Por Jornal GGN
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Jornal GGN – Em 20 março de 2020, quando a pandemia do novo coronavírus acabara de estourar no Brasil, setores da imprensa noticiaram que Jair Bolsonaro havia encomendado um estudo sobre a implementação do “estado de sítio” no Brasil. Na época, Bolsonaro negou que tal estudo fosse necessário porque, na visão dele, decretar o estado de sítio seria algo “muito simples”, que levaria “questão de horas”.
Um ano depois – nesta segunda-feira, 29 de março de 2021 – Bolsonaro promoveu uma reforma ministerial que atingiu o Ministério da Defesa e a cúpula das Forças Armadas. Saiu do comando da Pasta o general Fernando Azevedo e Silva, para dar lugar ao general Walter Braga Netto, ex-chefe da Casa Civil, mais alinhado ao bolsonarismo. Na esteira da decisão, os três comandantes do Exército, Marinha e Força Aérea também serão substituídos por opção de Bolsonaro. O do Exército, por uma questão de hierarquia (Edson Pujol é mais velho que Braga Netto).
Um dos motivos que teria levado à saída de Azevedo e Silva da Defesa foi a insistência de Bolsonaro em tratar o Exército como se fosse seu, de uso pessoal. O general, em sua carta de demissão, fez questão de ressaltar que sai com sensação de “dever cumprido” e de preservação das Forças Armadas como “instituições do Estado”.
Enquanto o Brasil atravessa seu pior momento da pandemia de coronavírus, com cientistas clamando por lockdown nacional de 30 dias imediatamente, Bolsonaro deixa claro que mantém em seu radar a hipótese de colocar o Exército na rua contra o que chamou de “caos social”. A instabilidade iminente seria provocada, em sua visão, pelas medidas restritivas impostas pelos governadores para conter a transmissão da Covid-19.
Em 21 de março, em seu aniversário de 66 anos, o extremista de direita afirmou a apoiadores, em frente ao Palácio do Alvorada, que haveria fome e miséria com o lockdown e este é “o caminho para o socialismo”, como aconteceu na Venezuela. A missão de Bolsonaro é fazer “o que estiver ao alcance” para impedir que o Brasil caia nas mãos dos “socialistas”. O general Augusto Heleno acompanhou o discurso inerte. É aí que entra o estado de sítio – ou, antes, estado de defesa – que Bolsonaro começou a estudar a um ano atrás.
O estado de sítio é uma medida constitucional, prevista para ser usada apenas em situações extremas, caso de guerra ou ameaça armada estrangeira. Ela suspende direitos e liberdades individuais dos cidadãos, além de limitar os poderes do Legislativo e Judiciário.
Ao acionar o estado de sítio no contexto da pandemia, o presidente da República teria, em tese, cerca de 30 dias (prorrogáveis por tempo igual ou inferior) para agilizar as ações de resposta do Estado.
O estado de sítio está fundamentado nos artigos 137 a 141 da Constituição. Depende de aprovação do Congresso por maioria absoluta (41 senadores e 257 deputados).
A Constituição também estabelece algumas condições para o decreto, como a criação de um conselho consultivo e outro parlamentar para acompanhar as medidas, e fala também de um “estado de defesa” como contexto prévio onde as medidas adotadas não teriam sido suficientes.
O GGN reproduz abaixo os artigos da Constituição que tratam do estado de sítio:
Art. 137. O Presidente da República pode, ouvidos o Conselho da República e o Conselho de Defesa Nacional, solicitar ao Congresso Nacional autorização para decretar o estado de sítio nos casos de:
I – comoção grave de repercussão nacional ou ocorrência de fatos que comprovem a ineficácia de medida tomada durante o estado de defesa;
II – declaração de estado de guerra ou resposta a agressão armada estrangeira.
Parágrafo único. O Presidente da República, ao solicitar autorização para decretar o estado de sítio ou sua prorrogação, relatará os motivos determinantes do pedido, devendo o Congresso Nacional decidir por maioria absoluta.
Art. 138. O decreto do estado de sítio indicará sua duração, as normas necessárias a sua execução e as garantias constitucionais que ficarão suspensas, e, depois de publicado, o Presidente da República designará o executor das medidas específicas e as áreas abrangidas.
§ 1º O estado de sítio, no caso do art. 137, I, não poderá ser decretado por mais de trinta dias, nem prorrogado, de cada vez, por prazo superior; no do inciso II, poderá ser decretado por todo o tempo que perdurar a guerra ou a agressão armada estrangeira.
