
Julian Assange (Foto: Reuters)
"Ausência injustificável do criador do Wikileaks dá um caráter seletivo ao Premio Nobel da Paz", escreve Paulo Moreira Leite, do Jornalistas pela Democracia.
Por Paulo Moreira Leite
Liberdade é um tema complexo em todas as suas expressões e o universo da imprensa não é diferente.
Podemos discordar da orientação de determinada publicação. Mas aprendemos a cultivar princípios que permitem reconhecer sua legitimidade mesmo na discordância -- e aplaudir iniciativas que representem um fortalecimento da democracia num ambiente de opressão e injustiça.
Não há objeções a fazer ao Prêmio Nobel da Paz atribuído a Maria Ressa, que há décadas denuncia corajosamente a violência política nas Filipinas, e Dmitri Muratov, um dos fundadores do Novaya Gazeta, o mais importante jornal independente da Rússia -- que já teve seis jornalistas assassinados em circunstâncias suspeitas.
Cabe porém, registrar e condenar a ausência de Julian Assange, criador do Wikileaks, numa premiação que poderia abrir um debate necessário numa época onde as fraquezas dos regimes democráticos se transformaram em fratura exposta, numa situação trágica que inclui o jornalismo em várias partes do mundo. (Em 2020, 274 profissionais foram presos e 21 foram assassinados em função de seu trabalho).
Sob qualquer ponto de vista, a situação de Assange é exemplar, inescapável.
Sob sua liderança, o Wikileaks descobriu que era possível valer-se das modernas tecnologias para revelar as entranhas mais obscuras dos sistemas de poder do planeta, trazendo à luz bastidores guerras e operações que modificaram o destino de povos e países -- na América do Sul, Ásia e Oriente Médio.
Foi assim que nasceu um novo padrão de jornalismo investigativo, apoiado em documentos e registros oficiais, que permitem denúncias sólidas e reportagens consistentes -- o exemplo mais recente são os Pandora Papers, que apanharam as contas de Paulo Guedes e Roberto Campos Neto em paraísos fiscais.
Ao ignorar um personagem gigantesco, aprisionado na Inglaterra, onde é ameaçado de extradição para um julgamento militar nos Estados Unidos, a Comissão do Nobel fez uma premiação seletiva, quando todos sabemos que a liberdade de expressão é um valor universal -- ou não é.
Alguma dúvida?
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