Pesquisa do instituto público de estatísticas da Argentina mostra que as medidas econômicas do governo de Macri agravaram a situação socioeconômica.
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Nesta semana, o Indec (Instituto Nacional de Estatísticas e Censos da Argentina) entregou uma nova medição sobre a realidade socioeconômica do país, e informou que, no segundo trimestre, 32,2% das pessoas se encontravam em nível de pobreza, o que também significa 23,1% dos lares argentinos. Os números também apontam que 6,3% das pessoas (ou 4,8% dos lares) são indigentes. O último cálculo oficial de pobreza e indigência havia sido publicado no primeiro semestre de 2013, e a partir dali houve uma interrupção.
O organismo – que agora é administrado pelo economista Jorge Todesca – não fez um estudo mais aprofundado, com números que apontassem como se deu a evolução dessas condições socioeconômicas desde aquele então até o momento atual. Os números apresentados esta semana são uma fotografia do ocorrido entre os meses de abril e junho deste ano, com uma mudança metodológica substancial em comparação com as medições anteriores, o que torna ainda mais complicado fazer qualquer comparação.
O presidente Mauricio Macri aproveitou essa situação para pedir que seu desempenho em termos de combate à pobreza seja julgado a partir das próximas medições, quando pretende exibir cifras melhores – um dos principais slogans de sua campanha foi o “pobreza zero”, repetido na semana passada, em sua viagem às Nações Unidas. Assim, o mandatário tentou evadir a responsabilidade de seu governo pela crise econômica e social, provocada principalmente pelas medidas econômicas adotadas por ele, como a desvalorização do peso, diminuição dos impostos aos grandes empresários, o aumento das tarifas de serviços públicos básicos (como gás e energia elétrica), as demissões em massa no setor público e a política de abertura às importações. A disparada da inflação levou o índice de preços dos 23,8% de outubro do ano passado – antes do ministro da Economia, Alfonso Prat Gay, antecipar a nova política de sangria cambiária – a 47,1% em junho deste ano, e é um dos fatores responsáveis pelo abrupto salto quantitativo da pobreza, algo que o Indec não refletiu em seu informe – já que carece de uma comparação com os níveis de pobreza em outubro –, mas que a Universidade Católica Argentina calculou, em estudo onde afirmou que 1,4 milhão de pessoas ingressaram no nível de pobreza somente no primeiro trimestre de 2016. Também é importante destacar o índice de desemprego apresentado pelo Indec, que mostra um salto de 5,9% para 9,3% entre o primeiro e o segundo trimestres deste ano.
A nova metodologia para calcular a pobreza é mais exigente para definir o mínimo a partir do qual uma pessoa é considerada pobre ou indigente, o que significa um aumento da porcentagem de pessoas nessa condição. Segundo o especialista Diego Born, a cesta básica total define a linha da pobreza a partir de uma renda entre 20 e 30% maior que a utilizada até 2013. “Se o estudo atual tivesse seguido a metodologia anterior, em vez de 32,2% de pobreza, o resultado teria rondado os 23%”, analisa Born. “O kirchnerismo recebeu o país com uma taxa de 50% de pobreza e a reduziu a cerca de 20 pontos, segundo a cesta básica usada como parâmetro naquele então. O macrismo, com aquele mesmo parâmetro, teria mostrado uma cifra próxima aos 23% neste segundo trimestre, mas como o Indec modificou a metodologia, e não fez nenhum ajuste estatístico, o caminho ficou livre para que Macri tome como ponto de partida da sua gestão estes 32,2% de agora”.
Apesar da falta de claridade com respeito às estadística sobre a pobreza a Argentina nos últimos anos, distintas estimações de economistas, de esquerda e de direita, concordam que a porcentagem de pessoas pobres e indigentes se manteve relativamente estável entre 2011 e 2013, cresceu em 2014 e diminuiu em 2015. Assim, seria possível afirmar que, no segundo trimestre deste ano a pobreza cresceu ao menos 3 pontos percentuais em comparação ao mesmo período de 2015.
Os novos dados oficiais registram que há 8,77 milhões pessoas vivendo abaixo da linha da pobreza na Argentina (32,2% da população). Dentro desse universo estão 1,71 milhão de pessoas indigentes (6,3%). Olhando desde outra perspectiva, são 2,02 milhões de lares pobres, dos quais 425 mil estão por baixo do mínimo de consumo de alimentos que permite evitar a indigência. A medição se realizou em 31 aglomerados urbanos, que representam mais de 27 milhões de pessoas e 8,7 milhões de lares argentinos.
Com o benefício de ter reativado a série estatística, o presidente Macri ofereceu uma conferência de imprensa na qual buscou instalar a ideia de que o governo assume como herança os 32,2%, sem considerar os quase dez meses de sua gestão e os efeitos produzidos por suas primeiras medidas, que levaram a um aumento da pobreza e da indigência. Além disso, o mandatário se referiu ao slogan da campanha, e admitiu que “é óbvio que a pobreza zero é algo que não se pode alcançar em quatro anos, mas é algo que adotamos como um caminho a seguir”.
A região com maior porcentagem de pobreza na Argentina é a do Nordeste do país, com 40,1%, seguido pelo Noroeste (35,8%), Centro-Oeste (35,6%), o Centro-Leste ou Região Pampeana (32,6%), a Grande Buenos Aires (30,9%) e a Patagônia (24,7%). Nas províncias com mais de 500 mil habitantes, a pobreza ficou em 31,8%, enquanto as de menor população ficaram em 34,2%. No caso da indigência, essa relação se inverte: 6,6% nas grandes cidades e 5% nas pequenas. A região Nordeste da Argentina é a que apresenta os piores indicadores em todos os quesitos da pesquisa, enquanto a Patagônia é a que tem os melhores números.
A Grande Buenos Aires é a região de maior relevância para explicar a quantidade de pobres e indigentes. O Indec registrou 4,54 milhões de pobres nesta zona metropolitana, além de 917 mil indigentes. Em segundo lugar, ficou a chamada Região Pampeana (equivalente ao centro-leste do país, inclui as províncias de Córdoba, Santa Fé, La Pampa e o interior da Província de Buenos Aires, sem contar a região metropolitana da capital argentina), onde há 1,93 milhão de pessoas pobres e 453 mil indigentes.
Com respeito à idade, o grupo mais afetado pela pobreza é o de adultos entre 30 e 64 anos, que representa 40,3% da população do país, e equivale a 34,9% da pobreza e 32,1% da indigência. Depois, aparecem as crianças e adolescentes de 0 a 14 anos, com 32,3% e 33,1%, respectivamente. Adultos jovens entre 15 e 29 anos são o terceiro grupo, com 29,5% em nível de pobreza e 32,2% no de indigência. Finalmente, entre maiores de 65 anos, há 3,3% de pobres e 2,6% de indigentes.
Tradução: Victor Farinelli
Créditos da foto: reprodução
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