Por Gilberto Felisberto Vasconcellos
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Carlos Marx não estava pensando em Michel Temer quando escreveu que não havia nada mais depressivo do que ser governado por um idiota. A ideia errônea que se tem é que alcançar o poder requer inteligência e entendimento sobre o que é a realidade. Disso, o exemplo eloquente é o tosco Stalin que derrotou o intelectual Trotsky depois da morte de Lênin em 1924. O último livro escrito por Trotsky, no exato momento em que levou uma picaretada na cabeça em 1940, não era senão a biografia de Stalin. A interpretação liberal burguesa insiste na escarnecida rivalidade “pessoal” entre ambos, fundada em motivos psicológicos. O próprio Trotsky advertiu que a abordagem sobre Stalin deveria repudiar a stalinfobia e analisar esse sinistro personagem como produto de relações sociais e históricas, sobretudo levando em consideração o atraso russo e a burocracia dos funcionários. O socialismo enclausurou-se em um só país e compactuou com o imperialismo capitalista de Franco/Hitler/Roosevelt. Trotsky pensou durante quase vinte anos, em dezenas de livros e centenas de artigos, como foi possível surgir da primeira revolução proletária na história o stalinismo, que é (junto com o nazismo) um dos fenômenos mais sinistros do século 20.
A interpretação totalizante inclui o papel do indivíduo na história trazendo à tona os pormenores, o baixinho, o rosto bexiguento, o filho de sapateiro, o porquinho sem água no corpo, a roupa encardida, a cabeça teológica e policial. Coincidência que a mãe de Hitler também o queria pastor de igreja, dotado mais de vontade que de intelecto, prudente, calculista, dissimulado, plebeu, provinciano, vingativo, astucioso, intriguento e ambicioso. Georgiano, Stalin não sabia falar russo direito; intelectualmente fraco, gostava mais do aparelho que da ideia, não tinha o menor interesse em resolver o problema do oprimido e sim triunfar na máquina burocrática, o que passou a ser entendido como “fazer política” em reuniões, estatutos, regimentos e protocolos.
Nas ciências sociais o nome de Max Weber é associado à interpretação da burocracia, mas a análise desse fenômeno feita por Leon Trotsky é mais rigorosa, arguta e concretamente vivenciada; afinal, foi compelido a conhecer as entranhas do despotismo burocrático que o perseguiu e o assassinou. Nos
so tempo é visceralmente anti-Trotsky. Estão dadas e maduras as condições objetivas para a superação do capitalismo, todavia os partidos da classe operária padecem de espírito burocrático, cujas origens históricas remetem a Stalin. É por isso que a inassimilação das ideias de Trotsky compromete o socialismo em escala mundial. Suas ideias são equivocadamente tidas como exemplário de voluntarismo subjetivista (tudo se resumiria à direção do partido). Samir Amin pisou na bola quando supôs numa especulação bizantina, do ponto de vista histórico, que se fosse Trotsky o vencedor, mesmo assim haveria a restauração capitalista na URSS com Iéltsin, Gorbachev e Putin.
Para o sociólogo egípcio, a Quarta Internacional não foi senão a cópia da Terceira Internacional, embora seja deixada de lado a explicação de Trotsky sobre a gestação do stalinismo. Acusar Trotsky de ter sido delirante revolucionário subjetivista não é diferente do otimismo ingênuo atribuído a Lênin, ou senão a síndrome de precipitação de Marx e Engels acerca da iminente revolução proletária. A ofensiva liberal burguesa realça o anacronismo de partido político. A esquerda daltônica acredita que ainda não chegou social e economicamente a hora do socialismo. Segundo o cinismo pequeno-burguês, ainda que tivesse chegado a hora, não era para o socialismo dar certo, o que é uma maneira safada de identificar marxismo com stalinismo, a cuja diferença se incumbiu Trotsky de mostrar na teoria e na prática.
"O Brasil está viciado na trapaça eleitoral entre esquerda/direita. Democracia plutocrática. Fetichismo estatístico de resultado. A verdade política se expressa na quantidade de votos e ponto final. É o critério da vontade geral, abstraída a dominação de classe social (o dinheiro faz o homem), com miséria, obscurantismo e manipulação" |
O Brasil está viciado na trapaça eleitoral entre esquerda/direita. Democracia plutocrática. Fetichismo estatístico de resultado. A verdade política se expressa na quantidade de votos e ponto final. É o critério da vontade geral, abstraída a dominação de classe social (o dinheiro faz o homem), com miséria, obscurantismo e manipulação. A mal chamada ciência política resume-se a mensurar votos, segundo a lógica empiricista da pesquisa sobre a intenção de cada um votar assim ou assado.
O irracionalismo pragmático e positivista tomou conta inteiramente da cultura universitária vozeira da indústria cultural fascista. Disso, o resultado político para o povo é um desastre. Quanto ao balanço nas últimas décadas dos derrotados e vitoriosos do ponto de vista eleitoral, haveremos de convir que Leonel Brizola não foi vencedor, os que venceram foram Fernando Collor, Fernando Henrique, Luiz Inácio Lula, Dilma, Temer, situados em partidos políticos diferentes e não com a mesma origem de classe. Então, em cotejo ao que aconteceu com Trotsky e Stalin, é um disparate afirmar que Lula fosse mais inteligente do que Leonel Brizola. O mesmo seja dito de FHC, professor universitário, pacato funcionário público, alçado de repente a ministro por Itamar Franco, sabe-se lá por meio de qual telefonema internacional.
Os vencedores são vassalos oligárquicos dos lucros multinacionais. Estes é que venceram e querem nos convencer de que vencerão sempre. Michel Temer representa a depressiva dissociação entre o poder e a nacionalidade histórica. Será tão lembrado pelos pósteros como o medíocre e apagado Gaspar Dutra. Tendo por aliados o que há de mais putrefato no culturalismo parlamentar brasileiro. E quanto mais nos deprimimos psicologicamente, mais aumenta a cobiça Trump-imperialista dos recursos energéticos dos trópicos: o sol do novo mundo e a água doce.
♦ Gilberto Felisberto Vasconcellos é jornalista, sociólogo, escritor e colunista de Caros Amigos.
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