terça-feira, 22 de dezembro de 2020

Carta de um ex-jornalista sobre as feras que habitam as redações

E dói muito ver alguns deles, hoje, se adaptarem com tanta facilidade aos novos tempos -- agora temos de ser antifascistas, não é mesmo? -- e enganarem gente sem memória e até com preguiça de uma banal pesquisa no Google. Cujos algoritmos, diga-se de passagem, já escondem o que eles assinaram no verão passado.


Como foi uma carta de cunho pessoal, mas de conteúdo relevante, publico, tirando pontos que possam identificar o autor.

Os dois textos que você publica são comoventes e necessários para qualquer leitor que os leia com ânimo de conhecer a verdade. Mas, para mim, aos 65 anos e jornalista desde os 18, são um soco no estômago e um pito que todos nós que um dia vivemos desta profissão maldita merecemos levar e deveríamos levar de vez em quando, apenas para acordar para a triste realidade.

Enquanto fui militante de esquerda, até os anos 80, era tudo muito simples: a culpa é do patrão, estamos conversados e somos todos vítimas de sua pressão de classe. A vida e, repito, esta maldita profissão, me ensinaram que não é bem assim e não é assim tão simples.

Fui chefe por mais de 20 anos — (aqui os altos cargos que ocupou, e que corto para não identificá-lo) — e aprendi que os patrões são identificáveis em seus interesses, mas o perigo maior muitas vezes – muitas! – está no “colega” que nos trai, que trai a si mesmo, que trai a profissão, que trai a verdade e que planeja, sugere, elabora e promove as maiores infâmias da imprensa contra fontes, contra adversários, contra inimigos a serem abatidos e – aqui o mais chocante – contra colegas que possam representar risco ou, até mesmo apenas um desconfortável exemplo de honestidade que os canalhas a soldo nunca tiveram mas pretendem fingir ter.

Contra a busca da verdade, sobretudo.

E dói muito ver alguns deles, hoje, se adaptarem com tanta facilidade aos novos tempos — agora temos de ser antifascistas, não é mesmo? — e enganarem gente sem memória e até com preguiça de uma banal pesquisa no Google. Cujos algoritmos, diga-se de passagem, já escondem o que eles assinaram no verão passado.

Deixei de ser jornalista quando me tornei assessor e consultor. Não considero que sejam funções equivalentes. São lados diferentes do balcão. Mas confesso que abdiquei do título ainda por amor a uma profissão que me abandonou antes que eu pudesse abandoná-la.

Hoje, ainda tenho saudade das redações tradicionais. Mas depois de um infarto, que por minutos nao me levou há pouco mais de uma década, preciso ficar longe destes ambientes.

Você vê a aproximação da destruição do seu meio de vida. Eu vejo perto a morte por absoluta descrença e decepção.

Desculpe o texto muito longo, escrito de um fôlego e provavelmente cheio de erros de digitação.

Um grande e solidário abraço.

Nenhum comentário:

Postar um comentário