domingo, 27 de outubro de 2019

América Latina em transe, por Daniel Samam

Não necessariamente essas insurreições e o crescente descontentamento darão em coisa boa. Por exemplo, nas década de 30 deu em fascismo

            Por Jornal GGN
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Pedro Ugarte/AFP

Por Daniel Samam

Um turbilhão econômico-político-social vem chacoalhando o nosso continente nas últimas semanas. No Peru, a crise política levou ao fechamento do Congresso e a uma situação de impasse entre governo e oposição – ambos de direita. No Equador, o aumento dos combustíveis desencadeou uma série de protestos que foram capazes de encurralar o governo estelionatário de Lenin Moreno.

Na Bolívia, o presidente Evo Morales foi reeleito no primeiro turno, resultado que gerou protestos violentos por parte da oposição, fazendo necessário declarar Estado de emergência no país. O próprio governo pediu que a Organização dos Estados Americanos (OEA) faça uma auditoria das apurações. Porém, membros da OEA afirmaram não ter condições de avaliar o resultado e recomendaram o segundo turno no país. Antes mesmo das eleições, Evo já havia denunciado que a direita preparava um golpe.

No Chile, desde a semana passada, os protestos que começaram contra o aumento do preço da passagem de metrô tomaram grandes proporções, em tamanho e em violência. Acuado pelas manifestações, o governo decretou estado de emergência e colocou as forças armadas nas ruas. Os protestos continuaram, há milhares de presos e pelo menos 18 mortos. As imagens dos confrontos entre manifestantes e as forças de segurança, incluindo os militares, que chegam ao Brasil são impactantes, mas também podem parecer inspiradoras no que diz respeito à resistência do povo chileno, mas precisamos ter cuidado pra não fetichizar o lirismo do “povo na rua” atirando coisas contra blindados militares. É preciso sim denunciar as violações de Direitos Humanos. Até porque, quando o direito de ir e vir é interrompido por toques de recolher, cruza-se uma fronteira perigosa.

Hoje, o Chile encontra-se numa situação que põe em risco a sua democracia e que pode gerar reflexos em outros países da América Latina. Me parece que o ocorrido nas últimas semanas no Equador, Bolívia e Chile expõe a intenção do imperialismo estadunidense em transformar a América Latina em área de instabilidade como ocorreu no oriente médio, com o nacionalismo árabe. Lembrando que neste domingo (27) teremos eleições presidenciais na Argentina e no Uruguai, com forte tendência de vitória do campo democrático-popular.

A lógica anti-establishment segue forte, mas esse é um fenômeno mundial. O sistema está sendo atropelado pelas transformações radicais do capitalismo aliado ao discurso de criminalização da política, criando um descontentamento geral da população com o sistema e deixando evidente a incompatibilidade do neoliberalismo com a democracia liberal. E esse descontentamento geral favorece ao jogo pelos extremos, à esquerda e à direita. O problema é que não necessariamente essas insurreições e o crescente descontentamento darão em coisa boa. Por exemplo, nas década de 30 deu em fascismo.

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