
Coletiva de Imprensa da 56ª Assembleia Geral da CNBB, em 19 de abril Foto: CNBB
A omissão da CNBB diante do arbítrio
A 56ª Assembléia Geral da CNBB teve início dia 11 de abril, apenas 4 dias após a prisão política do ex-presidente Lula.
Tendo como tema “Diretrizes para a formação de presbíteros”, a Assembleia da CNBB reuniu quase 500 bispos da igreja do Papa Francisco durante 10 dias, até 20 de abril, na cidade de Aparecida/SP.
Muito chama atenção a mensagem da conferência nacional dos bispos do Brasil ao povo de deus (na íntegra, abaixo) publicada ao término do evento.
O conteúdo anódino da mensagem contrasta com a realidade de injustiça, exclusão social, sofrimento humano, miséria, desemprego e perseguição política derivada do golpe de Estado e da ditadura jurídico-midiática que devastam o país.
A mensagem registra que
“Vivemos um tempo de politização e polarizações que geram polêmicas pelas redes sociais e atingem a CNBB”, e esclarece que “A CNBB não se identifica com nenhuma ideologia ou partido político. As ideologias levam a dois erros nocivos: por um lado, transformar o cristianismo numa espécie de ONG, sem levar em conta a graça e a união interior com Cristo; por outro, viver entregue ao intimismo, […]”.
Apesar de reivindicar que “Não podemos nos calar quando a vida é ameaçada, os direitos desrespeitados, a justiça corrompida e a violência instaurada”, a CNBB não fez nenhuma menção a episódios que se enquadram no que seriam critérios para o posicionamento pastoral da entidade, como o assassinato da Marielle e do Anderson, os atentados contra a caravana do Lula, a escalada da violência no campo, o genocídio de pobres e mulheres, a fascistização do Brasil e a farsa jurídica da prisão política do Lula.
Em clara alusão à participação de Dom Angélico Bernardino [bispo emérito da Diocese de Blumenau] no encontro ecumênico realizado no sindicato dos metalúrgicos de São Bernardo do Campo em 7 de abril em homenagem a Dona Marisa, a mensagem frisou que
“A Conferência Episcopal, como instituição colegiada, não pode ser responsabilizada por palavras ou ações isoladas que não estejam em sintonia com a fé da Igreja, sua liturgia e doutrina social, mesmo quando realizadas por eclesiásticos”.
Em 1964, setores conservadores da Igreja Católica hegemonizaram o posicionamento oficial da CNBB de apoio ao golpe civil-militar que destruiu a democracia, pois significava a graça da “Virgem de Aparecida ter escutado os clamores do povo e livrado o Brasil da ameaça comunista” [Frei Betto, Igreja Católica e o Golpe de 1964].
Como diz Karl Marx no 18 Brumário de Luís Bonaparte: a história se repete, a primeira vez como tragédia; a segunda, como farsa.
Diante das Diretrizes da CNBB para a formação de presbíteros, só resta a esperança de que o Papa Francisco haverá de ter compaixão para com o povo brasileiro.
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MENSAGEM DA CONFERÊNCIA NACIONAL DOS BISPOS DO BRASIL AO POVO DE DEUS
O que vimos e ouvimos nós vos anunciamos, para que também vós tenhais comunhão conosco. Ora, a nossa comunhão é com o Pai e com o seu Filho Jesus Cristo (1Jo 1,3)
Em comunhão com o Papa Francisco, nós, Bispos membros da CNBB, reunidos na 56ª Assembleia Geral, em Aparecida – SP, agradecemos a Deus pelos 65 anos da CNBB, dom de Deus para a Igreja e para a sociedade brasileira. Convidamos os membros de nossas comunidades e todas as pessoas de boa vontade a se associarem à reflexão que fazemos sobre nossa missão e assumirem conosco o compromisso de percorrer este caminho de comunhão e serviço.
Vivemos um tempo de politização e polarizações que geram polêmicas pelas redes sociais e atingem a CNBB. Queremos promover o diálogo respeitoso, que estimule e faça crescer a nossa comunhão na fé, pois, só permanecendo unidos em Cristo podemos experimentar a alegria de ser discípulos missionários.
