Em algum momento futuro, no pós-bolsonarismo, se terá que discutir mais seriamente as responsabilidades institucionais das grandes estatais estratégicas.
Por Luis Nassif
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Como era previsível, as ações da Petrobras voltaram a subir, depois do carnaval dos últimos dias. A razão é simples: segunda-feira era vencimento do mercado de opções.
Por lá, se joga assim: um investidor se compromete a vender a outro investidor determinado papel, em data futura, por um preço previamente definido. Se, no vencimento, o valor do papel estiver abaixo do combinado, o vendedor paga a diferença; se estiver acima, o comprador paga.
São momentos de alta volatilidade do mercado. No final dos anos 80, governo Sarney, houve um vencimento de opções que tinha como jogador grandes amigos do presidente, como o empresário Mathias Machline. Na véspera, Sarney entrou na Sala de Imprensa do Palácio com uma garrafa fechada. Com voz embargada, disse que era petróleo retirado da ilha de Marajó.
O que Bolsonaro declarou, na 6a feira, nada tem de excepcional. O próprio Fernando Henrique Cardoso – principal artífice do liberalismo brasileiro – reagiu contra aumentos da Petrobras, assim como Lula e Dilma. Pela relevante razão de que petróleo é um insumo estratégico que impacta toda a estrutura de preços da economia.
O que chama a atenção é a maneira como anunciou as mudanças, e justamente nas vésperas do vencimento de opções. Na terça feira, com o jogo terminado, anuncia o encaminhamento da privatização da Eletrobras, algo que poderia ter mudado totalmente o humor do mercado.
Portanto, por ignorância ou por cálculo, Bolsonaro cometeu um crime contra o mercado. Em circunstâncias normais, seria caso até para perda do cargo. Mas o anúncio da privatização da Eletrobras lhe dará mais uma sobrevida junto ao mercado, e seus dois braços atuais, mídia e Centrão.
Nos próximos dias, é bastante provável que o novo presidente apresente a proposta de criação de um fundo fiscal, destinado a amenizar as variações de preços internos. Mas ainda há dúvidas de monta sobre o fundo.
Quando os preços caem, aumenta-se o imposto, mantendo o mesmo preço e permitindo arrecadar recursos fiscais para o momento seguinte – de alta de preços.
Mas supondo que o fundo já existisse. Como iria atuar em relação as preços atuais, com aumentos expressivos combinados de câmbio e cotações internacionais? Em algum momento futuro, no pós-bolsonarismo, se terá que discutir mais seriamente as responsabilidades institucionais das grandes estatais estratégicas.
Essa discussão tem que se focar na Eletrobras, que trabalha com outro insumo estratégico, a energia elétrica. O modelo elétrico brasileiro, depois dos desastres da reforma de FHC e dos ajustes de Dilma Rouseff, enquanto ministra de Minas e Energia, criou dois mercados básicos. O primeiro, da energia contratada, contratos de longo prazo firmados com distribuidoras, garantindo estabilidade de preços. O segundo, o livre mercado, exposto a volatilidades.
Como geradora e transmissora, a Eletrobras é peça fundamental não apenas para a oferta de energia contratada, como da própria estabilidade do mercado livre
Os negócios da privatização com a Eletrobras são óbvios. Privatiza-se de acordo com os preços de uma empresa que tem a maior parte de sua energia vendida em contratos de longo prazo. No dia seguinte, privatizada, essa energia será jogada no mercado livre, produzindo um novo choque tarifário, similar ao que ocorreu depois da reforma de FHC.
É tema relevante demais para depender apenas de Bolsonaro, Paulo Guedes e Centrão.
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