sexta-feira, 28 de outubro de 2016

Temer 241, o estelionato eleitoral e o Brasil em coma induzido

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Por Décio Semensatto

O código penal, em seu artigo 241, estabelece como crime “Promover no registro civil a inscrição de nascimento inexistente”. Pois bem, numa analogia com o número da PEC é o que Temer e o Congresso Nacional estão promovendo: registrando na Constituição Federal o nascimento de um País que não existe. Com a PEC 241, o Brasil passará a conjugar suas realizações no futuro do pretérito. Seríamos. Faríamos. Avançaríamos.

Tenho visto pessoas que defendem o texto da PEC 241 falarem que educação e saúde serão preservados. Duvido que 1% tenha lido o texto da proposta. Em contrapartida, profissionais de várias instituições respeitadas alertam com estudos e projeções consistentes que o custo social da PEC será maior que o benefício econômico. Como alternativa, a revisão do sistema tributário, a auditoria da dívida pública, o firme combate à sonegação fiscal e à corrupção seriam medidas mais responsáveis com o futuro do País. Mas numa cultura de capitalismo selvagem associado à domesticação pelo entretenimento, falar em custo social é pedir para ser chamado de burro. Ultimamente, alguns preferem o termo “esquerdopata”, mesmo que não saibam o que isso significa.

Quem de fato busca saber a verdade além do som do “plim-plim”verá que o Projeto de Lei Orçamentária para 2017 promoverá cortes no próximo ano em setores da Educação. Como a PEC 241 prevê que para essa área o ano de 2017 será a referência para reajustes, não é difícil perceber que a situação da Educação será pior do que hoje. Como exemplo, se a PEC estivesse valendo no período entre 2005 e 2015, o Ministério da Educação teria deixado de receber R$ 244 bilhões. Já o Ministério da Saúde teria recebido R$ 92,5 bilhões a menos.

Esses montantes, aplicados no custeio e investimentos, deixariam de circular no mercado, gerar emprego e renda e teriam sido transferidos diretamente ao pagamento de juros de dívida a credores rentistas sigilosos e privilegiados, que recebem uma remuneração digna de agiotagem. Mas o maior prejuízo seria o de milhões de brasileiros sem acesso a tratamentos de saúde,das mais simples às complexas.
"Não temos nenhum motivo para acreditar em avanços na Educação e Saúde nas próximas duas décadas. Se fossem verdadeiramente prioridades para qualquer governo, ambas teriam outro nível e seus profissionais outra valorização"

Na lógica da PEC, se você ficar doente e depende do serviço público, terá que esperar outra pessoa morrer para ter o tratamento necessário. Simplesmente porque não cabe no orçamento novos doentes. Outro prejuízo virtualmente incalculável seriam outros milhões de brasileiros que não teriam chegado aos níveis escolares que alcançaram, muitos os primeiros de toda a história de sua família, mesmo com todas as precariedades que ainda enfrentamos. Não temos nenhum motivo para acreditar em avanços na Educação e Saúde nas próximas duas décadas. Se fossem verdadeiramente prioridades para qualquer governo, ambas teriam outro nível e seus profissionais outra valorização.

Agora vou usar um argumento moral de pessoas favoráveis à queda de Dilma: ela cometeu estelionato eleitoral porque fez justamente o contrário do que prometeu durante a campanha para a presidência. Uma revisitada no plano de governo proposto pela chapa Dilma/Temer mostra que o atual presidente simplesmente rasgou as propostas que o elegeram. De forma autocrática, redesenhou o caminho do País com sua ponte para sei lá onde. É fato que a chapa Dilma/Temer recebeu votos de 54 milhões de brasileiros. Já a tal da ponte,nenhum. Desta forma, Temer é o grande estelionatário eleitoral, pois foi eleito a reboque de Dilma com uma proposta de governo que jogou na lata do lixo assim que foi elevadoao posto máximo.

Outros países que enfrentaram crises de ajuste fiscal também limitaram seus gastos, mas, diferentemente do Brasil, tomaram o cuidado de não fixá-lo na constituição e nem de delongá-lo por tanto tempo. O que estamos assistindo hoje é o Brasil entrando em coma. Induzido, diga-se de passagem.

É claro que sou favorável a não gastar mais do que é arrecadado. Mas para quem defende a PEC, seria interessante ver onde estão os freios do gasto: apenas para os serviços que o País deve oferecer para seu povo, previstos na Constituição Federal. O pagamento de juros da dívida não estão atrelados ao teto, sendo que hoje consomem 45% de toda a riqueza que produzimos. Todos os dias você trabalha metade de sua jornada para produzir um montante de recursos que vai para privilegiados agiotas internacionais. Mas parece que a maioria não se importa com isso. Ou simplesmente ignora quem é seu verdadeiro senhor. E que siga o cortejo de panelas silenciosas acompanhadas do Pato de Troia. 

 Décio Luis Semensatto Junior é ecólogo e professor de Ciências Ambientais na Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).


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