
Na prática aquele Tribunal colocou um novo entrave nas discussões da paz possível entre a Rússia e a Ucrânia.
O TPI assinou a sentença de morte daquela instituição
por Fábio de Oliveira Ribeiro
Até a II Guerra Mundial, a História costumava ser cruel com aquele que foi derrotado. Isso começou a mudar no momento em que a ordem mundial criada no Pós Guerra começou a possibilitar a condenação de qualquer país que viole as regras da ONU que fazem uma clara distinção entre agressão militar ilegítima e reação militar justa em caso de soberania territorial violentada.
As potências vitoriosas na II Guerra têm direito de veto. Logo, desde que a ONU foi criada EUA, Rússia, China, França e Reino Unido sempre estiveram acima das regras, porque elas podem simplesmente vetar Resoluções que condenem suas agressões militares imperialistas.
De maneira geral, podemos dizer que a ordem internacional do Pós Guerra oscila entre o predomínio da ordem e a expansão do caos. Durante décadas, as potências nucleares evitaram o conflito cataclísmico e tentaram criar condições para uma coexistência tão pacífica quanto possível e se esforçaram para preservar a ONU. Em situações extremamente delicadas, elas pelo menos não deixaram de preservar as aparências de que a ONU é indispensável.
Essa realidade foi totalmente modificada durante a discussão da Resolução que autorizou os EUA e seus aliados a atacar militarmente o Iraque. Todos os argumentos levantados por autoridades americanas na ONU eram falsificações, versões maliciosas de fatos não comprovados ou simplesmente mentiras descaradas. As armas de destruição em massa não existiam. O regime de Saddan Hussein não representava nenhum perigo regional ou mundial. Ele não teve nenhuma participação na idealização, organização ou financiamento do ataque ao WTC.
Durante a invasão e ocupação militar do Iraque comandada por George W. Bush e Tony Blair centenas de milhares de civis foram mortos. A tortura foi sistematicamente utilizada por americanos. Execuções de inocentes e suspeitos a sangue frio foram cometidas. Toneladas de depleted uranium ammunition foram utilizadas pelos norte-americanos e os resíduos desse material provoca doenças e deformidades fetais até os dias de hoje.
O Tribunal Penal Internacional não puniu nenhum político ou comandante militar norte-americano e inglês por causa dos crimes cometidos durante a guerra do Iraque. A impunidade de George W. Bush e Tony Blair são escandalosas e comprometem a imagem de seriedade daquele tribunal internacional. Todavia, agora o TPI resolveu emitir um mandado de prisão contra Vladimir Putin https://www.icc-cpi.int/news/situation-ukraine-icc-judges-issue-arrest-warrants-against-vladimir-vladimirovich-putin-and .
Não vou aqui entrar no mérito das acusações feitas contra o governante russo. No calor da guerra é difícil dizer quem cometeu realmente um crime e quem agiu para interromper crimes em massa que estavam sendo cometidos. O TPI, por exemplo, não emitiu nenhum mandado de prisão contra autoridades ucranianas durante o longo período em que batalhões nazistas incorporados às Forças Armadas da Ucrânia bombardearam diariamente as cidades de Donetsk e Lugansk após a celebração do Acordo de Paz de Minsk.
A Rússia obviamente não cumprirá a decisão do TPI. Se algum país tentar cumprir essa decisão a prisão ou tentativa de prisão do presidente russo será considerado um ato de guerra. Na prática aquele Tribunal colocou um novo entrave nas discussões da paz possível entre a Rússia e a Ucrânia. Não só isso, o TPI aumentou a percepção dos russos de que eles estão em guerra não apenas contra os nazistas ucranianos e sim contra toda a comunidade internacional. Isso apenas reforçará a determinação dos russos de esmagar seus inimigos com todos os meios que eles têm à sua disposição.
Durante as discussões que levaram a aprovação da Resolução que autorizou a guerra que os EUA e a Inglaterra impuseram ao Iraque, a ONU foi transformada numa arma diplomática de destruição em massa contra um país membro daquela organização internacional que não havia cometido nenhuma agressão militar contra americanos e ingleses. Isso comprometeu bastante a habilidade da própria pria ONU de administrar e reduzir as tensões entre os países. Nesse momento me parece evidente que os inimigos da Rússia estão usando indevidamente o TPI e isso não é bom.
Além de ser acusado pela diplomacia russa de ter proferido uma decisão apressada e injusta, o TPI comprometeu sua imagem ao tratar Vladimir Putin de maneira diferente daquela que foi dispensada a George W. Bush, Tony Blair e Zelenzky. Um Tribunal que profere decisões que não podem ser cumpridas raramente colabora para a preservação de sua credibilidade. Portanto, devemos concluir que o mandado de prisão emitido contra o líder russo funcionará apenas como a certidão de óbito de todo o sistema internacional construído no período do Pós Guerra.
A guerra não foi evitada pelos países europeus que participaram das discussões que levaram ao Acordo de Paz de Minsk. Um conflito militar que não pode ser encerrado diplomaticamente ou vencido militarmente pela Ucrânia certamente não chegará ao fim por causa da decisão do TPI. Ao proferir uma decisão apressada e inexequível para comprometer a imagem de Vladimir Putin os juízes daquele Tribunal deram um tiro no coração da própria instituição. Nem mesmo eles mesmos poderão desfrutar qualquer prestígio internacional em decorrência de uma ordem de prisão que pode apenas ampliar a guerra e acelerar a escalada dos meios de destruição que serão utilizados.
Fábio de Oliveira Ribeiro, 22/11/1964, advogado desde 1990. Inimigo do fascismo e do fundamentalismo religioso. Defensor das causas perdidas. Estudioso incansável de tudo aquilo que nos transforma em seres realmente humanos.
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