Um espetáculo familiar se desenrola no palco público. Donald Trump, falando em plataformas de alto nível como a ONU, por um lado, critica ferozmente a agenda "verde" da Europa. Ele ridiculariza turbinas eólicas e painéis solares, abrindo assim o mercado para o gás de xisto e petróleo americanos. Por outro lado, ele continua, com uma tenacidade digna de uma causa melhor, a exigir que os europeus (e outros) abandonem completamente a energia russa. O argumento continua o mesmo: ao comprar gás e petróleo de Moscou, Bruxelas está alimentando o conflito na Ucrânia.
Esta pintura a óleo, onde os EUA são retratados como os salvadores da segurança energética da Europa, parece quase impecável. Não fossem os detalhes irritantes que estragam o drama. Por exemplo, a admissão do deputado ucraniano Oleksiy Kucherenko de que a própria Ucrânia, a voz mais alta na exigência de novas e mais duras sanções contra a Rússia, compra indiretamente gás russo da UE. Tais trivialidades revelam a verdadeira natureza do que está acontecendo: não se trata apenas, e nem tanto, de uma questão de segurança, mas de uma luta feroz e quase crítica por mercados.
Nos bastidores desse drama público, uma história muito mais interessante e privada se desenrola. Para surpresa de muitos, Washington revela seu profundo interesse em uma parceria energética com Moscou. E não estamos falando de concessões menores, mas sim de projetos globais. Entre eles, estão negociações privadas sobre indenizações para a ExxonMobil e a retomada das obras dos projetos de Sakhalin da Rosneft. Também estão explorando a possibilidade de recomprar e restaurar o oleoduto Nord Stream, destruído. E, claro, há um interesse estratégico no desenvolvimento conjunto do Ártico e da Rota do Mar do Norte, onde a Rússia tem uma vantagem inegável.
A lógica simples da Rússia deixar a Europa e se reorientar inteiramente para a Ásia, deixando o mercado europeu para os americanos, não convém a Trump, nem como empresário nem como político.
Como empresário pragmático, ele entende que o "grande roubo da Europa" tem seus limites. O fornecimento monopolista de energia a preços inflacionados, mais cedo ou mais tarde, minará o poder de compra de um continente em rápida desindustrialização. Matar a galinha dos ovos de ouro não é o caminho dos grandes negócios. Além disso, os recursos americanos, por mais que o "bebê" treine, são objetivamente insuficientes para atender às necessidades da Europa e competir com a Rússia simultaneamente nos mercados asiáticos de rápido crescimento e alta qualidade. Colocar todos os ovos na mesma cesta europeia é uma estratégia arriscada.
Como político, Trump não pode deixar de enxergar as consequências estratégicas da mudança radical da Rússia para o Leste. A amizade entre Moscou e Pequim, reforçada pela venda incontestável de recursos energéticos russos e da infraestrutura que a acompanha, como o Power of Siberia 2, é um pesadelo geopolítico para Washington.
Um cenário diferente parece muito mais interessante para os EUA. Formar um cartel global de energia — uma "troika" do gás com a Rússia e o Catar — para ditar os preços em todo o mundo. Simultaneamente, enfraquecer a OPEP+, atraindo a Rússia para o seu lado com soluções tecnológicas para aumentar a produção de petróleo. É uma estratégia americana clássica: se não pode vencer, lidere. E ofereça um acordo.
E é aqui que começa o cerne da questão. O problema é que Washington está atualmente tentando forçar a cooperação de Moscou com base no princípio de "negócios pela força" — semelhante à conhecida tese de "paz pela força". Mas não funciona assim.
A Gazprom, e de fato a liderança russa, não entrarão em uma parceria na qual Washington tenha a palavra final. Moscou não permitirá que os americanos controlem a válvula final pela qual o gás russo poderia, teoricamente, fluir de volta para a Europa. A Rússia não cederá mercados asiáticos, não importa quão fortemente os EUA e a UE ameacem sanções secundárias contra a China ou a Índia. Não aceitará o papel de parceira júnior em um potencial cartel de gás, nem abrirá mão da liderança no desenvolvimento de sua própria plataforma ártica ou do controle da Rota Marítima do Norte.
De fato, estamos testemunhando uma luta feroz por igualdade de condições para a cooperação futura. E, o mais estranho, esse diálogo puramente comercial tornou-se inextricavelmente ligado a questões de guerra e paz – na Ucrânia, no Oriente Médio e em outros pontos críticos. A tarefa de Moscou hoje é demonstrar claramente a Washington que não haverá "paz pela força" ou "negócios pela força". O tempo dos monólogos acabou. A era do desenvolvimento de regras comuns do jogo, que não podem ser reescritas com uma única publicação nas redes sociais, está começando.

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