A Igreja fundada por Cristo é mistério de comunhão: “povo reunido na unidade do Pai e do Filho e do Espírito Santo” (São Cipriano). Como Cristo amou a Igreja e se entregou por ela (cf. Ef 5,25), assim devemos amá-la e por ela nos doar. Por isso, não é possível compreender a Igreja simplesmente a partir de categorias sociológicas, políticas e ideológicas, pois ela é, na história, o povo de Deus, o corpo de Cristo, e o templo do Espírito Santo.
Nós, Bispos da Igreja Católica, sucessores dos Apóstolos, estamos unidos entre nós por uma fraternidade sacramental e em comunhão com o sucessor de Pedro; isso nos constitui um colégio a serviço da Igreja (cf. Christus Dominus, 3). O nosso afeto colegial se concretiza também nas Conferências Episcopais, expressão da catolicidade e unidade da Igreja. O Concílio Vaticano II, na Lumen Gentium, 23, atribui o surgimento das Conferências à Divina Providência e, no decreto Christus Dominus, 37, determina que sejam estabelecidas em todos os países em que está presente a Igreja.
Em sua missão evangelizadora, a CNBB vem servindo à sociedade brasileira, pautando sua atuação pelo Evangelho e pelo Magistério, particularmente pela Doutrina Social da Igreja. “A fé age pela caridade” (Gl 5,6); por isso, a Igreja, a partir de Jesus Cristo, que revela o mistério do homem, promove o humanismo integral e solidário em defesa da vida, desde a concepção até o fim natural. Igualmente, a opção preferencial pelos pobres é uma marca distintiva da história desta Conferência. O Papa Bento XVI afirmou que “a opção preferencial pelos pobres está implícita na fé cristológica naquele Deus que se fez pobre por nós, para enriquecer-nos com a sua pobreza”. É a partir de Jesus Cristo que a Igreja se dedica aos pobres e marginalizados, pois neles ela toca a própria carne sofredora de Cristo, como exorta o Papa Francisco.
A CNBB não se identifica com nenhuma ideologia ou partido político. As ideologias levam a dois erros nocivos: por um lado, transformar o cristianismo numa espécie de ONG, sem levar em conta a graça e a união interior com Cristo; por outro, viver entregue ao intimismo, suspeitando do compromisso social dos outros e considerando-o superficial e mundano (cf. Gaudete et Exsultate, n. 100-101).
Ao assumir posicionamentos pastorais em questões sociais, econômicas e políticas, a CNBB o faz por exigência do Evangelho. A Igreja reivindica sempre a liberdade, a que tem direito, para pronunciar o seu juízo moral acerca das realidades sociais, sempre que os direitos fundamentais da pessoa, o bem comum ou a salvação humana o exigirem (cf. Gaudium et Spes, 76). Isso nos compromete profeticamente. Não podemos nos calar quando a vida é ameaçada, os direitos desrespeitados, a justiça corrompida e a violência instaurada. Se, por este motivo, formos perseguidos, nos configuraremos a Jesus Cristo, vivendo a bem-aventurança da perseguição (Mt 5,11).
A Conferência Episcopal, como instituição colegiada, não pode ser responsabilizada por palavras ou ações isoladas que não estejam em sintonia com a fé da Igreja, sua liturgia e doutrina social, mesmo quando realizadas por eclesiásticos.
Neste Ano Nacional do Laicato, conclamamos todos os fiéis a viverem a integralidade da fé, na comunhão eclesial, construindo uma sociedade impregnada dos valores do Reino de Deus. Para isso, a liberdade de expressão e o diálogo responsável são indispensáveis. Devem, porém, ser pautados pela verdade, fortaleza, prudência, reverência e amor “para com aqueles que, em razão do seu cargo, representam a pessoa de Cristo” (LG 37). “Para discernir a verdade, é preciso examinar aquilo que favorece a comunhão e promove o bem e aquilo que, ao invés, tende a isolar, dividir e contrapor” (Papa Francisco, Mensagem para o 52º dia Mundial das Comunicações de 2018).
Deste Santuário de Nossa Senhora Aparecida, invocamos, por sua materna intercessão, abundantes bênçãos divinas sobre todos.
Aparecida-SP, 19 de abril de 2018.
Cardeal Sergio da Rocha
Arcebispo de Brasília – DF
Presidente da CNBB
Dom Murilo Sebastião Ramos Krieger, SCJ
Arcebispo São Salvador da Bahia
Vice-Presidente da CNBB
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