sábado, 22 de março de 2025

Há um grupo terrorista no Brasil


Paulo Motoryn

Nos acampamentos dos quartéis do Exército, nasceu uma organização criminosa que está disposta a matar e morrer por uma só pessoa: Jair Messias Bolsonaro.

Desde o fim de 2022, investigar a rede bolsonarista por trás dos ataques golpistas se tornou um trabalho de alto risco. Nos últimos dias, como talvez você já saiba, experimentei isso na pele.

Depois que revelamos a vida tranquila e impune de um foragido do 8 de Janeiro na Argentina, fui alvo de ameaças de morte e tive meus dados pessoais expostos em redes sociais – além de uma série de outros crimes igualmente informados às autoridades competentes.

O ataque não veio de um único ponto, mas de uma rede organizada. Quando percebi que as coisas estavam em um nível muito maior do que estou acostumado, fiz o que sempre faço ao investigar políticos e empresários: segui os rastros digitais, identifiquei alguns dos responsáveis e “puxei a capivara” de um por um – ou seja, busquei em fontes públicas informações dos autores.

Em tese, a maioria, na rua, não intimidaria ninguém. Mas, no ambiente digital, são operadores de uma máquina de destruição especializada em desestabilizar, praticar violência digital e cometer crimes de ameaça. Por alguns minutos, cheguei a relaxar. Foi aí que me lembrei do caso de Francisco Wanderley Luiz, o Tio França.

Quase dois anos após o atentado contra a democracia do 8 de Janeiro, Tio França planejou um ataque a bomba no Supremo Tribunal Federal. Levou explosivos ao prédio do tribunal, mas não conseguiu entrar. Lançou alguns rojões na direção do STF e, ao ser confrontado, resolveu cometer suicídio em frente à estátua da Justiça.

Embriagado pela ideologia bolsonarista, Tio França quis fazer de sua morte um ato político. E ele não era um lobo solitário, um maluco qualquer. Era um fanático forjado pelos discursos de Jair Bolsonaro contra a democracia, especialmente contra o STF – como muitos dos que me ameaçaram, como tantos que estão na Argentina.

Tio França e Josiel Gomes, o 007, foragido que encontrei em Buenos Aires, têm muito em comum – e não é só o tom meio patético do figurino de um e do apelido do outro. Os dois eram comerciantes de cidades do interior do país, com faixa etária similar, tiveram candidaturas fracassadas a vereador no histórico político, e, por fim, foram submetidos a um processo de radicalização acelerada.

Tio França comprou uma bomba e armou um plano para destruir o STF. Josiel comprou equipamentos militares e foi preso encapuzado, incendiando uma viatura policial. Abriram mão da família e da própria vida em nome de uma pessoa: Jair Messias Bolsonaro.

Os dois são rostos que vieram a público de uma mesma organização: um grupo criminoso e terrorista que habita o seio do bolsonarismo.

Não são todos nem a maioria, mas há uma parcela, violenta e radicalizada, amparada por advogados, empresários e políticos de alto calibre, que é, sim, uma organização criminosa e terrorista. E não pode ser ignorada nem normalizada.

QG’s: a origem do grupo criminoso

É possível enxergar vários marcos fundadores desse grupo. Mas, para simplificar, basta voltar pouco mais de dois anos no tempo e lembrar que os acampamentos montados em frente a quartéis não foram apenas pontos de protesto. Eles foram, como alertou Flávio Dino antes mesmo do 8 de Janeiro, "incubadoras de terroristas". O tempo provou a precisão dessa avaliação.

Foi dali que saíram os criminosos que incendiaram ônibus e tentaram invadir a sede da Polícia Federal em Brasília, em 12 de dezembro de 2022. Foi ali que se organizou a tentativa de atentado a bomba no aeroporto da capital federal. E foi desses acampamentos que partiu a invasão criminosa à Praça dos Três Poderes no 8 de Janeiro.

Esses atos não foram espontâneos nem desorganizados. O que documentamos ao longo de meses de investigação foi a existência de uma estrutura paramilitar, financiada por empresários, respaldada por advogados e organizações da extrema direita, e estimulada por políticos bolsonaristas — muitos deles ainda em pleno exercício de seus mandatos.

O que vi na Argentina, e os ataques que sofri depois, me fazem ter certeza que 8 de Janeiro não foi o fim. Mas apenas mais um marco dentro de um processo de radicalização que começou nos acampamentos e evoluiu para atentados terroristas. Essa violência não desapareceu com o início do governo Lula ou da desmontagem dos acampamentos, a partir de 9 de janeiro de 2023.

Basta um olhar atento aos atores envolvidos na tentativa de golpe para notar um aprofundamento dessa radicalização, com células organizadas em sigilo e a ampliação considerável de suas conexões internacionais. A ida de foragidos para a Argentina, sob o governo de Javier Milei, e o respaldo de Donald Trump nos Estados Unidos, evidenciam essa articulação global.

Enquanto espera a hora de seu líder voltar ao poder, no Brasil, as táticas extremistas seguem se espalhando: recrutamento digital, militarização do discurso e uso da violência como ferramenta política.

A máquina do terror bolsonarista continua ativa. Se não for enfrentada e criminalizada, seguirá fazendo novas vítimas – até que não reste mais nenhuma.





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