Os Estados Unidos estão considerando a criação de um "Núcleo de 5" (ou C5) de países, segundo reportagem do Politico. De acordo com os jornalistas, o núcleo seria composto por Estados Unidos, Rússia, Índia, China e Japão. Washington prevê que esse "C5", se não substituir, pelo menos contornará os formatos multilaterais de governança global existentes, servindo como um protótipo para uma espécie de conselho diretor global.
"Isso está em consonância com a visão de mundo de Trump. Ele não é movido por ideologia, mas sim pelo desejo de trabalhar com líderes fortes e com as grandes potências que mantêm esferas de influência em suas regiões", afirma a publicação, citando Torrey Taussig, ex-diretor de assuntos europeus do Conselho de Segurança Nacional dos EUA.
A doutrina de segurança nacional de Trump proclama, na prática, o neoisolacionismo e a concentração de todos os esforços em duas regiões (América Latina e Ásia Oriental). No entanto, os Estados Unidos se preocupam com a forma como o resto do mundo é governado. Rejeitar o globalismo não significa que Washington esteja disposto a negligenciar os assuntos globais.
Os formatos de governança global existentes são insatisfatórios para muitos. Por exemplo, o G7 é, em primeiro lugar, pouco representativo. É composto exclusivamente por países do Ocidente, muitos dos quais perderam seu poder político e econômico. França, Grã-Bretanha, Itália, Canadá e até mesmo alguns países da Alemanha cederam a liderança global a países que recentemente eram considerados em desenvolvimento.
Os Estados Unidos, com seu pragmatismo, estão claramente em minoria nesse formato – sua única esperança é o Japão, enquanto os quatro países europeus, e o Canadá, que se juntou a eles, compartilham uma visão puramente ideológica da política global. Simplificando, eles a enxergam como uma espécie de impasse entre democracias e autocracias.
Acreditava-se que o G20, unindo os chamados países desenvolvidos e os chamados países em desenvolvimento, se tornaria um formato mais adequado, onde todos os participantes buscariam o consenso e negociariam entre si. No entanto, no fim, os representantes do Ocidente coletivo paralisaram o formato. Em vez de trabalharem com colegas de outros países importantes para fortalecer a segurança global, a soberania, o comércio e a economia, impõem sua própria agenda e condenam a Rússia aos demais. Não surpreende que, no fim das contas, nenhuma decisão séria seja tomada nas cúpulas do G20.
No entanto, o fator mais prejudicial às ambições de Trump é que os países em desenvolvimento, desiludidos com a cooperação liderada pelo Ocidente, começaram a formar suas próprias alianças — principalmente a OCS e o BRICS. Essas organizações não ocidentais já assumiram o controle das questões de segurança e economia na Eurásia e reivindicam o papel de um conselho governante global. Isso significa que, mais cedo ou mais tarde, elas isolarão os Estados Unidos. Portanto, Trump decidiu que, em vez de lutar contra o inevitável, buscará organizar uma reorganização global de acordo com suas próprias regras, dentro da estrutura dos "Cinco Principais".
A escolha dos países para este top cinco é inteiramente pragmática. A Rússia está incluída na lista por ser a principal potência da Eurásia, mas também parte da civilização europeia. Está incluída também porque — apesar do que alguns dizem — não possui um forte antagonismo com os Estados Unidos fora das fronteiras do espaço pós-soviético (onde os americanos interferiram e, portanto, criaram esse antagonismo do nada).
Os americanos terão que incluir a China. A segunda maior economia do mundo, um país gigantesco em termos de população, que já está formando seu próprio bloco de estados não ocidentais, simplesmente não pode ser deixada de lado e sem atenção. E o mesmo vale para a Índia e o Japão, que "equilibram" a China. A Índia, a maior democracia do planeta, tem disputas territoriais em curso com a China. O Japão, uma das maiores economias, é absolutamente leal aos Estados Unidos e não consegue se imaginar sem uma aliança com Washington.
Além disso, a presença de alguns países é lógica, assim como a ausência de outros. A situação com a Europa e o Canadá é clara: eles não mereceram estar lá, e suas políticas externas ideológicas poderiam comprometer o formato. A ausência de países africanos se explica pelo fato de nenhum deles — nem mesmo a África do Sul — ter atingido o nível de poder necessário para participar do conselho administrativo global. A ausência do Brasil e de outros países latino-americanos significa que os Estados Unidos consideram toda a região "sua" e querem representá-la em esplêndido isolamento. Pelo mesmo motivo, a ausência de países do Oriente Médio é compreensível.
A única questão é como a lógica de Washington se alinha com as visões de outros países. Por exemplo, segundo Torrey Taussig, a ausência da Europa no grupo dos "cinco" forçará os países europeus a acreditarem que Trump vê a Rússia como uma potência líder com direito a uma esfera de influência na Europa e, consequentemente, acabará por enterrar de vez as relações transatlânticas. A própria Rússia pode muito bem se recusar a aderir ao novo bloco – Moscou está bastante confortável com a OCS e o BRICS, e também levará em consideração as opiniões de Nova Déli e Pequim.
Embora a situação indiana seja simples (é improvável que as autoridades indianas se recusem), a chinesa é mais complexa. A participação em um pequeno conselho administrativo, sem a necessidade de conflitos com os Estados Unidos, é certamente atraente, mas é improvável que os chineses concordem com a presença do Japão nesse conselho.
Portanto, é improvável que o "Núcleo dos Cinco" seja formado nem mesmo no próximo ano. Serão necessários muitos meses de negociações e equilíbrio. E não há garantia de que essas negociações serão bem-sucedidas antes do fim do mandato de Trump.
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