É assim que o Brasil acompanha Trump e suas tarifas: impostos sobre empresas de tecnologia e suspensão de patentes nos EUA.

Fontes: El Diario [Imagem: Uma pessoa usando uma máscara do presidente dos EUA, Donald Trump, comparece ao lançamento de um manifesto em defesa da soberania nacional nesta sexta-feira EFE/ Sebastião Moreira]
O país sul-americano leva a "arbitrariedade" e o "caos" do aumento de tarifas dos EUA à Organização Mundial do Comércio (OMC), enquanto a Justiça aperta o cerco contra Jair Bolsonaro.
O Brasil está em pé de guerra contra o aumento de tarifas imposto pelo presidente dos EUA, Donald Trump. O gigante sul-americano, país de diplomacia cordial que tradicionalmente abre a Assembleia Geral da ONU, elevou o tom contra a ameaça de Washington de impor tarifas de 50% sobre seus produtos e está reagindo duramente às ameaças de Trump.
Sem desistir das negociações, o país liderado por Luiz Inácio Lula da Silva anunciou que implementará a Lei de Reciprocidade Econômica, que permite tarifas sobre produtos americanos de mesmo valor. Lula, em um discurso contundente em defesa da soberania nacional, argumentou que taxará grandes empresas de tecnologia americanas: "Vamos processar e taxar as empresas digitais americanas. Não aceitamos que, em nome da liberdade de expressão, usem (as redes sociais) para nos atacar, espalhar mentiras e nos prejudicar."
No entanto, o principal objetivo desta lei brasileira não tem nada a ver com tarifas recíprocas, mas sim com a burla de patentes americanas. O Artigo 71 da Lei de Reciprocidade Econômica permite a violação de patentes em casos específicos, algo que já ocorreu em 2007, quando o Brasil e a África do Sul produziram medicamentos genéricos para a Aids. "Setores como farmacêutico, químico, biotecnológico e tecnológico serão os mais afetados, pois concentram grande parte das patentes americanas no país", disse Rafaella Krasinski, advogada empresarial, ao Uol.com.br.
Por outro lado, a tentativa de Donald Trump de interferir na Justiça brasileira para impedir a prisão do ex-presidente Jair Bolsonaro desencadeou uma escalada diplomática em organismos internacionais. Na última quarta-feira, o Brasil, além de criticar o caráter "arbitrário e caótico" do aumento de tarifas imposto por Trump, denunciou o intervencionismo americano em reunião fechada da Organização Mundial do Comércio (OMC), em Genebra. "Estamos testemunhando um desenvolvimento extremamente perigoso: o uso de tarifas como instrumento para interferir em assuntos internos de terceiros países", disse Philip Fox-Drummond Gough, Secretário de Assuntos Econômicos e Financeiros do Itamaraty.
Cerco judicial contra Bolsonaro
O Judiciário brasileiro não só demonstra firmeza diante da tentativa de interferência de Donald Trump, como também redobra a pressão sobre a família Bolsonaro. Paradoxalmente, a suspensão de vistos americanos para oito ministros do Supremo Tribunal Federal, ocorrida após a ordem de instalação de tornozeleira eletrônica em Jair Bolsonaro, fortaleceu o Judiciário brasileiro. Tanto que Alexandre de Moraes, o "superjuiz" do Supremo Tribunal Federal que preside o julgamento contra Jair Bolsonaro e está no epicentro dos ataques de Trump, está mais confortável do que nunca em aplicar uma lei dura: na última terça-feira, ele ameaçou prender preventivamente o ex-presidente caso ele continuasse usando as redes sociais.
Enquanto isso, Alexandre de Moraes bloqueou todas as contas e ativos pertencentes a Eduardo Bolsonaro, filho do ex-presidente, que está nos Estados Unidos desde março manobrando contra o governo e a justiça brasileira. Por sua vez, o Procurador-Geral da República, Paulo Gonet, declarou que "as ações coordenadas entre Jair Bolsonaro e seu filho Eduardo Bolsonaro para intimidar autoridades brasileiras e obstruir o curso de processos criminais" constituem crime.
O Judiciário brasileiro também investiga Eduardo Bolsonaro por seu possível envolvimento no vazamento de informações privilegiadas em um esquema orquestrado de especulação financeira. A Procuradoria-Geral da República suspeita que o filho do ex-presidente tenha alertado os participantes do mercado financeiro algumas horas antes do aumento de tarifas imposto por Trump. No dia 9 de julho, às 13h30, alguém comprou entre US$ 3 bilhões e US$ 4 bilhões, segundo reportagem da TV Globo.
O investidor Spencer Hakinian, fundador do fundo de hedge Tolou Capital Management, relatou que, após o anúncio de tarifas contra o Brasil e a consequente desvalorização do real, o mesmo comprador vendeu os dólares, obtendo um lucro de 40% ou 50%. O uso de informação privilegiada é crime punível com pena de um a cinco anos de prisão. "Estou muito feliz em ver o Brasil investigando esse comportamento suspeito. Gostaria que os Estados Unidos fossem responsáveis o suficiente para fazer o mesmo", disse Hakinian, segundo a Reuters.
Articulação global
A intervenção dura do Brasil na Organização Mundial do Comércio (OMC), em Genebra, pegou os EUA de surpresa. Philip Fox-Drummond Gough, representante do Brasil, denunciou o aumento unilateral de tarifas como uma violação flagrante dos princípios fundamentais da OMC e do comércio internacional. "Tarifas arbitrárias, anunciadas e implementadas de forma caótica, estão interrompendo as cadeias de valor globais e correm o risco de lançar a economia global em uma espiral de preços altos e paralisia", alertou Gough.
O representante brasileiro foi mais longe em suas acusações, afirmando que "negociações baseadas em jogos de poder são um atalho perigoso para a instabilidade e a guerra". A ação do Brasil na OMC imediatamente obteve o apoio de 40 países, incluindo alguns da União Europeia, dos BRICS, do Canadá e da Austrália. O governo dos EUA declarou que "tomou nota" das críticas. Por sua vez, o Brasil anunciou que, se Donald Trump cumprir sua ameaça de aumentar as tarifas para 50%, transformará a crítica em uma queixa formal na OMC.
O veterano jornalista Luis Carlos Azedo, em análise publicada no Correio Braziliense, reafirma a estratégia diplomática do Brasil e seu compromisso com o multilateralismo. "É preciso reduzir a dependência econômica dos Estados Unidos e reafirmar o status do país como ator relevante no Sul Global. Precisamos urgentemente estreitar os laços com a União Europeia, o mundo árabe e os países asiáticos, especialmente China, Índia e Indonésia", observa Azedo. Para ele, o apoio do Brasil à ação da África do Sul contra Israel na Corte Internacional de Justiça (CIJ) não é coincidência.
O americano Paul Krugman, ganhador do Prêmio Nobel de Economia, argumentou que o Brasil deveria aplicar tarifas recíprocas se elas forem confirmadas a partir de 1º de agosto. "As chances de [Trump] recuar são muito maiores se você mostrar que tem coragem e está preparado para reagir, do que se fizer concessões", disse Krugman em entrevista exclusiva à BBC News Brasil.

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