
Foto de Alejandro Luengo
Na última década, uma mudança profunda ocorreu na academia global que alterou fundamentalmente a hierarquia da pesquisa científica. A China, antes considerada um player periférico na ciência de ponta, agora ascendeu à vanguarda da excelência acadêmica. Os últimos rankings do Nature Index revelam uma tendência surpreendente: nove das 10 principais instituições de pesquisa do mundo agora são chinesas, com a Universidade Harvard sendo a única presença ocidental no escalão superior.
Essa transformação sísmica, enquanto o governo Trump institui cortes profundos no financiamento para pesquisa e fecha o Departamento de Educação, ressalta não apenas a proeza científica da China, mas também sua visão estratégica para a liderança global em inovação e tecnologia. Para apreciar completamente a ascensão meteórica da China, é preciso olhar para o cenário acadêmico de uma década atrás. Quando o ranking Nature Index Global foi lançado pela primeira vez em 2014, apenas oito universidades chinesas chegaram ao top 100. Hoje, esse número mais que quintuplicou, com 42 instituições chinesas agora classificadas entre as melhores do mundo, superando as 36 universidades americanas e quatro britânicas na lista.
Entre essas instituições, a Universidade de Ciência e Tecnologia da China (USTC) surgiu como um formidável centro de pesquisa. Ela agora ocupa o segundo lugar no mundo, ostentando um total de 2.585 artigos de pesquisa de alto impacto e uma parcela de contribuição de 835,02. Da mesma forma, a Universidade de Zhejiang, a Universidade de Pequim e a Universidade de Tsinghua consolidaram suas posições como líderes na arena acadêmica global, produzindo pesquisas inovadoras em campos que vão da computação quântica à energia renovável.
Um olhar mais atento aos dados do Nature Index revela que o domínio da China é particularmente pronunciado em química, ciências físicas e ciências da terra e ambientais. Somente em química, as universidades chinesas ocupam todos os 10 primeiros lugares, um feito impressionante que reflete o comprometimento do país com a pesquisa fundamental. Da mesma forma, em ciências físicas, oito das 10 principais instituições são chinesas, sinalizando uma mudança nas prioridades globais de pesquisa.
Enquanto os Estados Unidos continuam a liderar em pesquisa biomédica e translacional, a China está rapidamente fechando a lacuna. Instituições como a Shanghai Jiao Tong University e a Academia Chinesa de Ciências estão fazendo incursões significativas em biotecnologia, genética e ciências farmacêuticas, campos tradicionalmente dominados por universidades ocidentais. O contraste na ênfase da pesquisa — o foco da China em engenharia e ciências aplicadas versus a força do Ocidente em pesquisa médica — ilustra como diferentes regiões estão se posicionando para a futura supremacia tecnológica.
A transformação da China em uma potência de pesquisa não aconteceu por acaso. É o resultado de decisões políticas deliberadas, investimento financeiro substancial e reformas sistêmicas destinadas a melhorar a qualidade acadêmica. De acordo com o National Bureau of Statistics da China, os gastos com pesquisa e desenvolvimento (P&D) do país atingiram uma alta histórica de 3,61 trilhões de yuans (aproximadamente US$ 500 bilhões) em 2024. Isso representa um aumento de 8,3% ano a ano e responde por 2,68% do PIB da China, uma porcentagem que continua a aumentar de forma constante. Ao contrário do passado, onde o financiamento da pesquisa era distribuído de forma esparsa entre muitos projetos, o governo chinês adotou uma abordagem mais estratégica, canalizando recursos para áreas-chave como inteligência artificial, ciência dos materiais e exploração espacial.
Uma das mudanças políticas mais notáveis foi o afastamento das métricas de avaliação baseadas em publicação. Anteriormente, os acadêmicos chineses eram incentivados a publicar o máximo de artigos possível, muitas vezes em detrimento da qualidade. No entanto, reformas recentes introduziram um sistema de revisão por pares mais rigoroso que prioriza pesquisas impactantes e inovadoras em vez de volume. Essa mudança resultou em uma melhoria significativa na credibilidade e influência global da produção científica chinesa.
Outro fator crucial no ressurgimento acadêmico da China tem sido suas estratégias agressivas de aquisição de talentos. O “Programa Mil Talentos”, lançado em 2008, atraiu com sucesso milhares de pesquisadores chineses e estrangeiros de ponta para as principais universidades do país. Ao oferecer salários competitivos, instalações de pesquisa de última geração e financiamento substancial, a China reverteu o fenômeno de longa data da “fuga de cérebros” e criou um ambiente onde pesquisadores de primeira linha podem prosperar.
Além disso, as universidades receberam maior autonomia nas decisões de contratação, desenvolvimento de currículo e colaborações internacionais. Essa descentralização permitiu que as instituições fossem mais dinâmicas e responsivas às tendências científicas globais, acelerando ainda mais a ascensão da China como uma superpotência acadêmica. A crescente influência da China na academia não é meramente uma conquista intelectual; ela tem ramificações geopolíticas significativas. Os avanços do país em áreas como computação quântica, inteligência artificial e biotecnologia levantaram preocupações no Ocidente, particularmente nos Estados Unidos, onde os formuladores de políticas veem a ascensão científica da China como um desafio à supremacia tecnológica americana.
Em resposta, Washington implementou uma série de políticas restritivas, incluindo controles de exportação de tecnologia avançada de semicondutores e limitações de visto para pesquisadores chineses. No entanto, em vez de sufocar o progresso da China, essas medidas apenas intensificaram o impulso do país para a autossuficiência. A recente revelação do modelo DeepSeek R1 AI, que rivaliza com o GPT-4 da OpenAI, apesar de ser desenvolvido com chips nacionais, é uma prova da capacidade da China de inovar sob pressão.
Além disso, as colaborações de pesquisa da China estão se estendendo além do Ocidente. Cada vez mais, as instituições chinesas estão formando parcerias com universidades na África, América Latina e Oriente Médio, fomentando uma nova ordem acadêmica que desafia o modelo tradicional centrado no Ocidente de intercâmbio científico. Essa mudança não está apenas fortalecendo a influência da China em mercados emergentes, mas também remodelando o cenário global de pesquisa de maneiras que eram inimagináveis há apenas uma década.
À medida que a China continua a consolidar sua posição como líder em pesquisa acadêmica, surgem questões sobre o futuro equilíbrio de poder na ciência global. Os Estados Unidos e a Europa serão capazes de recuperar seu antigo domínio ou terão que se adaptar a um mundo acadêmico multipolar onde a China desempenha um papel central? Embora as instituições ocidentais ainda liderem em muitas áreas, a rápida ascensão da China demonstra que a excelência científica não está mais confinada a um punhado de universidades de elite nos Estados Unidos e na Europa. A mudança não é apenas sobre números. É sobre influência, inovação e a capacidade de definir a agenda para o futuro da ciência e da tecnologia.
Isto apareceu pela primeira vez no FPIF.
Imran Khalid é um analista geoestratégico e colunista de assuntos internacionais. Seu trabalho foi amplamente publicado por prestigiosas organizações e publicações de notícias internacionais.

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