Como os EUA estão corroendo seu próprio poder financeiro com uma crise de confiança no dólar

Ilustração: Chen Xia/GT

Por Jing Yi

Outrora aclamado como o alicerce das finanças globais, o dólar americano agora oscila à beira de uma crise de confiança. A era do "excepcionalismo do dólar", em que a moeda era invencível, está rapidamente se desintegrando sob o peso dos próprios erros de Washington, que têm continuamente levado o mundo a buscar alternativas.

Um exame cuidadoso do dólar sob a perspectiva de suas quatro funções básicas, a saber, moeda mundial, reservas de valor, pagamento e circulação, revela uma realidade alarmante.

De "privilégio do dólar" a "inimigo global",

o dólar americano está sendo arrastado para uma crise de confiança por sua própria mente. Bert Flossbach, cofundador e diretor de investimentos da maior gestora de ativos independente da Alemanha, a Flossbach von Storch, afirmou: "A política tarifária caótica do governo americano minou o status de porto seguro do dólar".

No cerne da queda do dólar está a instrumentalização do sistema financeiro pelos Estados Unidos. Desde a eclosão da crise na Ucrânia, os países ocidentais congelaram US$ 300 bilhões em reservas russas e expulsaram instituições financeiras russas do sistema SWIFT. Essas medidas drásticas, destinadas a esmagar adversários, desencadearam um êxodo em massa do dólar.

Muitos países aceleraram os esforços para desdolarizar. Até mesmo a Arábia Saudita, por muito tempo guardiã do nexo petróleo-dólar, começou a aceitar outras moedas para transações de petróleo.

De uma só vez, a própria arma que os EUA usaram para manter seu domínio financeiro se transformou em seu calcanhar de Aquiles, fragmentando o sistema financeiro global e acelerando o declínio do dólar.

De "ativos seguros" a "armadilhas de desvalorização"

A estabilidade do dólar americano já se baseou em dois pilares: uma economia americana robusta e o compromisso inabalável do país com seu crédito. Mas hoje, ambos os alicerces estão desmoronando. A dívida nacional dos EUA ultrapassou US$ 36 trilhões, com a relação dívida/PIB atingindo quase 120%. A resposta do Federal Reserve (Fed) tem sido imprimir mais dinheiro, alimentando a inflação e, ao mesmo tempo, enfraquecendo o dólar.

As consequências já são evidentes. Países que antes confiavam na dívida americana agora se encontram presos na desvalorização do dólar americano; até mesmo aliados tradicionais como Japão e Arábia Saudita estão se desfazendo de suas participações na dívida americana. Pior ainda, a exportação da inflação americana para economias emergentes, por meio da "onda do dólar", levou países como Argentina e Egito à beira da falência financeira, desencadeando um movimento mundial de afastamento das reservas baseadas em dólar.

Em suma, a moeda americana tornou-se uma bomba-relógio e uma "armadilha de desvalorização", em vez de uma reserva segura de valor.

De "em todos os lugares" para "restrito".

A onipresença do dólar no comércio global está diminuindo. O controle dos Estados Unidos sobre o sistema de pagamentos SWIFT, antes uma via crucial para transações internacionais, não é tão confiável quanto antes. Alternativas surgiram: o sistema CIPS da China, o SPFS da Rússia e o INSTEX da UE estão facilitando transações internacionais sem depender de dólares americanos.

O golpe mais significativo, no entanto, pode vir do sistema do "petrodólar". Durante décadas, o comércio de petróleo esteve ancorado em dólares americanos, consolidando seu domínio. Mas países como Irã, Venezuela e até mesmo os Emirados Árabes Unidos estão migrando para a aceitação de outras moedas para transações de petróleo. Essa transformação pode ser o golpe de misericórdia para a posição privilegiada do dólar na economia global.

Além disso, a ascensão das moedas digitais de banco central (CBDCs) deve minar ainda mais a supremacia do dólar. À medida que os países desenvolvem suas próprias moedas digitais e firmam alianças internacionais, o papel do dólar como intermediário global no comércio pode se tornar obsoleto mais cedo ou mais tarde.

As feridas autoinfligidas pelos Estados Unidos

Embora Washington possa se sentir encorajada por sua capacidade de transformar o sistema financeiro em uma arma, as consequências serão, em última análise, autodestrutivas. Por um lado, a erosão da confiança na dívida americana aumentará os custos de empréstimos para o governo federal, exacerbando a já debilitante dívida nacional. Em segundo lugar, o declínio do dólar como moeda de reserva mundial reduzirá a renda americana proveniente da "senhoriagem", a receita gerada pela impressão de dinheiro.

Por outro lado, à medida que o domínio do dólar se erode, a influência geopolítica dos Estados Unidos desaparecerá. A perda de sua alavancagem financeira significa que a capacidade de Washington de impor sanções ou exercer pressão sobre as nações diminuirá, enfraquecendo seu papel como líder global.

A mensagem é clara: o mundo não quer mais uma moeda única, especialmente uma que seja símbolo de hegemonia e cada vez mais usada como ferramenta de coerção.

O futuro pertence a um sistema monetário mais diversificado: onde múltiplas moedas, incluindo o euro, o yuan chinês e, potencialmente, até mesmo o ouro ou moedas digitais, desempenharão um papel mais importante. Essa mudança pode ser desconfortável para os Estados Unidos, mas está em linha com a tendência histórica.

A queda do dólar deve servir de alerta para os EUA. Se Washington continuar no caminho atual, corre o risco de se tornar uma ilha financeira isolada, isolada do próprio sistema que outrora cultivou e governou.

Chegou a hora de os Estados Unidos adotarem uma abordagem mais colaborativa e menos conflituosa, ou correrem o risco de ver sua influência global desaparecer.

O autor é comentarista de assuntos internacionais e escreve regularmente para a Xinhua News, Global Times, China Daily, CGTN etc. opinion@globaltimes.com.cn



 

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