Mauricio Macri já escancarou seu
jeito autoritário de governar: nomeou por decreto ministros da Suprema Corte e
proibiu os piquetes no país.
Altamiro Borges, em seu blog.
// www.cartamaior.com.br
A mídia brasileira, com seus
dogmas neoliberais e seu complexo de vira-lata, comemorou a vitória de Mauricio
Macri na vizinha Argentina. "Fim do kirchnerismo", soltou rojões. Mas
ela poderá morder a língua mais cedo do que tarde. Em menos de um mês da sua posse,
o queridinho dos EUA e das elites locais e latinoamericanas já desponta como um
ditador de quinta categoria, que poderá incendiar o país vizinho. Os
trabalhadores argentinos, conhecidos por sua combatividade, já dão sinais de
que não vão aceitar passivamente a truculência do empresário mafioso que agora
ocupa a Casa Rosada.
Empossado em 10 de dezembro,
Mauricio Macri já escancarou seu jeito autoritário de governar. Por decreto,
sem a aprovação do Senado, ele nomeou dois ministros na Suprema Corte - o
equivalente ao STF no Brasil; por decreto, cassou os mandados dos dirigentes
dos dois órgãos que aplicam a "Ley de Medios"; por decreto, proibiu
os "piquetes" no país, os tradicionais bloqueios de estradas como
forma de protesto social. Para o seu ministério, Macri nomeou agiotas e outros
neoliberais de carteirinha. Como plano de governo, ele anunciou que pretende
impor um duro plano de austeridade. Ele também voltou a falar em anistia para
os generais e torturadores da sanguinária ditadura militar do país.
15 mil em defesa da Ley de Medios
Os sinais de resistência já
pipocam. A decisão de extinguir por decreto os mandatos dos dirigentes da
Autoridade Federal dos Serviços de Comunicação Audiovisual (AFSCA) e da
Autoridade Federal de Tecnologias da Informação e Comunicações (AFTIC) gerou
revolta. Martín Sabbatella, coordenador da AFSCA, rejeitou deixar o cargo. A
policia foi acionada para evacuar o prédio em Buenos Aires. O jornal Página-12,
único impresso crítico do país, relata que o novo ministro das Comunicações,
Oscar Aguad, tem como missão enterrar a "Ley de Medios", aprovada
pelo parlamento e sacramentada pela Suprema Corte. Macri já foi apelidado de
"presidente do Clarín", o império midiático da Argentina.
Uma semana após a posse do
"presidente do Clarín", cerca de 15 mil argentinos já realizaram um
ato em Buenos Aires "contra o golpismo macrista" e em defesa da
democratização das comunicações. Os manifestantes carregaram cartazes com os
dizeres: "Na lei de meios não se toca", "Macri = censura" e
"nem decretos, nem repressão". Eles também protestaram contra a
intenção do governo de extinguir o programa televisivo "678" na TV
Pública, uma das poucas vozes críticas da televisão argentina. "Nós
lutamos contra Videla [Jorge Videla, o sanguinário ditador da argentina] e
vamos continuar lutando pela democracia", afirmou Estela de Carloto, líder
do movimento Avós e Mães da Praça de Maio.
Repressão violenta aos
trabalhadores
No que se refere à proibição de
piquetes, o primeiro confronto já ocorreu. Segundo a agência Reuters, "as
forças de segurança argentinas enfrentaram trabalhadores que protestavam no
acesso ao principal aeroporto do país nesta terça-feira (21), depois do novo
governo de Mauricio Macri ter advertido que não toleraria bloqueio de rodovias,
prática que costuma ser usada como forma de protesto".
"A TV argentina mostrou
embates violentos entre funcionários da empresa avícola Cresta Roja e os
soldados, que lançaram água e dispararam balas de borracha para dispersar os
manifestantes. Vários trabalhadores ficaram feridos... Imagens de
enfrentamentos entre forças de segurança e manifestantes haviam praticamente
desaparecido nos últimos 12 anos, durante os governos de Néstor Kirchner e
Cristina Kirchner, que haviam orientado policiais e soldados a não reprimir os
protestos".
Golpe na Suprema Corte
Já a imposição de dois juízes da
Suprema Corte gerou críticas até entre apoiadores do novo ditador. A Folha
tucana, que festejou a derrota do kirchnerismo, relatou cautelosa:
"Mauricio Macri já entrou em sua primeira polêmica ao nomear por decreto
dois juízes da Suprema Corte. O dispositivo, embora previsto na Constituição,
foi usado uma única vez, segundo disse à Folha o constitucionalista Daniel
Sabsay, professor da Universidade de Buenos Aires. A iniciativa gerou rejeição
no próprio bloco que apoiou a eleição de Macri, entre juristas e na opinião
pública".
A indicação de Horacio Rosatti e
Carlos Rosencrantz para a Suprema Corte deveria, por tradição, ser aprovada por
dois terços do Senado. Mas o PRO, sigla de Mauricio Macri, não tem maioria na
Casa, que é hegemonizada por peronistas e kirchneristas. "É uma medida
autoritária inédita na democracia e deve ser anulada", protestou no
Twitter o Nobel da Paz Adolfo Pérez Esquivel. Apesar da postura autoritária, a
mídia venal da Argentina - e também a do Brasil - evita criticar o novo
ditador. "Agora que Cristina Kirchner se foi, não há mais crítica",
afirma a professora Libertad Mariana Strazzeri, que condena a descarada
"campanha midiática em favor de Macri".
"Macri faz xixi e a TN
[canal do Grupo Clarín] diz que chove", dizia um cartaz na manifestação em
defesa da Ley de Medios. A paciência dos argentinos, porém, tende a rapidamente
se esgotar diante do truculento e antipopular Maurício Macri. A mídia
hegemônica argentina - e brasileira - ainda vai ter muita dor de cabeça para
explicar esta brutal regressão.
Créditos da foto: Elza Fiuza
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