Estamos testemunhando
uma atualização dos mecanismos, métodos e modos de intervenção. Toda
harmonização neste momento é totalmente ilusória.
Comunidad Saker
Latinoamérica / http://cartamaior.com.br/
É certo que um passo de
peso foi dado pelos governos de Cuba e dos Estados Unidos, se admitirmos, em
primeiro lugar, as condições draconianas e cavernárias que a essência do
bloqueio e do embargo continuam tendo. E da posição geral dos Estados Unidos em
relação à questão cubana.
As distintas camadas de
euforia e confusão atual, pela esquerda e pela direita, distorcem,
des-interpretam o fato concreto. Perde-se a justa dimensão política. Porque a
“normalização” não é de todo certa. Há apenas passos em direção a ela. E
ninguém se preocupará em explicar a você o que é essa “normalização” em uma
guerra permanente.
O dado em sincronia: o
mínimo relaxamento (que parecia ser o início de algo mais amplo e extenso) vai
na contramão do furor de sanções do 1% contra Venezuela, Rússia, Brics. Vai em
sintonia exata com o plano do golpe parlamentar no Brasil e o crescimento da
tensão e da incerteza Argentina adentro.
Visto assim, trata-se
de uma sofisticação, uma atualização do modelo de sanções que torna
absolutamente obsoleto neste tempo global, e que simplesmente é incompatível
com as atuais leis do marketing e do consumo político.
Porque o laboratório
ultrapolicial vai na contramão desta nova “liberalização” nas relações
cubano-gringas; continuam sendo a mesma coisa. No fundo desta cadeia, existem
várias jogadas que obedecem o labirinto imperial e que não se regem por qualquer
motivação humanitária.
Nas sincronias em menor
escala, e não por isso menos expressivas, Rajiv Shah, diretor da Usaid, a
fachada operativa “comunitária” da comunidade de inteligência gringa, anunciou
sua demissão do cargo do diretor. Renúncia “com sentimentos encontrados”,
disse.
O wikidado Alan Gross e
os cinco heróis: quem visitar o artigo da Wikipedia sobre o sujeito, verá o
relato de um trabalhador social altruísta, cuja vocação humanista o levou a
ampliar o acesso à internet para a comunidade judaica de Cuba, quando, na
verdade, trata-se de um especialista em telecomunicações, que antes de ir a
Cuba vinha do Iraque e do Afeganistão, onde estabeleceu redes paralelas de
telecomunicação que, em 2009, foram reveladas após as investigações da
inteligência cubana revelarem o tráfico de diversos equipamentos eletrônicos e
audiovisuais.
A comunidade judaica em
Cuba negou qualquer vínculo com o senhor Gross. Um agente de alto nível, sob o
guarda-chuva da Usaid, responsável por uma parte importante de um plano que tem
artistas na rede Zunzuneo e as recentes revelações de infiltração na comunidade
de hip-hop de Cuba.
Por outro lado, os que
falam sobre os cinco “espiões” cubanos não vão contar que se tratou de uma rede
de contrainteligência antiterrorista que conseguiu desmantelar diversas
operações e agressões contra a ilha, cujos objetivos se centravam no
anticastrismo radical. Para compreender as proporções de outra de tantas épicas
da Revolução Cubana, convém recorrer ao livro “Os últimos soldados da guerra
fria”, do escritor e jornalista brasileiro Fernando Morais.
O dado smart power
(fechar uma porta para abrir dez): um passo como este, tanto complexo como
abarcante, oferece equilíbrio em outras frentes. A partir desta nova
perspectiva, a matriz (spin, em inglês) é evidente: tendo os Estados Unidos
“normalizado” relações, quem fica, segundo essa lógica, como o país
desatualizado, isolado, com “ideologia caduca”? Evidentemente, com esta jogada,
consolida-se e se concentra uma frente contra a Venezuela Bolivariana.
Mas é público e
notório, Cuba e Venezuela, segundo a segundo a seção para Assuntos Hemisféricos
do Departamento de Estado são tratados como unidade. A “tese” central de Rafael
Poleo, a revista Zeta e as tendências mais pró-Miami sempre falam de
“Venecuba”. Dentro desse sistema lógico prévio à sensatez, e sem contar com a
capacidade da agência política do governo cubano, trata-se, de uma jogada
absolutamente divisória, mas o objetivo e os propósitos continuam sendo os
mesmos.
A administração Obama,
em nome de seu partido, lançou um golpe de efeito para o futuro.
O dado império adentro:
A partir do ano que vem, o Partido Democrata perde o domínio do Congresso e da
Câmara Baixa. São fatos conhecidos, fatos previsíveis, os “métodos” de coerção
do lobby anticastristas no seio do Partido Republicano com figuras como Ileana
Ros- Lehtinen, Marco Rubio ou Lincoln Díaz-Baralt. Expressão da guerra de
tendências dentro do labirinto imperial, o objetivo central é o voto latino nas
eleições de 2016.
A novas gerações
“cubano-gringas” parte de posições diferentes, menos atrasadas e cavernárias, e
em grande medida aumenta a rejeição das figuras clássicas do anticastrismo.
Flórida tem um peso eleitoral específico, o que chamam swinging state, um
estado decisivo.
Na disputa por um
mercado eleitoral específico, em eleições presidenciais em que a demografia da
migração latino-americana (de primeira, de segunda e terceira geração) exercerá
um peso determinante. Nesse mesmo rumo é que Obama defende a reforma
migratória, que beneficiaria e naturalizaria amplos setores da população migrante
que ainda está na ilegalidade.
O que demonstra e
confirma o cinismo habitual é o fácil contraste entre essa política de lógica
racial frente a tudo o que Ferguson e seus arredores descrevem.
O dado hipótese Missão
Verdade: conforme já publicamos em outra oportunidade, o atual momento louco do
capitalismo tem um reflexo expressivo na disputa pelo modo e pelo método com o
qual os fatores formais do Estado norte-americano (rostos visíveis do Estado
profundo) buscam impor as novas regras do jogo internacional.
Ação estratégica
orientada fundamentalmente a reverter os centros dinâmicos dos novos blocos de
poder emergente: por um lado Venezuela-Brasil-Argentina (escorado na Unasul,
Celac, Alba e Mercosul), por outro, a Rússia, principalmente, a China por sua
crescente posição na proposta euroasiática, em ambos os casos estão apoiados
sobre a chave multipolar dos Brics. A jogada continua estando dentro das
“regras do excepcionalismo globalizado”.
Estamos testemunhando
uma atualização dos mecanismos, métodos e modos de intervenção. Toda
harmonização neste momento é totalmente ilusória. Com o que já estão chamando
de “normalização” no ambiente sociopolítico cubano, vão se inocular as mínimas
condições operativas que puderam facilitar a ideia de uma “primavera cubana”,
uma revolução de proveta.
O bloqueio ainda não
acabou. Estamos apenas abrindo o placar.
Créditos da foto: Adam
Jones / Flickr
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