247 - A chegada da edição de Natal da revista Istoé às
bancas não traz notícias boas para o DEM, principalmente para a governadora do
Rio Grande do Norte, Rosalba Ciarlini, e ao presidente do partido, Agripino
Maia. Ambos estão sendo investigados pelo Ministério Público Federal por caixa
2 durante a campanha eleitoral de 2006. Em umas das escutas telefônicas, Maia
surge questionando a um interlocutor se a parcela de R$ 20 mil – em um total de
R$ 60 mil prometidos a determinado aliado – foi repassada. A sequência das
ligações revela que não era uma transição convencional. Segundo a investigação
do MP, contas pessoais de assessores da campanha eram utilizadas para receber e
transferir depósitos não declarados de doadores. A reportagem da revista Istoé
é assinada pelo jornalista Josie Jeronimo.
A denúncia foi encaminhada à Procuradoria-Geral da República
em 2009, durante a gestão de Roberto Gurgel, mas só agora, sob a batuta do
procurador-geral Rodrigo Janot será investigada. O caso entra no alvo do MPF
num momento complicado para a governadora Rosalba Ciarlini, que já teve seu mandato
suspenso pelo TRE, por uso da estrutura governamental em 2012 para beneficiar
uma aliada que era candidata a prefeita. Rosalba permanece no cargo por força
de uma liminar.
Confira matéria na íntegra:
Caixa 2 democrata
Ministério Público Federal investiga esquema envolvendo a
governadora do Rio Grande do Norte, Rosalba Ciarlini, e o presidente do DEM,
Agripino Maia. Escutas telefônicas revelam transações financeiras ilegais
durante campanha
Josie Jeronimo
Pequenino em área territorial, o Rio Grande do Norte empata
em arrecadação tributária com o Maranhão, Estado seis vezes maior. Mas, apesar
da abundância de receitas vindas do turismo e da indústria, a administração do
governo potiguar está em posição de xeque. Sem dinheiro para pagar nem mesmo os
salários do funcionalismo, a governadora Rosalba Ciarlini (DEM) responde
processo de impeachment e permanece no cargo por força de liminar. Sua situação
pode se deteriorar ainda mais nos próximos dias.
O Ministério Público Federal desarquivou investigação
iniciada no Rio Grande do Norte que envolve a cúpula do DEM na denúncia de um
intrincado esquema de caixa 2. Todo o modus operandi das transações financeiras
à margem da prestação de contas eleitorais foi registrado em escutas
telefônicas feitas durante a campanha de 2006, às quais ISTOÉ teve acesso. A
partir do monitoramento das conversas de Francisco Galbi Saldanha, contador da
legenda, figurões da política nacional como o presidente do DEM, senador José
Agripino, e Rosalba foram flagrados.
A voz inconfundível de José Agripino surge inconteste em uma
das conversas interceptadas. Ele pergunta ao interlocutor se a parcela de R$ 20
mil – em um total de R$ 60 mil prometidos a determinado aliado – foi repassada.
A sequência das ligações revela que não era uma transição convencional. Segundo
a investigação do MP, contas pessoais de assessores da campanha eram utilizadas
para receber e transferir depósitos não declarados de doadores. Uma das escutas
mostra que até mesmo Galbi reclamava de ser usado para as transações. Ele se
queixa:“ Fizeram uma coisa que eu até não concordei, depositaram na minha
conta”.
Galbi continua sendo homem de confiança do partido no
Estado. Ele ocupa cargo de secretário-adjunto da Casa Civil do governo. Em 2006,
o contador foi colocado sob grampo pela Polícia Civil, pois era suspeito de um
crime de homicídio. O faz-tudo nunca foi processado pela morte de ninguém, mas
uma série de interlocutores gravados a partir de seu telefone detalharam o
esquema de caixa 2 de campanha informando número de contas bancárias de pessoas
físicas e relatando formas de emitir notas frias para justificar gastos
eleitorais.
Nas gravações que envolvem Rosalba, o marido da governadora,
Carlos Augusto, liga para Galbi e informa que usará de outra pessoa para
receber doação para a mulher, então candidata ao Senado. “Esse dinheiro é
apenas para passar na conta dele. Quando entrar, aí a gente vê como é que sai
para voltar para Rosalba.” O advogado da governadora, Felipe Cortez, evita entrar
na discussão sobre o conteúdo das escutas e não questiona a culpa de sua
cliente. Ele questiona a legalidade dos grampos. “Os grampos por si só não
provam nada. O caixa 2 não existiu. As conversas tratavam de assuntos
financeiros, não necessariamente de caixa 2”, diz o advogado de Rosalba.
Procurado por ISTOÉ, o senador José Agripino não nega que a
voz gravada seja dele. No entanto, o presidente do DEM afirma que as conversas
não provam crime eleitoral. “O único registro de conversas do senador José Agripino
refere-se à concessão de doação legal do partido para a campanha de dois
deputados estaduais do RN”, argumenta.
No Rio Grande do Norte, José Agripino é admirado e temido
por seu talento em captar recursos eleitorais. Até mesmo os adversários pensam
duas vezes antes de enfrentar o senador com palavras. Mas o poderio econômico
do presidente do DEM também está na mira das investigações sobre o
abastecimento das campanhas do partido. A Polícia Federal apura denúncia de
favorecimento ao governo em contratos milionários com a Empresa Industrial
Técnica (EIT), firma da qual José Agripino foi sócio cotista até agosto de
2008. Nas eleições de 2010, o senador recebeu R$ 550 mil de doação da
empreiteira. Empresa privada, a EIT é o terceiro maior destino de recursos do
Estado nas mãos de Rosalba. Perde apenas para a folha de pagamento e para
crédito consignado. Só este ano foram R$ 153,7 milhões em empenhos do governo,
das secretarias de Infraestrutura, Estradas e Rodagem e Meio Ambiente. Na crise
de pagamento de fornecedores do governo Rosalba, que atingiu o salário dos
servidores e os gastos com a Saúde, a população foi às ruas questionar o porquê
de o governo afirmar que não tinha dinheiro para as despesas básicas, mas
gastava milhões nas obras do Contorno de Mossoró, empreendimento tocado pela
EIT.
De acordo com a investigação do MPF, recursos do governo do
Estado saíam dos cofres públicos para empresas que financiam campanhas do DEM
por meio de um esquema de concessão de incentivos fiscais e sonegação de tributo,
que contava com empresas de fachada e firmas em nome de laranjas. O esquema de
caixa 2 tem, segundo o MP, seu “homem da mala”. O autor do drible ao fisco é o
empresário Edvaldo Fagundes, que a partir do pequeno estabelecimento “Sucata do
Edvaldo” construiu, em duas décadas, patrimônio bilionário. No rastreamento
financeiro da Receita Federal, a PF identificou fraude de sonegação estimada em
R$ 430 milhões.
O empresário é acusado de não pagar tributos, mas investe
pesado na campanha do partido. Nas eleições de 2012, Edvaldo Fagundes não só
vestiu a camisa do partido como pintou um de seus helicópteros com o número da
sigla. A aeronave ficou à disposição da candidata Cláudia Regina (DEM), pupila
do senador José Agripino. Empresas de Edvaldo, que a Polícia Federal descobriu
serem de fachada, doaram oficialmente mais de R$ 400 mil à campanha da
candidata do DEM. Mas investigação do Ministério Público apontou que pelo menos
outros R$ 2 milhões deixaram as contas de Edvaldo rumo ao comitê financeiro da
legenda por meio de caixa 2.
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