segunda-feira, 26 de dezembro de 2022

Os abençoados corredores estratégicos

Fontes: CIPADH - Revolta / Imagem: Adveniat


De tempos em tempos, aparecem certas tendências na violência colombiana que parecem ter um potencial heurístico excessivo para explicar as causas e a persistência do conflito, especialmente em uma chave regional.

O problema com esses modismos é que muitas vezes eles servem como um substituto para uma explicação real e uma investigação aprofundada. Basta invocá-los, explicar magicamente sem explicar nada. A suposta seriedade acadêmica exige apalpar um pouco mais as modas já conhecidas, de forma quase fetichista. De algum tempo para cá, a tese das economias ilícitas como causa última, suprema e motor do conflito colombiano (que já critiquei em ocasiões anteriores) [1] começou a ceder a uma tese que não a contradiz, mas antes complementa. Essa tese é a do corredor estratégico, segundo a qual o conflito se explica nas regiões porque seriam corredores estratégicos para bens sem fim: drogas, armas, tropas, etc.

De vez em quando, onde quer que você vá na Colômbia, eles dizem que o conflito persiste na região porque seria um corredor estratégico. Todos os atores armados lutam pelo território (seja ele qual for) por suas qualidades de corredor estratégico. Não importa onde você está. Seja em Putumayo, Cauca, Chocó, Antioquia, onde quer que seja, a história é a mesma. Este território é um corredor estratégico. Parece que o país inteiro virou a porra de um corredor estratégico. Claro, se você estiver em Urabá, um ponto se conecta com o Pacífico e outro com o nó Paramillo. Se alguém está em Tolima, a cordilheira central está conectada com a oriental. Em Cauca, o maciço se conecta com o Pacífico. E assim por diante. E claro, isso pode soar banal, mas qualquer ponto da geografia nacional está ligado a outros. onde estamos podemos dizer, daqui chegamos a tal parte, a tal outro ponto, etc. Com efeito, o país inteiro é uma porra de um corredor em que (surpresa, surpresa) de um lado se chega ao outro.

O problema com o argumento mais óbvio é que se todo o país é um corredor estratégico, então onde está o caráter estratégico? Bem, se o corredor estratégico é qualquer lugar onde haja uma disputa ou a presença de um ator armado, então não há caráter estratégico em nenhum deles. O problema mais preocupante, em todo caso, não é de natureza puramente científica ou lógica, mas reside na visão que ela dá do conflito armado. Supõe-se que não há nada intrínseco nos territórios que está na base dos conflitos: disputas socioeconômicas, relações de classe (palavra tabu nas ciências sociais pós-modernas), tensões étnico-sociais. Mais uma vez, prevalece a tese dos atores armados perversos e desenraizados e de uma sociedade civil bondosa e enraizada. Os primeiros, eles simplesmente passam por esses corredores estratégicos. Estes últimos encontram-se nos territórios e testemunham a perversidade destas carniceiras que passam. A realidade, porém, é muito mais complexa nos territórios, e a tese dos corredores nos permite um certo desvio intelectual para essas complexidades.

Assim, a compreensão das causas estruturais do conflito é mais uma vez deslocada -ou seja, quais são as forças sociais específicas em disputa?- por uma visão geoestratégica que se assemelha mais a um simples tabuleiro de xadrez do que a uma tapeçaria complexa dado o caráter profundamente enraizado do conflito nos territórios. Devemos parar de pensar nos territórios de conflito como meros corredores para realmente entender o que está acontecendo neles. É por isso que toda vez que ouço falar de corretores estratégicos, sinto um arrepio na espinha. Agora que estamos num novo ciclo de conflito (que esperamos breve, com a ajuda da política de paz total) devemos desenvolver ferramentas teóricas e conhecimentos empíricos que nos permitam, a partir das ciências sociais,

Observação:


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