paulo, “a coruja de Minerva só alça ao voo ao anoitecer”.

Fala-se bastante nas redes sociais em golpe e repetição de 1964.

Bem, o pouco citado cenário econômico, particularmente, é essencial, como sempre, para o entendimento dos acontecimentos. O que começou a partir de 2012 no Governo Dilma é bastante semelhante ao que ocorreu em 1963. Um fim de festa, digamos assim. No período 1957-1962, o Brasil cresceu a uma taxa média anual de 8%. Em 1963, porém,o desempenho da economia atingiu pífios 0,6%, a inflação chegou a 74% e a indústria decresceu 0,1%. Sentindo o freio de suas pretensões de consumo aguçadas nos anos de prosperidade – e assustada com Cuba e com o crescente avanço da esquerda nas ruas – a classe média deu o sinal verde para intervenção militar (1964). Hoje, pode-se dizer que o ela quer, sem se dar conta disso, é a volta dos tempos de Lula….Crescimento de 7% ao ano, crédito a perder de vista para a compra de bens de consumo duráveis, dólar baixo etc.

Não é de se duvidar, inclusive, que aquelas panelas batidas nos bairros de classe média alta durante os pronunciamentos de Dilma na TV tenham sido compradas em lojas nível C de Miami e Nova Iorque…Pode parecer inacreditável diante das dificuldades financeiras do Estado brasileiro, mas é provável que Dilma não se veria diante de tantos protestos, se, irresponsavelmente, baixasse a gasolina para dois reais o litro, e a conta de luz de 200 para 80 reais. A indignação moral da classe média se dá contra o PT porque, em tempos de recessão econômica, ela acredita que este partido está tomando o dinheiro que deveria estar nos bolsos dela.

Sendo assim, a maior parte das pessoas não está interessada nos crimes de Eduardo Cunha, Aécio e quejandos. Eles querem só “pegar” o PT. Como resultado dessa posição estreita, teremos Temer e o PMDB. Voltamos ao de sempre. Infelizmente, o país parece não ter jeito, pelo menos em nosso tempo de vida.

Entretanto, essas coisas não acontecem apenas por um conspiração “midiático-jurídica” – embora a grande imprensa combata inescrupulosamente e sem tréguas Lula e Dilma, mentindo, omitindo e distorcendo os fatos. É preciso reconhecer, também, os equívocos da esquerda. Ela se desmoralizou eticamente ao fazer o jogo de um sistema político que condenava quando estava na oposição. Isto também revolta a classe média, que se sente, com razão, nest6e caso, lograda em suas expectativas de um novo Brasil, devidamente “moralizado” a partir do PT.

Muito se fala em reforma política, já que, efetivamente, nosso sistema está apodrecido. Quero lembrar, entretanto, que ele, sistema, já estava nessa condição quando Lula assumiu a Presidência. E, até essa época, nunca, ou raramente, se viu a esquerda propor reformas concretas no nosso arcabouço político-eleitoral.

Pode-se dizer, também, que Dilma não agiu politicamente a tempo de conter seus opositores. Tampouco se pode dizer que tenha a retórica, malícia e desenvoltura essenciais para exercer o papel de liderança num tempo de crises e conflitos, sejam estes criados pela mídia ou efetivamente reais.

E, além disso, as denúncias de corrupção e negociatas devastaram os melhores quadros do PT, o que faz com que a equipe de governo não tenha atuação política firme nem para se defender.

Por fim, Dilma conseguiu colocar toda a elite financeira, comercial e industrial contra ela em função, dizem eles, de suas constantes intervenções na economia.Fala-se que o PT se afastou de suas bases populares, mas é preciso lembrar que os empregos destas dependem dos investimentos feitos pelos detentores do capital. Aliás, a extraordinária popularidade de Lula residiu no fato de seu governo ter contentado amplamente a base e o topo da pirâmide.

Hoje, o país está paralisado por absoluta descrença, justa ou injusta, na Presidente Dilma. Não há como qualquer plano de recuperação econômica funcionar sob esta condição.

Enfim, Dilma, que é 100% honesta até prova em contrário, não vai e não deve mesmo renunciar. Os que a apoiam é que devem, mais do que tudo, resistir e denunciar o “golpe branco” que está acontecendo no Brasil – onde a política se judicializou e o Judiciário se politizou ao extremo, nas palavras do sociólogo Boaventura Santos.

Mesmo a imprensa internacional que se mostra crítica em relação à capacidade da presidente, já se encarregou de mostrar a situação surreal que estamos vivendo por aqui. Quem está julgando Dilma no Parlamento é mais “culpado do que ela”, diz o Los Angeles Times. A rede Al-Jazzeera também repisou este tema.

Ainda que Cunha e Renan fossem modelos de honestidade, um terço do Congresso está envolvido em falcatruas, assim como igual número dos deputados que compõem a Comissão do Impeachment. Como disse um jornalista no Facebook, este Congresso não tem moral nem para julgar Fernandinho Beira-Mar.

Uma verdadeira epígrafe de nossos tempos sombrios.
Carlos Augusto Bisson, jornalista gaúcho, cedeu gentilmente este texto para o Tijolaço.

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