POR FERNANDO BRITO / http://tijolaco.com.br/
Ontem, reproduzi aqui um vídeo onde Ciro Gomes falava da questão nacional e de sua visão de integração com soberania. E reclamei de que, apesar de ser uma dos mais relevantes quadros da política, a grande imprensa não lhe dê espaços, porque suas falas são sempre tão afirmativas e desabridas que não podem deixar de ser notícia.
Hoje, a Folha dá este espaço para que ele fale, e de política.
O que ele diz sobre a crise e a ameaça de impedimento é pleno de razão, embora seja necessário – e ele tem, ao que parece, alergia a isso – o exercício da política real, que não pode ser esquecido e o próprio Ciro sabe.
Como, fora do Governo e sem ter
sequer como participar mais intensamente de articulações, mesmo sendo potencial
candidato em 2018, Ciro não tem esta obrigação, chama a atenção o fato de ele
não fazer concessões oportunistas ao movimento de impeachment de Dilma e,
cobrando da Presidente coerência com o projeto que representa e a levou à
vitória, se ponha sem rodeios em defesa da legalidade.
Leia a sua entrevista ao bom
repórter Bernardo Mello Franco, na edição de hoje da Folha.
Folha – Como o sr. vê a
articulação pelo impeachment da presidente Dilma Rousseff?
Ciro Gomes – A democracia está
ameaçada pelo golpismo. Está
acontecendo uma escalada do golpe
com apoio da oposição, que
não aceitou o resultado das
eleições.
Não gostar do governo não é causa
para impeachment. Isso é um
mecanismo raro, a ser usado em
caso de crime de responsabilidade
imputável direta e dolosamente ao
presidente. Ninguém tem nada disso contra a Dilma.
Seria muito caro o preço de uma
interrupção do mandato. É só olhar a Venezuela. Quem produziu aquele quadro lá
foi esse tipo de antagonismo odiento. O país vai viver momentos tensos e
graves, vizinhos à violência, por causa desses loucos.
Quem iria às ruas defender o
mandato de Dilma?
Estarei na primeira fila. Muitos
brasileiros vão se perfilar. Não é para defender a Dilma, é para defender a
regra. Veja o que já aconteceu quando um mandato foi interrompido por renúncia,
suicídio ou impedimento.
O impeachment pode ser a catarse
de quem está zangado, mas no dia seguinte os problemas serão os mesmos. Só que
agora o PT, a CUT e os servidores estarão em pé de guerra com um presidente sem
legitimidade.
Uma parte das pessoas está nisso
de boa fé porque não sabe que quem assume é o vice, Michel Temer, que é do PMDB
e amigo íntimo do Eduardo Cunha. Mas tem pessoas de muita má-fé.
A quem o sr. se refere?
A Aécio Neves e Fernando Henrique
Cardoso. O PSDB está fazendo isso por pura vingança. Em 1999, quando houve a
desvalorização violenta do real e a popularidade do presidente foi ao chão, o
PT começou com o Fora FHC.
O comportamento do Fernando
Henrique é constrangedor. Como dizia Brizola, ele está costeando o alambrado do
golpe. Qual é a proposta do PSDB? Ficar contra o fator previdenciário e a CPMF,
que eles criaram? Contra o ajuste fiscal, que eles introduziram como valor
supremo?
Por que Dilma está tão fraca?
O maior problema do governo não é
o escândalo, é a mentira. A zanga do povo não é propriamente com a corrupção,
que é chocante, mas com o sentimento de ter sido enganada. A gente votou em um
conjunto de valores e está recebendo o oposto.
O governo tem que se reorganizar
politicamente e fazer uma gestão econômica coerente com o discurso que lhe deu
a vitória. Ainda há tempo. O problema é que ela não tem projeto nem equipe.
A equipe da Dilma é de quinta,
salvo exceções. Quem bota a [ex-ministra] Ideli Salvatti para tomar conta de
uma situação dessa complexidade está pedindo para morrer.
Aí ela entrega a coordenação
política ao vice, que distribui todos os cargos importantes ao PMDB e depois
lava as mãos e sai. É uma coisa de cinema, rapaz. E os escândalos da Dilma 2.0
vão surgir dos nomeados por ele.
Nunca vi um vice-presidente se
mexer tanto. O Temer foi dar palestra para um movimento que está no golpe
contra a Dilma e fez uma frase que não admite dupla interpretação. Onde está
escrito na Constituição que uma presidente com 7% [8%, segundo o Datafolha] de
aprovação não se aguenta no cargo?
Ele quer a cadeira dela?
Vá ver se o José Alencar [vice de
Lula], na crise do mensalão, saiu fazendo palestra e dizendo que era preciso
achar alguém para unir o país. Eu costumo não ser idiota.
Como vê o novo pacote fiscal ?
É ilusionismo, mas 70% não sai do
papel. E a medida mais importante [a recriação da CPMF] não podia ter sido
anunciada daquele jeito.
A receita está despencando por
causa da recessão que esses malucos estão produzindo. Se o governo não
atrapalhasse com a taxa de juros, o Brasil poderia achar o caminho antes do que
se supõe. O governo está atrapalhando.
Hoje a inflação é provocada por
câmbio e preços administrados, dois setores sobre os quais os juros não têm o
menor efeito. E os maiores bancos estão tendo lucro 40% acima do ano passado.
Estão ganhando com a crise.
O sr. quer disputar o Planalto?
Acho extemporâneo falar de
candidatura agora. Mas eu já fui candidato duas vezes, não posso disfarçar.
O PDT é seu sétimo partido. Como
explica tantas mudanças?
Minha vida partidária é uma
tragédia, muito ruim mesmo. Mas mudo de partido, não de convicções. Tenho 26
anos de vida pública e nunca respondi a um inquérito.
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