Em editorial, Estadão detona “pacote-punição” de Moro

          Juiz Sérgio Moro(foto: Nelson Almeida/AFP)


Ao apresentar o pacote de três projetos legislativos ditos anticrime, o governo federal colocou a criminalização do caixa 2 num único projeto, à parte do restante das medidas. “Foi o governo ouvindo as reclamações razoáveis dos parlamentares quanto a esse ponto e simplesmente adotando uma estratégia diferente”, afirmou o ministro da Justiça, Sergio Moro.

Tivesse o governo federal ouvido as muitas reclamações razoáveis que surgiram desde o primeiro anúncio do pacote de medidas, certamente teria revisto grande parte do conteúdo das propostas apresentadas. Sob pretexto de adequar a legislação à realidade atual e diminuir a sensação de impunidade, o pacote de Moro comete abusos, minimiza garantias, amplia vulnerabilidades e premia deficiências do sistema de Justiça.

Em primeiro lugar, os três projetos de lei apresentados pelo ministro Moro não são propriamente um pacote de segurança pública. São medidas para ampliar a punição penal. Eventual aprovação pelo Congresso não terá o condão de prover um ambiente de menor criminalidade. Prevenção e punição são temas diversos – e é preocupante que o governo Bolsonaro seja incapaz de perceber essa profunda diferença. Além de gerar falsa expectativa na população, apresentar o pacote de aumento de punição como prioridade nacional é retardar a implementação das medidas aptas de fato a melhorar a segurança pública.

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Causa especial estranheza a presença da excludente de ilicitude para policiais no pacote, já que as polícias estaduais não parecem inseguras no seu atuar profissional por receio de problemas jurídicos futuros. O que se vê é precisamente o oposto. Por isso, em vez de ampliar os casos de impunidade para a violência policial, é preciso investir na formação dos policiais, para que todos sejam capacitados para agir dentro da lei, especialmente nas situações de risco e de combate.

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De fato, o Estado precisa de uma profunda recapacitação, que o torne capaz de prover um ambiente público de paz e segurança. Isso nada tem a ver, no entanto, com endurecimento das leis penais ou restrição das garantias. Por exemplo, a permissão para escuta ambiental, outro ponto do pacote, pode gerar abusos, mas pouco contribui para que o cidadão possa andar com segurança por sua cidade. A prioridade é a segurança pública ou é aumentar o poder dos juízes?

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