sexta-feira, 30 de março de 2018

'Talvez custe vidas': comunicado interno de estratégias do Facebook vaza e constrange empresa



Um comunicado interno do Facebook veio à publico inadvertidamente e causou constrangimento para a rede social. O documento afirma ser uma "verdade inconveniente" que tudo que a empresa fez para crescer foi justificado.

O memorando escrito em 18 de junho de 2016 pelo executivo Andrew Bosworth e revelado pelo site Buzzfeed afirma que isso se aplicaria mesmo a situações em que pessoas poderiam morrer como resultado de bullying ou terrorismo.

Tanto seu autor quanto o presidente da companhia, Mark Zuckerberg, negaram de fato crer nisso, mas o vazamento pode minar os esforços do Facebook para conter outro escândalo.

O Facebook está sob intenso escrutínio público desde que reconheceu ter recebido relatórios de que uma consultoria política, a Cambridge Analytica, não havia destruído os dados coletados de cerca de 50 milhões de usuários há alguns anos.
'Verdade inconveniente'

No memorando, Boswroth escreveu:

"É um fato que nós conectamos mais pessoas. Isso pode ser ruim se usuários transformarem o conteúdo em algo com efeito negativo. Talvez custe uma vida ao expor alguém a bullying. Talvez alguém morra em um ataque terrorista coordenado com nossas ferramentas.

E, ainda assim, nós seguimos conectando pessoas. A verdade inconveniente é que acreditamos tanto em conectar pessoas que qualquer coisa que nos permita conectar mais pessoas é tida como algo positivo em si. É talvez a única área em que as métricas contam a verdadeira história até onde sabemos.

[...]

É por isso que todo o trabalho que fazemos para crescer é justificado. Todas as práticas questionáveis para obter contatos. Toda a linguagem sutil que ajuda a fazer com que as pessoas apareçam nos resultados de buscas de amigos. Todo o trabalho que temos para gerar mais comunicação. Todo o trabalho que teremos que fazer na China um dia. Tudo isso."
Provocação

Bosworth, que foi um dos inventores do o feed de notícias do Facebook, ocupou cargos de alto escalão na empresa desde 2006 e está atualmente à frente de seu esforços em realidade virtual.

GETTY IMAGES - O presidente do Facebook disse nunca ter defendido que os fins justificam os meios

O executivo tuitou que "não concordava" com o teor do texto quando o compartilhou, mas que o enviou para os funcionários da empresa para "fazer uma provocação".

"Debater assuntos difíceis como esse é uma parte crítica de nosso processo, e, para fazer isso de forma eficiente, temos de ser capazes de levar em conta até mesmo as ideias ruins", disse ele.

Zuckerberg fez uma declaração sobre o assunto: "Boz é um líder talentoso que diz muitas coisas provocadoras. Esse foi um caso em que a maioria das pessoas, inclusive eu, discordamos veementemente. Nunca acreditamos que os fins justificam os meios".

Uma reportagem do site The Verge revelou que dezenas de funcionários do Facebook usaram ferramentas de comunicação internas para expressar preocupação de que esse material poderia ter sido vazado para a imprensa.
Práticas questionáveis

Rory Cellan-Jones, repórter de tecnologia da BBC News, afirma que o que mais chamou sua atenção no memorando foi a frase sobre "todas as práticas questionáveis para obter contatos".

"Quando baixei meus dados do Facebook, fiquei assustado com a quantidade de números de telefone dos meus contatos que estavam ali. Mas a atitude da empresa fazia parecer que isso era normal e que cabia aos usuários desativar essa função se não gostassem disso", escreveu o jornalista.

REUTERS - Em reação à polêmica, Facebook anunciou mudanças em suas políticas e práticas

"O que sabemos é que, em 2016, um executivo sênior pensou que esse tipo de coleta de dados era questionável. Então, porque só agora a companhia está debatendo esta e outras práticas duvidosas. Até agora, não houve muitos vazamentos do Facebook. Talvez teremos em breve mais informações de pessoas de dentro da empresa conforme esse negócio ainda em sua adolescência tenda a crescer e lidar com sua verdadeira natureza."

O vazamento ocorre em um momento em que o Facebook busca reagir às preocupações do público e de investidores com a forma como a rede social é administrada. Suas ações caíram 14% desde que o escândalo da Cambridge Analytica começou, e diversos nomes de peso no mundo começaram a fazer campanha para que as pessoas saiam da rede social.

Mudanças

A companhia anunciou na última quinta-feira que começou a fazer a checagem de fotos e vídeos publicados na França e que expandirá essa prática para outros países em breve.

Também divulgou ter desenvolvido uma nova ferramenta para investigar perfis falsos e conter atividades que possam ser danosas a processos eleitorais. A rede diz também ter iniciado a construção de um arquivo público que possibilitará que jornalistas e outras pessoas investiguem propaganda política publicada em sua plataforma.

A rede social já havia anunciado uma mudança em suas configurações de privacidade e dito que restringiria o volume de dados que troca com outros negócios que coletam informações para anunciantes.

A mais recente controvérsia deve dar, no entanto, ainda mais munição aos críticos do Facebook.

A emissora televisiva americana CNN disse nesta semana que Zuckerberg decidiu testemunhar perante o Congresso americano "daqui a algumas semanas" após se recusar a fazer o mesmo no Parlamento britânico. No entanto, a BBC não conseguiu confirmar se ele de fato deporá em Washington.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

12