§ 2º Solicitada autorização para decretar o estado de sítio durante o recesso parlamentar, o Presidente do Senado Federal, de imediato, convocará extraordinariamente o Congresso Nacional para se reunir dentro de cinco dias, a fim de apreciar o ato.
§ 3º O Congresso Nacional permanecerá em funcionamento até o término das medidas coercitivas.
Art. 139. Na vigência do estado de sítio decretado com fundamento no art. 137, I, só poderão ser tomadas contra as pessoas as seguintes medidas:
I – obrigação de permanência em localidade determinada;
II – detenção em edifício não destinado a acusados ou condenados por crimes comuns;
III – restrições relativas à inviolabilidade da correspondência, ao sigilo das comunicações, à prestação de informações e à liberdade de imprensa, radiodifusão e televisão, na forma da lei;
IV – suspensão da liberdade de reunião;
V – busca e apreensão em domicílio;
VI – intervenção nas empresas de serviços públicos;
VII – requisição de bens.
Parágrafo único. Não se inclui nas restrições do inciso III a difusão de pronunciamentos de parlamentares efetuados em suas Casas Legislativas, desde que liberada pela respectiva Mesa.
Art. 140. A Mesa do Congresso Nacional, ouvidos os líderes partidários, designará Comissão composta de cinco de seus membros para acompanhar e fiscalizar a execução das medidas referentes ao estado de defesa e ao estado de sítio.
Art. 141. Cessado o estado de defesa ou o estado de sítio, cessarão também seus efeitos, sem prejuízo da responsabilidade pelos ilícitos cometidos por seus executores ou agentes.
Parágrafo único. Logo que cesse o estado de defesa ou o estado de sítio, as medidas aplicadas em sua vigência serão relatadas pelo Presidente da República, em mensagem ao Congresso Nacional, com especificação e justificação das providências adotadas, com relação nominal dos atingidos e indicação das restrições aplicadas.
O ESTADO DE DEFESA
Já o estado de defesa é uma medida mais localizada e menos restritiva em comparação com o estado de sítio. Também depende de aprovação do Congresso por maioria absoluta (257 deputados e 41 senadores). Não requer consultas a comissões criadas especialmente para a ocasião e pode se manter em vigor mesmo enquanto o Congresso não votar.
Art. 136. O Presidente da República pode, ouvidos o Conselho da República e o Conselho de Defesa Nacional, decretar estado de defesa para preservar ou prontamente restabelecer, em locais restritos e determinados, a ordem pública ou a paz social ameaçadas por grave e iminente instabilidade institucional ou atingidas por calamidades de grandes proporções na natureza.
§ 1º O decreto que instituir o estado de defesa determinará o tempo de sua duração, especificará as áreas a serem abrangidas e indicará, nos termos e limites da lei, as medidas coercitivas a vigorarem, dentre as seguintes:
I – restrições aos direitos de:
a) reunião, ainda que exercida no seio das associações;
b) sigilo de correspondência;
c) sigilo de comunicação telegráfica e telefônica;
II – ocupação e uso temporário de bens e serviços públicos, na hipótese de calamidade pública, respondendo a União pelos danos e custos decorrentes.
§ 2º O tempo de duração do estado de defesa não será superior a trinta dias, podendo ser prorrogado uma vez, por igual período, se persistirem as razões que justificaram a sua decretação.
§ 3º Na vigência do estado de defesa:
I – a prisão por crime contra o Estado, determinada pelo executor da medida, será por este comunicada imediatamente ao juiz competente, que a relaxará, se não for legal, facultado ao preso requerer exame de corpo de delito à autoridade policial;
II – a comunicação será acompanhada de declaração, pela autoridade, do estado físico e mental do detido no momento de sua autuação;
III – a prisão ou detenção de qualquer pessoa não poderá ser superior a dez dias, salvo quando autorizada pelo Poder Judiciário;
IV – é vedada a incomunicabilidade do preso.
§ 4º Decretado o estado de defesa ou sua prorrogação, o Presidente da República, dentro de vinte e quatro horas, submeterá o ato com a respectiva justificação ao Congresso Nacional, que decidirá por maioria absoluta.
§ 5º Se o Congresso Nacional estiver em recesso, será convocado, extraordinariamente, no prazo de cinco dias.
§ 6º O Congresso Nacional apreciará o decreto dentro de dez dias contados de seu recebimento, devendo continuar funcionando enquanto vigorar o estado de defesa.
§ 7º Rejeitado o decreto, cessa imediatamente o estado de defesa.
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