A dor de Paulo Pavesi
por Leandro
Fortes, em CartaCapital
Sozinho, escondido em
Londres, na Inglaterra, depois de ter conseguido asilo humanitário na Itália,
em 2008, o analista de sistemas Paulo Pavesi se transformou no exército de um
só homem contra a impunidade dos médicos-monstros que, em 2000, assassinaram seu
filho para lhe retirar os rins, o fígado e as córneas.
Paulo Veronesi
Pavesi, então com 10 anos de idade, caiu de um brinquedo no prédio onde morava,
e foi levado para a Irmandade Santa Casa de Poços de Caldas, no sul de Minas,
onde foi atendido pelo médico Alvaro Inhaez que, como se descobriu mais tarde,
era o chefe de uma central clandestina de retirada de órgãos humanos disfarçada
de ONG, a MG Sul Transplantes. Paulinho foi sedado e teve os órgãos retirados
quando ainda estava vivo, no melhor estilo do médico nazista Josef Mengele.
Na edição desta
semana de CartaCapital, publiquei uma reportagem sobre o
envolvimento do deputado estadual Carlos Mosconi (PSDB) com a chamada “Máfia
dos Transplantes” da Irmandade Santa Casa de Poços de Caldas.
Mosconi, eleito no
início do ano, pela quarta vez consecutiva, presidente da Comissão de Saúde (!)
da Assembleia Legislativa de Minas Gerais, foi assessor especial do senador
Aécio Neves (PSDB-MG), quando este era governador do estado. Aécio o nomeou, em
2003, presidente da Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais (FHEMG), à
qual a MG Sul Transplantes, idealizada por Mosconi e outros quatro médicos
ligados á máfia dos transplantes, era subordinada.
As poucas notícias
que são veiculadas sobre o caso, à exceção da matéria de minha autoria
publicada esta semana, jamais citam o nome de Carlos Mosconi. Em Minas Gerais,
como se sabe, a imprensa é controlada pela mão de ferro do PSDB. Nada se
noticia de ruim sobre os tucanos, nem quando se trata de assassinato a sangue frio
de uma criança de 10 anos que teve as córneas arrancadas quando ainda vivia
para que fossem vendidas, no mercado negro, por 1,2 mil reais. Nada.
Esse silêncio, aliado
à leniência da polícia e do judiciário mineiro, é fonte permanente da dor de
Paulo Pavesi. Mas Pavesi não se cala. De seu exílio inglês, ele nos lembra,
todos os dias, que somos uma sociedade arcaica e perversa ao ponto de proteger
assassinos por questões políticas paroquiais.
Como sempre, a velha
mídia nacional, sem falar na amordaçada mídia mineira, não deu repercussão
alguma à CartaCapital, como se isso tivesse alguma importância
nesses tempos de blogosfera e redes sociais.
Pela internet, o
Brasil e o mundo foram apresentados ao juiz Narciso Alvarenga de Castro, da 1ª
Vara Criminal de Poços de Caldas. Em de 19 de fevereiro desse ano, ele condenou
quatro médicos-monstros envolvidos na máfia: João Alberto Brandão, Celso Scafi,
Cláudio Fernandes e Alexandre Zincone. Eles foram condenados pela morte de um
trabalhador rural, João Domingos de Carvalho.
Internado por sete
dias na enfermaria da Santa Casa, entre 11 e 17 de abril de 2001, Carvalho,
assim como Paulinho, foi dado como morto quando estava sedado e teve os rins,
as córneas e o fígado retirados por Cláudio Fernandes e Celso Scafi. Outros
sete casos semelhantes foram levantados pela Polícia Federal na Santa Casa.
Todos os condenados
são ligados à MG Sul Transplantes. Scafi, além de tudo, era sócio de Mosconi em
uma clínica de Poços de Caldas, base eleitoral do deputado. A quadrilha realizava
os transplantes na Santa Casa, o que garantia, além do dinheiro tomado dos
beneficiários da lista, recursos do SUS para o hospital. O delegado Célio
Jacinto, responsável pelas investigações da PF, revelou a existência de uma
carta do parlamentar na qual ele solicita ao amigo Ianhez o fornecimento de um
rim para atender ao pedido do prefeito de Campanha (MG). A carta, disse o
delegado, foi apreendida entre os documentos de Ianhez, mas desapareceu
misteriosamente do inquérito sob custódia do Ministério Público Estadual de
Minas Gerais.
Ontem, veio o troco.
A Câmara Criminal do
Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) suspendeu as audiências que
aconteceriam de hoje, 17 de abril, até sexta-feira, 19 de abril, para se
iniciar, finalmente, o julgamento do caso de Paulinho. Neste processo, estão
sendo julgados, novamente, Cláudio Fernandes e Celso Scafi, além de outros
acusado, Sérgio Poli Gaspar.
De acordo com a
assessoria do TJMG, o cancelamento se deu por conta de uma medida de “exceção
de suspeição” contra o juiz Narciso de Castro impetrada pelo escritório Kalil e
Horta Advogados, que defende Fernandes e Scafi. A defesa da dupla, já condenada
a penas de 8 a 11 anos de cadeia, argumenta que o juiz teria perdido a
“necessária isenção e imparcialidade” para apreciar o Caso Pavesi.
Ou seja, querem
trocar o juiz, justo agora que o nome do deputado Carlos Mosconi veio à tona.
Eu, sinceramente,
ainda espero que haja juízes – e jornalistas – em Minas Gerais para denunciar
esse acinte à humanidade de Paulo Pavesi que, no fim das contas, é a humanidade
de todos nós.
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