sábado, 29 de outubro de 2016

Bloqueio dos EUA causou prejuízo bilionário a Cuba mas não atingiu objetivo principal

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Em março de 2016, durante sua visita a Cuba, Obama classificou a política de bloqueio como “obsoleta” e voltou a defender o seu término. (Foto: Ismael Francisco/Cubadebate)

Marco Weissheimer

No dia 26 de outubro, a Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU) votou, pela 25ª vez, a resolução pedindo o fim do bloqueio econômico, comercial e financeiro imposto pelos Estados Unidos contra Cuba há mais de 50 anos. Como ocorreu em anos anteriores, a resolução foi aprovada quase por unanimidade: 191 votos a favor e duas abstenções: Estados Unidos e Israel. Essas abstenções foram uma novidade. Foi a primeira vez que os EUA e seu mais fiel aliado deixaram de votar favoravelmente à manutenção do bloqueio, decisão que representou mais um passo na direção da normalização das relações entre Washington e Havana. Em dezembro de 2014, o presidente Barack Obama defendeu o fim do bloqueio contra Cuba, mas essa decisão precisa ser aprovada pelo Congresso norte-americano, onde a maioria republicana segue rejeitando essa medida.

Em março de 2016, durante sua visita a Cuba, Obama classificou a política de bloqueio como “obsoleta” e voltou a defender o seu término. Em discurso feito no Grande Teatro de Havana, o presidente dos EUA renovou o pedido ao Congresso de seu país para que colocasse um fim a essa política. Apesar deste novo cenário, em setembro de 2015, Obama voltou a renovar as sanções contra Cuba abrigadas sob a Lei de Comércio com o Inimigo, de 1917, que constitui a peça básica sobre a qual repousam as leis e regulações que compõem a política de bloqueio. Essas normas, entre outras coisas, impõem multas milionárias a bancos e instituições financeiras que mantenham relações com Cuba. Ainda não se concretizou a anunciada autorização do uso do dólar nas transações internacionais de Cuba, nem a possibilidade de que os bancos dos EUA disponibilizem linhas de crédito a importadores cubanos de produtos estadunidenses autorizados.

A origem do bloqueio

O bloqueio total do comércio com Cuba foi decretado formalmente mediante uma ordem executiva do então presidente John F. Kennedy, no dia 3 de fevereiro de 1962. No entanto, as medidas punitivas contra a ilha começaram poucas semanas depois do triunfo da Revolução Cubana, em 1959. No dia 12 de fevereiro daquele ano, o governo dos EUA negou a concessão de um pequeno crédito solicitado por Cuba para manter a estabilidade da moeda nacional. Posteriormente, foram sendo aplicadas outras medidas como a restrição do fornecimento de combustível pelas empresas estadunidenses, a paralisação de plantas industriais, a proibição de exportações a Cuba e a supressão parcial, e depois total, da quota de açúcar. Todas essas medidas tinham como objetivo central asfixiar economicamente a recém nascida revolução cubana. Em 1996, a Lei Helms-Burton aumentou os efeitos do bloqueio, estabelecendo sanções para quem decidisse investir em Cuba e autorizando o financiamento de ações hostis contra a ilha.

Segundo estimativas do governo cubano, a política do bloqueio, que vem sendo aplicada há mais de 50 anos, já causou prejuízos superiores a 125 bilhões de dólares, bloqueando o desenvolvimento da ilha e trazendo prejuízos inestimáveis à qualidade de vida da população. A partir de 2015, os departamentos do Tesouro e do Comércio dos Estados Unidos realizaram várias emendas às regulações que pesam sobre Cuba. O governo cubano considerou tais emendas passos positivos, mas ainda insuficientes. Passaram a ser autorizadas visitas de estadunidenses a Cuba mediante licença especial nas 12 categorias permitidas pela lei. Além disso, foram restabelecidos os vôos regulares entre os dois países, assim como o transporte marítimo de passageiros, segundo 12 categorias especiais, e viagens educacionais a titulo individual.
As medidas punitivas contra a ilha começaram poucas semanas depois do triunfo da Revolução Cubana, em 1959. Objetivo principal era derrotar o processo liderado por Fidel Castro. Bloqueio viu a aposentadoria de Fidel, mas não sua derrubada. (Foto: CubaDebate)

