Luiz Flávio Gomes
Carta Maior
A rejeição da PEC 37 representa
mais uma vitória histórica do movimento pró-moralização do nosso país, mas
muitas lacunas continuam. Apesar do oportunismo do legislativo, o certo é que o
povo unido, em torno de propósitos sensatos (não aloprados), tem uma força
insuperável (nos estados democráticos). Ulisses Guimarães (pai da Constituição
cidadã) disse: “o que mete medo em político é o povo na rua”. Estamos
saboreando, prazerosamente, mais uma vitória. Primeiro foram os 20 centavos. Depois
foi a vez do governador de SP cancelar o aumento dos pedágios. Agora chegou a
vez da rejeição da PEC 37. É grande a emoção que muita gente está sentindo, mas
coisas muito sérias ficaram pendentes:
(a) hoje o MP investiga por meio
de uma resolução e resolução não é lei. É isso que sempre defendi, inclusive
naquele meu artigo publicado na Folha de S. Paulo, em 2012. Eu penso que, hoje,
sem lei, o MP não pode presidir investigação. No Estado de Direito, a lei é uma
garantia de todos. Logo, a rejeição da PEC 37 exige a elaboração urgente de uma
lei que discipline com clareza essa investigação pelo MP, de forma a evitar
todo tipo de abuso por parte dele, a começar pela falta de controle no
arquivamento (acabar com o crime, na medida do possível, sim, porém, não de
forma abusiva ou criminosa; não se pode matar um mostro e criar outro; todos
que contam com poder tender a abusar dele; logo, limites, contenção, lei);
enquanto não aprovada lei nesse sentido os advogados vão continuar contestando
as investigações do MP (e, hoje, sem lei, com forte chance de anular tudo):
(b) é imprescindível que todos os
órgãos investigativos (Polícia federal, Polícia estadual, polícia científica,
Coaf, Ministério Público, Banco Central, agentes da receita federal etc.),
todos, estabeleçam (assim que possível) um consenso, bem como parcerias de
esforços (complementares ou concomitantes) para combater o crime organizado,
que está enraizado no poder público brasileiro corrupto até o último fio de
cabelo.
A CPI do Cachoeira, arquivada com
um documento indecente de 2 páginas, é a prova inequívoca de que grande parcela
dos políticos (bem grande mesmo) não é parte da solução do problema da
corrupção, sim, parte do problema, porque está comprometida até à medula com o
crime organizado, que é a fonte direta do indecente serviço público prestado
para a humilhada e indignada população. É político desse tipo, ainda que tenha
votado contra a PEC 37, que tem que ser varrido do Congresso Nacional.
Constitui um erro sem precedente
(no campo das investigações criminais) não ver que todos os órgãos públicos
(polícia, Ministério Público, receita federal, Coaf, Banco Central etc.) devem
somar suas energias, não se dividir, diante do crime organizado S.A. Todos os
esforços de todas as instituições devem ser somados, porque é grande o desafio
de combater o crime organizado privado ou público-privado.
No mundo da economia submetida
(em grande parte) ao crime organizado e à lavagem de capitais, lavagem essa que
é feita, sobretudo (mas não exclusivamente), por alguns bancos norte-americanos
e europeus, que internalizaram (naturalizaram) seus procedimentos lucrativos
por meio de métodos duvidosos ou criminosos, tornou-se difícil distinguir o que
é ganho lícito do que é ganho ilícito. Somente uma equipe muito especializada e
afinada pode fazer frente a esse imenso poder econômico-financeiro que, sob a
égide do capitalismo neoliberal ou de tradição escravagista (como é o caso do
Brasil), levou a desigualdade e a desgraça a milhões de seres humanos hoje completamente
excluídos da possibilidade de uma vida com mínima dignidade. Avante Brasil!
Luiz Flávio Gomes é jurista e
diretor-presidente do Instituto Avante Brasil
(www. institutoavantebrasil.com.br).
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