quarta-feira, 30 de dezembro de 2020

Com a pandemia descobrimos que a prisão é a nossa casa

Nonato Menezes

Todos nós precisamos e desejamos uma morada para dizer que é nossa. Reduto que nos proteja das hostilidades da rua, das intemperes do tempo e nos sirva para desfrutar da intimidade.

Para os mais exigentes e com condições, a morada também precisa ser funcional, ventilada, ter luminosidade adequada e, oxalá, ser esteticamente agradável aos sentidos.

Nossa morada, por assim dizer, deve ou deveria ser o castelo da nossa satisfação, o lugar do descanso e, em ampla medida, do nosso prazer.

Verdade se diga; somos invariavelmente dependestes de uma morada, seja ela com o perfil dito acima ou precária, neste caso, pelo menos, aos olhos de quem nela não habita.

Eis que nos aparece um vírus pavoroso, assustador para o mundo humano.

Um vírus que já abreviou a vida de milhares e semeou pânico entre a maioria das pessoas.

Um vírus que veio para nos assombrar, para matar, para ocupar as ruas e nelas viajar ao sabor do vento.

É como se ele nos dissesse: – Vão para suas casas, porque a rua é minha!

Ora pois “majestade!” Diria eu. Afinal, minha morada é o castelo da minha satisfação.

Mas, à luz dos acontecimentos e dos dados, o que poderia ser o “castelo da satisfação” para muitos, passou a ser uma prisão transformada num verdadeiro inferno.

Não são poucas, segundo a voz ampliada da comunicação de massa, as moradas que passaram de um momentâneo ambiente de isolamento para evitar o vírus à prisões de altíssima periculosidade.

“Isolados” em suas próprias moradas homens, mulheres, idosos e crianças passaram a viver em um espaço que deveria ser de satisfação e prazer, mas, na pandemia, veio a ser um ambiente de alto risco para a vida, com índices de suicídios “fora do normal”, depressão em números assustadores e crescimento vertiginoso de feminicídios.

Ora, como pode um ambiente que é tão necessário, indiscutivelmente providencial para vivermos bem e melhor, passe, em um período que impõe medo e exige cautela, a ser uma jaula para os brutos e prisão de alta periculosidade para os mais vulneráveis?

Ou seria a rua o espaço mais propício à vida de uma sociedade que ainda não conseguiu distinguir a Civilização da Barbárie?

Diante de tantas atrocidades, é de se intuir que possivelmente os maiores problemas, os quais estamos vivenciando, não sejam aqueles provocados pelo vírus, mas pela intolerância, a estupidez e o vazio dos corações e mentes dos “animais civilizados”.

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