Uma longa lista de proibições

No setor das telecomunicações, foram autorizadas as exportações de produtos e serviços para Cuba, o financiamento para a criação de infraestrutura e a possibilidade de estabelecer empresas mistas com entidades cubanas. Essas medidas ainda não foram estendidas a outros setores da economia cubana que seguem sofrendo as restrições impostas pelo bloqueio. A lista de produtos estadunidenses que, a partir das novas medidas, podem ser exportados para Cuba se limita a produtos e serviços de telecomunicações, materiais de construção e ferramentas para o uso do setor estatal da economia, incluída aí a atividade agrícola. Por outro lado, a autorização para a importação, pelos Estados Unidos, de produtos e serviços cubanos exclui setores fundamentais para a economia cubana, como os do tabaco, rum, níquel, produtos biotecnológicos e serviços médicos e educacionais.

Outra importante limitação que persiste é a proibição a instituições financeiras cubanas para abrir contas em bancos dos Estados Unidos, o que impede o estabelecimento de relações bancárias diretas entre os dois países e encarece as operações comerciais de Cuba com esse país, em função da necessidade de fazer triangulações e pagar comissões a intermediários neste processo. Segundo o governo cubano, os efeitos negativos do fortalecimento das restrições que pesam sobre as transações cubanas e seu caráter extraterritorial durante os últimos sete anos, seguem manifestando-se na recusa de bancos estadunidenses e de outros países em realizar transferências relacionadas com Cuba, inclusive em outras moedas que não o dólar.

Vetos para a compra de equipamentos científicos

Mesmo possuindo indicadores reconhecidos internacionalmente, a área da saúde pública cubana também é duramente afetada pelo bloqueio. Os prejuízos se manifestam, por exemplo, na impossibilidade de adquirir, nos mercados estadunidenses, medicamentos, reagentes, peças de reposição para equipamentos de diagnóstico e tratamento, instrumental médico e outros insumos necessários para o funcionamento do setor. Na maioria dos casos, esses produtos precisam ser adquiridos em mercados geograficamente distantes, a um custo muito maior e representando também uma demora maior no tratamento dos pacientes.

Em novembro de 2015, especialistas em neurofisiologia clínica do Instituto de Neurologia e Neurocirurgia Dr. José Rafael Estrada González contataram a empresa General Electric, que comercializa equipamentos para o estudo do sistema nervoso periférico, manifestando interesse na compra de um equipamento desse tipo e no treinamento de um especialista cubano para o seu manejo. Em fevereiro de 2016, um representante da empresa respondeu que ela não estava autorizada a comercializar seus produtos com Cuba em função da política de bloqueio econômico.
Cuba conta com um dos programas de proteção social mais reconhecidos do mundo por ter, entre outras coisas, conseguido erradicar a desnutrição crônica e a desnutrição infantil. (Foto: CubaDebate)

Aumento do custo da alimentação

Cuba conta com um dos programas de proteção social mais reconhecidos do mundo por ter, entre outras coisas, conseguido erradicar a desnutrição crônica e a desnutrição infantil entre sua população. No entanto, o setor da alimentação segue sendo um dos mais afetados pela política de bloqueio. Os prejuízos se manifestam, por exemplo, no aumento do preço das sementes, dos fertilizantes, peças de reposição para máquinas agrícolas e outros insumos que precisam ser comprados em mercados geograficamente distantes. Também contribui para a elevação dos custos a necessidade de utilizar intermediários para efetuar essas compras. Esta política também provoca o aumento do tempo para armazenamento de matérias primas e insumos necessários para a produção de leite, ovos e carne, de modo a evitar um desabastecimento inesperado destes produtos. Segundo o governo cubano, se esses produtos pudessem ser adquiridos nos Estados Unidos, esse tempo de armazenamento seria de apenas 15 dias e não 90 como ocorre hoje, representando outro fator de aumento de custos.

Desde o início do governo Obama, os Estados Unidos emitiram 49 multas, num valor superior a 14 milhões de dólares, a empresas locais e estrangeiras por não obedecer o bloqueio. Desde o início da reaproximação histórica de 2014, que incluiu a reabertura de embaixadas, os EUA multaram oito empresas (cinco locais e três estrangeiras) em um valor que chegou a 3 milhões de dólares. Segundo o chanceler cubano Bruno Rodríguez, somente em 2015, o bloqueio causou um prejuízo de 4,68 bilhões a Cuba. Apesar de todo esse prejuízo, em seus mais de 50 anos de vigência, o bloqueio não atingiu seu objetivo principal que era destruir a Revolução Cubana.

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