por Vladimir
Safatle – Carta
Capital
Duas notícias quase simultâneas forneceram uma boa
fotografia do que o Brasil se tornou. Na primeira, descobrimos, o lucro líquido
do Itaú em 2013 alcançou os 15,7 bilhões de reais, o maior da história dos
bancos brasileiros, segundo estudo da consultoria Economática. Enquanto isso, o
Bradesco apresentava o segundo maior lucro do ano, 12 bilhões de reais. Apenas
duas instituições financeiras embolsaram quase 28 bilhões de reais, isto em uma
economia de crescimento estagnado. Na segunda 3, a outra informação: a produção
industrial caíra 3,5% em dezembro em comparação a novembro, a maior retração em
cinco anos.
Diante desses dados, é difícil não lembrar de uma bela frase
do presidente da Islândia, Olafur Grimsson: “Uma economia com bancos muito
fortes é sinal de um país que vai mal”. Não só pelo fato de uma nação atrativa
para investimento especulativo, no qual aplicar dinheiro em cassinos
travestidos é o melhor negócio, nunca conseguirá financiar o desenvolvimento da
criatividade empreendedora de seu povo. Mas principalmente porque uma economia
com bancos fortes destrói tudo à sua volta.
Os bancos drenam os melhores cérebros para o sistema
financeiro. Foi assim que os melhores engenheiros do Brasil não foram parar nas
universidades a estudar novos materiais, em programas de despoluição de rios ou
em pesquisas sobre energia alternativa. Foram fazer contas. O Brasil assim se
transformou em um país que forma economistas não para pensar problemas
regionais ou desenvolver políticas de combate à pobreza, mas para fazer
consultoria para bancos, fundos de investimentos e outros segmentos do mercado
financeiro.
Por outro lado, um sistema financeiro forte constrói uma
rede escusa de relações e interferência que corroem todos os poderes políticos,
entre eles a mídia e os governos. Ao criar uma relação incestuosa na qual
antigos integrantes da administração pública sempre passam ao sistema
financeiro e vice-versa ou na qual a saúde financeira dos meios de comunicação
depende das boas relações com o sistema bancário, as instituições financeiras
acabam por controlar o espectro das decisões econômicas. Não por outra razão, o
mundo assistiu à impotência dos governos mundiais em desenvolver políticas
capazes de quebrar o interesse do sistema financeiro global em prol da defesa
de populações vulneráveis em processo irreversível de pauperização. Na verdade,
toda e qualquer discussão econômica imbuída de encontrar novos modelos deve
partir da reflexão sobre como quebrar a força de intervenção dos bancos, um
poder que não mostra sua cara, que opera na calada da noite dos lobbies.
Que um governo dito de esquerda no poder há 12 anos não
tenha quebrado o processo de transformação em um paraíso de rentabilidade para
o sistema financeiro, com suas taxas de juro de baile da Ilha Fiscal, é algo
que só pode provocar indignação. Nem temos um sistema pesado de taxação sobre
lucros bancários, o que permitiria ao governo subvencionar melhoras nos
serviços públicos tão cobradas pela população nas manifestações dos últimos
meses. Até a CPMF, o imposto mais justo que este país teve, por taxar aqueles
que realizam o maior número de transações financeiras, foi abandonada, para
nunca mais voltar à pauta.
Neste ano eleitoral, no qual a dependência da classe
política em relação ao sistema financeiro e às quadrilhas de construtoras
aumenta exponencialmente, dificilmente veremos propostas dispostas a controlar
esse que é, no fundo, um dos nossos maiores problemas econômicos. Que tais
lucros intergalácticos ocorram em plena retração da economia é apenas um
sintoma de onde estão aqueles que realmente controlam as decisões deste país.
Assim, quando alguém joga uma pedra em agências bancárias, a sua maneira ele acerta
o alvo correto. Este poder das sombras, regado a Romanée Conti e a stockoptions
milionários, não pode continuar a, de fato, governar o Brasil.
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