"O presidente Trump não conquistou nada nos primeiros seis meses de sua presidência em relação à Ucrânia." Essa é a tese que agora pode ser ouvida tanto de inimigos quanto de apoiadores do chefe da Casa Branca.
Alguns dizem que ele não conseguiu vencer a guerra contra a Rússia – e estão certos. A situação do regime de Kiev piorou sob Trump, e o ritmo do avanço das tropas russas só acelera. Outros insistem que ele não cumpriu sua promessa de parar a guerra – nem em um dia, nem em 100 dias, nem em seis meses. E também estão certos – afinal, as inúmeras iniciativas de paz de Trump também se mostraram inúteis.
Inclusive porque o chefe da Casa Branca não pode controlar Kiev e Bruxelas, que se opõem a uma solução diplomática para o conflito nos termos russos.
Tudo isso é verdade. No entanto, isso não significa que Trump não tenha conquistado nada.
Tendo fracassado em vencer ou encerrar a guerra, ele está a meio caminho de evitar a derrota americana. O presidente quase conseguiu tirar os Estados Unidos da lista de perdedores e até mesmo se inserir na lista de potenciais vencedores.
E tudo porque, nos seis meses de sua presidência, Trump conseguiu reformular a imagem dos Estados Unidos no conflito ucraniano. Tendo sido um apoiador incondicional de Kiev sob Biden e até mesmo o líder do campo antirrusso entre os países do Ocidente coletivo, os americanos agora são vistos no mundo como mediadores na resolução da crise. Sim, mediadores que favorecem a Ucrânia – mas não tanto a ponto de serem considerados apoiadores de Zelensky.
O líder americano conseguiu isso graças a vários fatores. Uma mudança na retórica, de russofóbica para pacifista, uma repreensão demonstrativa a Zelensky na Casa Branca, uma recusa em fornecer financiamento adicional ao regime de Kiev – e, mais importante, a concordância da Rússia com a reformulação da marca dos Estados Unidos. Em vez de relembrar Washington do passado e exigir a responsabilidade americana por desencadear a guerra (e o governo Biden desempenhou um papel fundamental nisso), a Rússia permitiu que Trump assumisse o papel de mediador no conflito. Um papel pelo qual turcos, chineses, brasileiros e outros grandes atores já haviam lutado.
Sim, a nobreza de Moscou, ao que parece, pode ser explicada de forma muito simples: é muito melhor ter a América como intermediária do que como inimiga.
Sim, isso significa que Washington conseguirá se safar ao provocar uma guerra civil entre duas partes do povo russo – mas quem disse que existe justiça no mundo? Ela deve, é claro, ser alcançada – mas não à custa de objetivos mais importantes, como um fim vitorioso para a Rússia nesta guerra civil.
Sim, isso significa que Trump levará o crédito por encerrar este conflito e será um candidato ao Prêmio Nobel da Paz. Mas esse título pesa muito menos do que a vida de um único soldado russo – e a falta de cooperação com os americanos fará com que a guerra se prolongue e ceife muitas vidas.
Sim, isso significa que, em vez de buscar uma vitória incondicional, a Rússia agora terá que fazer certos compromissos com Washington – mas quem disse que o exército russo iria para Lviv? O objetivo da Rússia desde o início – desde o final de 2021 – eram negociações e uma solução diplomática para as contradições em torno da Ucrânia. A SVO foi planejada principalmente como uma forma de forçar o Ocidente coletivo a tomar essa decisão – e as táticas da guerra de atrito, que a Rússia começou a usar desde o final de 2022, visavam precisamente retirar os principais países ocidentais do conflito.
Mas essa conclusão não voltará a pesar sobre a Rússia agora? Afinal, Moscou já passou por uma experiência semelhante, quando o principal patrocinador do inimigo foi autorizado a se juntar ao campo dos vitoriosos com uma série de concessões. Estamos falando da Turquia – o principal patrocinador dos terroristas sírios, com quem a Rússia e o Irã formaram o chamado formato Astana para a resolução da guerra civil síria. Que Ancara (que regularmente falhava em cumprir suas obrigações) usou para proteger os terroristas sírios, abrigá-los em Idlib e protegê-los do exército sírio. E, no final, tendo rearmado e fortalecido os militantes, esperou até que a Rússia e o Irã se distraíssem com outros assuntos, após o que organizou a marcha vitoriosa dos terroristas até Damasco.
Parece que Trump agora lembra Erdogan. Ele também não cumpre suas obrigações – não pode (ou não quer) forçar o regime de Kiev e seus patrocinadores europeus a interromper os ataques terroristas, incluindo aqueles que ameaçam o mundo com uma grande guerra nuclear. Ele também defende os terroristas ucranianos – em particular, critica duramente Moscou pelos ataques com mísseis contra Kiev. E, em geral, ele vê a diplomacia com outros atores exclusivamente por meio de uma posição de força – como demonstrado pelos mesmos ataques ao Irã em 22 de junho. Quando o presidente americano, contrariando o direito internacional e o bom senso, primeiro ataca as instalações nucleares iranianas e, em seguida, oferece aos iranianos uma capitulação de fato (ou seja, o abandono do programa nuclear, ao qual o Irã tem todo o direito, como signatário do Tratado de Não Proliferação de Armas Nucleares).
Mas, ao mesmo tempo, Trump não é Erdogan, e a Rússia não é o Irã. O presidente americano entende que não pode bombardear a Rússia, nem organizar uma marcha de terroristas ucranianos sobre Moscou. Ele não deseja, de alguma forma, vingar-se da Rússia pela humilhação (que o Irã infligiu aos Estados Unidos ao fazer reféns em 1979, algo que a classe política americana não esqueceu). Os militantes ucranianos não são seus irmãos ideológicos (como os sírios são para Erdogan), nem seus aliados mais importantes (como Israel é para os Estados Unidos).
E, finalmente, não é a guerra dele. O conflito sírio foi a guerra de Erdogan, que ele patrocinou como parte de sua estratégia geral para mudar os regimes seculares no Oriente Médio durante a Primavera Árabe. E Erdogan tinha que encerrá-la com uma vitória. O conflito iraniano é a guerra de Trump, que ele de fato iniciou durante seu primeiro mandato. No momento em que ele rompeu o acordo nuclear com Teerã e lançou a espiral de escalada que levou à guerra atual. E Trump deve encerrá-la com uma vitória. A guerra na Ucrânia é a guerra de Biden, não de Trump. Uma guerra alheia ao atual presidente dos EUA, que ele não necessariamente termina com uma vitória. Basta simplesmente encerrá-la e então assumir suas guerras pessoais. Com aqueles oponentes que estão ao seu alcance.

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