A lei impõe ao advogado o sigilo
para com seu cliente e o protege com firmeza. Mas e se alguém impele o advogado
a violar esse sigilo?
Thiago Gomes Anastácio*, no
portal Jota (via Vermelho.org) / www.cartamaior.com.br
Essa é a gênese de todo e
qualquer pré-julgamento e salve Umberto Eco por afirmar que as redes sociais
deram voz a milhões de imbecis. Nos casos criminais, aquele que tem posição
sobre culpa ou inocência do investigado (ou acusado), sem ter lido os procedimentos,
é sempre um imbecil.
Vide o caso das delações.
Elas estão sendo alvo de
desconfianças porque ou os delatores se contradizem ou se “lembram” só em seus
terceiros ou quartos depoimentos sobre fatos importantíssimos e sobre figuras
de grosso calibre, figuras, diríamos, inesquecíveis, que teriam recebido
dinheiro em montantes também inesquecíveis; e também, porque, agora, erga
omines, está se chegando a conclusão de que se aplaudiam os delatores quando
apontavam o dedo para figuras da situação governamental e agora elas, essas
esquizofrênicas delações, estão apontado os faróis para a oposição.
E os aplausos de ontem estão se
tornando uma vergonha sem tamanho.
Muito se tem falado do bilhete de
Marcelo Odebrecht… E tudo já foi dito.
Resumo simples: o sujeito,
simplesmente o maior empresário do país, acusado de ser um Lex Luthor agindo
contra a Petrobrás, seria burro de pedir para destruir uma prova que já estava
com a Justiça (como o faria?) e mais, escreveria num bilhete e o entregaria
aberto a um agente da PF?
Superado o óbvio, vamos lembrar
que o motivo de sua prisão é, essencialmente, porque cometeu os crimes; ou
seja, ele foi pré-julgado.
Curioso: se afirma que o sujeito,
antes de apresentar defesa, cometeu os crimes, mas, malandramente, sempre se
fundamenta com aquela afirmação “ao menos sob uma análise preliminar”.
O que significa isso? Um juiz
afirmando que alguém é preliminarmente culpado? Preliminarmente culpado
significa presumidamente culpado… Preliminarmente culpado e demonstrador de
periculosidade porque saiu em sua própria defesa (esse é o principal fundamento
da prisão)?
E agora, não bastasse tudo isso,
que coloca em risco a operação e milhões e milhões de dinheiro gasto nessas
investigações, chegamos à culminância do ridículo, pois sim, não estamos mais
falando de Estado Policial, violação constitucional, violação de princípios do
processo penal, juízes e super-heróis, marketing e política interna das
instituições… Está-se falando de falta de senso de ridículo.
Simplesmente queriam impedir a
advogada de advogar. E qual o fundamento? Ela não poderia participar de ato
investigativo porque seria testemunha.
E testemunha do que?
Sobre o que ela deve manter em
sigilo, mais especificamente, a relação (comunicação e confiança) entre ela e
seu cliente.
Leitores: é consternado que
escrevo o que escreverei, mas paciência.
Causa-me espécie que, dentre
todas as opiniões publicadas e manifestações de apoio dirigidas à advogada,
tenha-se esquecido do principal, mais útil e importante, e diria até, da mais
óbvia constatação.
A lei impõe ao advogado o sigilo
para com seu cliente e o protege com firmeza.
O Código de Ética da Ordem dos
Advogados (artigos 25 a 27) estipula o sigilo como inerente a profissão e, para
se tenha ideia de sua importância jurídica, o Código Penal afirma ser crime
qualquer violação ao mesmo (art. 154).
Até aqui, tudo bem?
Mas e se alguém, em atuação por
função pública, impele o advogado a violar esse sigilo?
O art. 286 do Código Penal traz a
resposta.
É crime incitar alguém a
cometê-lo!
Na modalidade instigação, o
delegado da polícia federal, que fez ou fará indagações, pretendendo que a
advogada simplesmente lance um “a” sobre sua relação (ou circunstâncias de sua
relação) com o cliente, a está instigando (pois sabe que a relação é sigilosa)
a praticar um crime.
Sim, a conduta é criminosa.
E agora, pasme-se, o juiz de
direito, o Moro, intimou a defesa para se manifestar sobre o tal bilhete – que
jamais poderia ter sido lido por terceiro, pois sigiloso por força de lei
(esteja ela certa ou errada).
E então, o crime também é
cometido pela toga. Qualquer resposta da defesa implicará, por força do art. 31
do CP, a responsabilização penal do juiz.
Ou será do homem?
*Thiago Gomes Anastácio é sócio
do Chammas & Anastácio Advogados e diretor do IDDD.
Créditos da foto: reprodução
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