sexta-feira, 4 de maio de 2018

Só o Supremo de Portugal ignora poder de Moro


RIBAMAR FONSECA
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Que decepção! Todo mundo que esperava uma atitude do Supremo Tribunal Federal diante da afronta do juiz Sergio Moro, que se recusou a cumprir determinação da segunda turma daquela Corte para que o processo de Lula sobre o sitio de Atibaia fosse remetido para a Justiça paulista, se decepcionou profundamente. Além do silêncio da presidenta Carmem Lúcia, o ministro Dias Tóffoli, que havia dado o parecer favorável à remessa do processo, negou tudo. Segundo disse, a 2ª. turma não examinou a competência da 13a. Vara Federal de Curitiba nem determinou o envio das ações para São Paulo. "Assentou-se apenas – acentuou – em caráter provisório e com base exclusivamente nos precários elementos de informação constantes dos autos da PET 6.780, não ser possível afirmar-se que os termos de depoimentos de colaboradores teriam vinculação com o juízo da 13ª Vara Federal Criminal de Curitiba". E mais: o próprio Tóffoli negou o pedido de liminar da defesa do ex-presidente para suspender o andamento da ação do sitio, que tramita no Paraná. Ou seja, não houve afronta: Moro apenas fez valer a sua autoridade.

Depois disso, quem estiver esperando alguma mudança no comportamento da Corte Suprema a partir de setembro vindouro, quando o ministro Dias Tóffoli assumir a sua presidência, pode começar a tirar o cavalinho da chuva. Tóffoli, pelo visto, deve dar continuidade à decepcionante gestão da ministra Cármem Lúcia, que vai marcar a sua passagem pelo comando do STF com a decisão, tomada graças ao seu voto de Minerva, que suprimiu a presunção de inocência prevista pela Constituição ao determinar a prisão imediata do réu condenado em segunda instância, que permitiu o encarceramento de milhares de brasileiros, inclusive do ex-presidente Lula, sem o trânsito em julgado. Segundo pesquisa da Defensoria Pública de São Paulo, revelada pelo deputado Wadih Damous, pelo menos 13.887 mandados de prisão foram expedidos só pelo Tribunal de Justiça paulista após a decisão do Supremo que permitiu a prisão em segunda instância. Isso significa que para permitir a prisão de Lula a presidenta Cármem Lúcia e a maioria dos ministros do STF não se importaram em colocar no cárcere milhares de brasileiros em todo o país.

Ninguém, na verdade, deve esperar do Supremo qualquer atitude compatível com a sua posição de Suprema Corte e, muito menos, de cumprir a sua missão constitucional de promover justiça, como última instância do Judiciário na reparação de injustiças. Depois que aprovou o golpe que destituiu a presidenta Dilma Roussef, revelando-se conivente com a inconstitucionalidade do impeachment, nada mais surpreende sobretudo aos juristas. Como disse recentemente um ex-ministro, o STF se transformou num "tribunal penal de segunda classe". Na realidade, o Supremo se transformou mesmo num tribunal político, inclusive legislando, perfeitamente afinado com o governo golpista no processo destrutivo da Nação: enquanto Temer entrega nossas riquezas e empresas para o capital estrangeiro, ao mesmo em que destrói as conquistas sociais, a Suprema Corte lança a Constituição no lixo, ignorando o seu texto e validando interpretações que atendem aos seus interesses políticos. Talvez por isso já disseram que o STF, com honrosas exceções, tem hoje a pior composição da sua História.

Diante de um Congresso acovardado, que há tempos vem aceitando sem um gemido o seu estupro pelo Judiciário, o Supremo Tribunal Federal foi gradativamente ocupando o espaço do Parlamento, assumindo descaradamente as suas atribuições, ou seja, legislando. Além da prisão em segunda instância, decisão inconstitucional denunciada pelos maiores juristas do país, a Suprema Corte decidiu esta semana também restringir o foro privilegiado de deputados e senadores, alterando dispositivo da Constituição da competência exclusiva do Legislativo. O Supremo vem usurpando atribuições do Parlamento sem qualquer reação dos parlamentares desde a prisão do senador Delcidio do Amaral. Segundo a Carta Magna, deputados e senadores só podem ser presos em flagrante delito mas a Suprema Corte autorizou a prisão do senador em escandaloso desrespeito à Constituição. E o Senado, longe de reagir em defesa do seu membro e da própria Carta Magna, ainda cassou o mandato de Delcídio, numa atitude de vergonhosa covardia.

Diante disso, sentindo-se fortalecido na mesma proporção da fraqueza do Parlamento, foi que um juiz de primeira instância mandou a Policia Federal invadir o Senado, apreender seus equipamentos eletrônicos e prender o chefe da policia legislativa. Uma vergonha. E ficou por isso mesmo. Enquanto o Parlamento se curva diante do poder do Supremo, este, por sua vez, se curva diante do poder do juiz Sergio Moro, que continua sendo a maior autoridade do país. Ele tem tanto poder que decidiu que Guarujá e Atibaia ficam no Paraná, razão porque os processos contra Lula permanecerão em sua jurisdição. Sua palavra é a lei maior. A melhor prova disso é que decidiu que o apartamento do Guarujá e o sitio de Atibaia pertencem a Lula, mesmo com os respectivos títulos de propriedade em nome de outras pessoas, e condenou o ex-presidente com base nisso, ou seja, em sua convicção. Diante desse abuso escandaloso, o que a Suprema Corte deveria estar discutindo era a anulação dos processos e não a legalidade da prisão, pois todo mundo, inclusive os ministros togados, sabe que tudo não passou de uma armação para impedir Lula de voltar à Presidência da República.

Como, porém, o juiz Moro é intocável e as suas sentenças irretocáveis, mesmo sem serem lidas – conforme deixou claro o desembargador Thompson Flores, presidente do TRF-4 – tudo leva a crer que ele continuará reinando absoluto, pois nem o CNJ tem coragem de julgar as representações contra ele. A turma da Lava-Jato, que apresentou um projeto de lei extinguindo o habeas corpus e legalizando a tortura para obtenção de provas, bem que poderia elaborar uma nova proposta, agora para que seja extinto o Supremo e Moro coroado imperador da Justiça. Pelo menos se economizaria tempo e dinheiro, reduzindo-se o trâmite dos processos e o número de togados com altos salários. Só o Supremo Tribunal de Portugal não tomou conhecimento do poder do juiz de Curitiba e mandou soltar o empresário Raul Schmidt, que Moro queria fosse extraditado para o Brasil. Pelo menos lá em Portugal ele não manda.
Ribamar Fonseca


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