(Foto: Foto:Isaac Amorim/MJSP)
Por Moisés Mendes
Se os mesmos homens que organizaram o desfile com sucatas de tanques serão também os organizadores do golpe de Bolsonaro, já se sabe que dificilmente haverá golpe.
Podem até tentar um golpe e anunciá-lo formalmente como golpe. Mas a turma envolvida na desorganização do desfile não tem condições de aplicar e de segurar um golpe.
Se Bolsonaro fosse submetido a alguma racionalidade, mesmo como golpista, os organizadores do desfile deveriam ser chamados e dispensados. O pior inimigo de Bolsonaro não conseguiria fazer o que foi feito nesta terça-feira em Brasília.
Ninguém esperava um desfile como os que Kim Jong-uno organiza na Coreia do Norte, como se soldados e armas de guerra fossem robôs. Muito menos um espetáculo com a exibição de harmonia, poder e beleza como os promovidos historicamente por russos e chineses.
Mas não precisava ser algo tão degradante. Faltou aos militares a preocupação com um item que os fardados valorizam. Faltou respeito às liturgias do mundo militar. Uma simples fila de tanques não faz um desfile.
Faltaram organização e disciplina e sobrou fumaça. Os militares deram uma demonstração não de improviso, mas de desorganização. Se um desfile é realizado com tanto desleixo, como seria um golpe?
O evento desta terça passa um desprezo dos generais pela própria ideia do golpe. Ficou claro que não houve empenho com o teatro armado por Bolsonaro. Entregaram ao sujeito o que eles devem achar que ele merece.
Mas como ficam as Forças Armadas depois do show diante do Palácio do Planalto? Ficam como estão desde a posse do seu comandante supremo. O desfile ampliou a sensação de que Bolsonaro sustenta o blefe em bases cada vez mais precárias.
O ministro da Defesa, diretor do desfile, ofereceu mais um produto ruim ao seu líder. Braga Netto, o interventor do Rio, o famoso autor do Programa Pró-Brasil, um plano colegial de investimentos estatais, apresentado em abril de 2020 e que nunca saiu do PowerPoint, fracassou de novo.
Foi Braga Netto quem se sentou à mesa, no pico da pandemia, nas entrevistas coletivas, cercado por gente da saúde pública, como o escalado por Bolsonaro para dizer que ali havia um comando forte. Ele seria o interventor-articulador das falas e das ações do governo. Foi um horror, e o general sumiu.
Braga Netto é desde o final de março o escolhido por Bolsonaro para a tarefa de promover a adesão incondicional dos militares ao governo, refugada pelo general Fernando Azevedo e Silva. O desfile de ontem poderia ser sua grande obra alegórica. Foi patético.
Bolsonaro e seus militares desmoralizaram os preparativos para o golpe. Há entre os analistas, os políticos, os empresários e entre o povo o sentimento de que, mesmos sem condições objetivas de levar um golpe adiante, Bolsonaro não irá desistir.
O aprofundamento da sua fragilização e de seu desespero é o que acelera o desatino. Bolsonaro vai sendo retroalimentado por seus fracassos. Na sequência de seus atos, hoje ou amanhã ele pode dizer que o golpe será levado adiante.
E aí alguém terá de coordenar as ações que levarão ao golpe, para amordaçar Congresso, Supremo e imprensa e estabelecer os protocolos de um regime de exceção.
Mas se Bolsonaro não tem um grupo capaz de articular um desfile, teria quadros civis e militares em condições de dar forma e sentido a um golpe? Braga Netto deve saber ou achar que sabe.
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